Em maio de 2020, o histórico hotel Laje de Pedra fechou as portas. Abandonava a cena um dos hotéis mais emblemáticos do Brasil, palco da assinatura do primeiro acordo que deu origem ao Mercosul, de festivais com grandes nomes da MPB e de jantares à beira de uma lareira suspensa com vista para o Vale do Quilombo, na Serra Gaúcha.
Agora, o icônico prédio localizado na cidade de Canela, a 110 km de Porto Alegre, se prepara para renascer, em um projeto com investimento estimado em R$ 800 milhões. Por trás da retomada estão três empresários: José Paim de Andrade, um dos fundadores da Rossi Residencial e da incorporadora MaxHaus; José Ernesto Marino Neto, executivo com longa atuação no setor de hotelaria; e o arquiteto Márcio Carvalho.
O projeto de revitalização, que terá a bandeira da centenária rede alemã Kempinski, aposta em um modelo pouco explorado no país: o luxo compartilhado. A proposta é aliar o serviço de um hotel cinco estrelas a propriedades individuais que possam ser compartilhadas, em um empreendimento com Valor Geral de Vendas (VGV) previsto em R$ 1,8 bilhão.
O novo Kempinski Laje de Pedra adota a estratégia de propriedades de alto padrão compartilhadas, tendência que começa a ganhar espaço no mercado de turismo de luxo. Em vez de adquirir um imóvel inteiro, o consumidor compra uma fração da unidade com direito de uso por um número específico de semanas ao ano.
Os preços variam de R$ 500 mil por fração, para quem deseja usufruir da unidade por seis semanas ao ano, até alguns milhões de reais por apartamentos inteiros, com tamanhos entre 54 m² e 216 m².
Para José Ernesto Marino, o modelo dilui custos, garante acesso a serviços cinco estrelas e oferece uma porta de entrada mais flexível ao turismo de luxo. “O público de alta renda está aprendendo a compartilhar propriedades”, diz.
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Com o antigo prédio praticamente demolido, o novo Laje de Pedra terá 351 unidades, sendo 80 operadas como hotel e o restante disponível para venda por frações ou integral. Na primeira fase, com VGV de R$ 500 milhões, praticamente 100% das unidades foram comercializadas. A segunda fase, estimada em R$ 300 milhões, será lançada em breve.
Embora as obras estejam em andamento, o Laje de Pedra 2.0 já começou a tomar forma. Parte das instalações foi reaberta como vitrine do projeto, incluindo o restaurante 1835, onde a lareira suspensa — peça original dos anos 1970 — foi restaurada. No mesmo espaço funciona o Bar do Laje, uma galeria de arte e um mirante para o vale. O ambiente abriga cerca de 30 eventos ao longo do ano, entre degustações de vinhos e whiskies locais e apresentações da Orquestra Filarmônica Kempinski Laje de Pedra.
À frente da parte institucional do projeto, Marino também atua para transformar o aeródromo de Canela em aeroporto regional, numa tentativa de impulsionar o fluxo turístico e reforçar a cidade como destino de alto padrão. O plano, que aguarda aval da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), prevê que a Latam passe a oferecer três voos semanais para o município.
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Foi Marino quem articulou pessoalmente a parceria com a Kempinski — rede de luxo nascida na Alemanha e que hoje é controlada pela família real do Bahrein. Com exclusividade para operar a marca no Brasil, Marino, Carvalho e Paim apostam na reconstrução do Laje de Pedra como vitrine da Kempinski para seus futuros empreendimentos no país.
A reabertura do Laje de Pedra é apenas o ponto de partida. Segundo Marino, a rede planeja abrir sua próxima unidade brasileira em Alagoas, seguida por um projeto em São Paulo.
Inaugurado em 1978, o Laje de Pedra foi o primeiro hotel cinco estrelas do Rio Grande do Sul e rapidamente se tornou ícone da elite cultural, política e econômica do Brasil. Entre os anos 1980 e 1990, sediou festivais com Milton Nascimento, eventos sociais e encontros presidenciais — como a Declaração de Canela, precursora do Mercosul.
Ao lado do Copacabana Palace, do Tropical em Manaus e do Cataratas em Foz do Iguaçu, o Laje era considerado um dos quatro hotéis mais sofisticados do país. A arquitetura modernista de Edgar Graeff, os 250 quartos e a vista para o Vale do Quilombo — debruçado sobre uma laje natural de basalto que dá nome ao hotel — marcaram época.
Mas, no início dos anos 2000, mergulhou em decadência — até encerrar as atividades em 2020, sob o comando do grupo Habitasul, que vendeu o local ao trio de empresários.