Mais conhecida pelas TVs que estão em quase todas as salas brasileiras, a LG vem em um trabalho de expansão em locais onde costuma passar despercebida, como o resfriamento de data centers e a climatização de hospitais, aeroportos e shoppings. O ar-condicionado, que já é o carro-chefe global do grupo globalmente, é o produto que a multinacional coreana vê como alavanca para que o segmento B2B no Brasil passe a representar 50% do faturamento nos próximos cinco anos.

Rodrigo Fiani, vice-presidente de vendas da LG no Brasil, define a estratégia como um “trabalho de longo prazo”. Foram quase vinte anos até que a operação para clientes corporativos, iniciada de forma tímida em 2003 com a venda de televisores para hotéis, ganhasse relevância a ponto de responder hoje por cerca de 20% da receita local.

Não se trata de abandonar o varejo – TVs, linha branca e equipamentos de áudio seguem entre os produtos mais conhecidos da empresa –, mas de adicionar uma nova camada de negócios. “No B2C, o cliente compra uma TV e só vai trocar três ou quatro anos depois. No B2B, há manutenção contínua, software agregado e relacionamento de longo prazo”, diz Fiani, em conversa com o InvestNews.

Rodrigo Fiani, vice-preisdente de vendas da LG no Brasil
Rodrigo Fiani, vice-preisdente de vendas da LG no Brasil (Divulgação)

O ar-condicionado, dentro da divisão Home Appliance & Air Solution, é o negócio mais lucrativo da LG no mundo. Só no primeiro trimestre de 2025, a área gerou cerca de US$ 6,3 bilhões em receita e US$ 440 milhões em lucro operacional (Ebitda) – quase metade do resultado global da companhia.

No Brasil, a LG está entre as líderes em televisores e ar-condicionado, categorias que ajudam a colocar o país entre os três maiores mercados da companhia no mundo, ao lado da Coreia do Sul e dos Estados Unidos.

Mas Fiani reforça que as iniciativas B2B da LG não se limitam apenas ao ar-condicionado. A companhia também atua em telas profissionais. No Aeroporto Internacional de Guarulhos, a empresa forneceu para a JCD Corp o primeiro painel 3D da América Latina, usado como diferencial na venda de publicidade no Terminal 3, o principal do aeroporto.

Os chillers ganham espaço

Se o ar-condicionado residencial — o popular “split” — ainda é visto como item de luxo, os chillers, sistemas de refrigeração de grande porte, são equipamentos vitais para o funcionamento de serviços essenciais. Sem eles, aeroportos, hospitais e data centers simplesmente não operam.

No caso dos data centers, setor em franca expansão no Brasil, a oportunidade é ainda mais evidente. “Nos data centers, não existe plano B. Sem ar-condicionado, não há servidor que resista”, lembra Rodrigo Fiani, acrescentando que a LG já fornece para algumas instalações no país, embora não possa divulgar os nomes.

A aposta local está alinhada à prioridade da matriz global. A LG projeta que o mercado mundial de chillers alcance US$ 12 bilhões até 2027 e fixou a meta de chegar a US$ 720 milhões em faturamento nesse segmento em apenas dois anos. A empresa é a fornecedora desses equipamentos em grandes aeroportos pelo mundo, como o King Khalid, na Arábia Saudita, e o de Incheon, na Coreia do Sul.

Chillers da LG
Chillers da LG (Divulgação)

Mais do que vender o equipamento, a empresa busca ampliar a receita no B2B com a prestação de serviços, o que garante caixa recorrente e previsível. Para clientes corporativos, a LG oferece contratos de monitoramento remoto que permitem programar a temperatura por andar, agendar manutenção preventiva e reduzir custos de energia. Os contratos têm prazo mínimo de dois anos.

No Brasil, a divisão B2B registrou crescimento de 12% no primeiro semestre, segundo a própria companhia. Internamente, áreas como climatização comercial e painéis digitais já têm peso equivalente no faturamento local. “O Brasil é super relevante para a LG global. Qualquer erro aqui se reflete em toda a região”, resume Fiani.

Impasse

O mercado de ar-condicionados vive hoje um cabo de guerra regulatório. A Eletros, associação que reúne fabricantes como a própria LG, Samsung e Whirlpool, pressiona o governo a rever regras do Processo Produtivo Básico (PPB) que obrigam a compra de compressores da Tecumseh, única fornecedora nacional.

O componente é crítico — considerado o “coração” do ar-condicionado, pode responder por até 40% do valor do equipamento. Em entrevista à Folha de S.Paulo, José Jorge do Nascimento Junior, presidente da Eletros, afirmou que a Tecumseh, que mantém fábrica em São Carlos (SP), não vem atendendo integralmente os pedidos feitos pelas empresas. A Tecumseh, por sua vez, diz que sua capacidade de produção é suficiente para que as multinacionais cumpram as metas.

Com o impasse, o setor teme descumprir as cotas de conteúdo local e perder os incentivos fiscais da Zona Franca de Manaus — como isenção de IPI e PIS/Cofins, redução do imposto de importação e ICMS subsidiado.

Esses benefícios podem representar até 40% do custo final de um ar-condicionado. Sem eles, a produção local se tornaria mais cara e dificilmente conseguiria competir com os equipamentos importados da Ásia.

Varejo e concorrência

Apesar das discussões regulatórias, a oportunidade para o mercado brasileiro de ar-condicionados segue firme — e não se limita ao setor corporativo. No varejo, há espaço evidente para crescer: apenas cerca de 20% dos lares brasileiros têm ar-condicionado, contra uma penetração de pelo menos 95% em TVs e geladeiras.

Com verões recordes registrados em algumas regiões do país, o aparelho de ar-condicionado vem ganhando cada vez mais presença nas residências do Brasil. “O produto vem deixando de ser artigo de luxo para se tornar necessidade, especialmente em verões cada vez mais intensos”, afirma o executivo da LG.

O desafio, no entanto, está no avanço de marcas chinesas como Midea, Hisense e Haier, que competem com preços agressivos. Fiani reconhece a disputa, mas vê espaço para diferenciação. “Se subestimarmos os chineses, cometeremos o mesmo erro que cometeram com os coreanos [como a LG] no passado”, diz.

Segundo ele, a vantagem da LG está na rede de assistência técnica, na oferta de peças de reposição e na produção local. “Preço conquista mercado no curto prazo. No longo prazo, o cliente precisa de confiança e suporte.”