É dali – do centro financeiro do país e longe dos estúdios de Osasco – que o ex-ministro da Comunicações Fábio Faria acompanha atentamente todos os detalhes para o lançamento do oitavo canal de notícias brasileiro, o primeiro grande projeto do Grupo Silvio Santos desde a morte de seu fundador, em agosto do ano passado.
Hoje consultor, Faria é marido da apresentadora Patrícia Abravanel, filha de Silvio Santos e uma das acionistas controladoras do GSS. O ex-ministro do governo Bolsonaro não tem cargo no grupo e diz que não pretende assumir qualquer função executiva no novo canal. “Devo ficar por ali no conselho, no máximo.”
Hoje, ainda que informalmente, se reporta para uma de suas cunhadas – no caso, Daniela Beyruti, presidente do SBT. “Falo com ela por WhatsApp o dia inteiro.”
Se a TV aberta está acostumada a fazer tudo olhando para o ibope, a nova marca está mais preocupada em construir relevância, focando no modelo de TV por assinatura, transmissão no YouTube, portal e redes sociais. “Acho que o SBT News vai entrar muito bem no mercado e vai modernizar o próprio SBT”, afirmou Fábio Faria ao InvestNews.
Faria e as herdeiras de Silvio Santos são empresários que veem no jornalismo uma forma de se conectar com o poder – até aí, nada de novo. Mas tem mais gente chegando para disputar esse mercado. Exemplos recentes incluem João Camargo, que comandou a CNN Brasil por três anos e rompeu há poucos meses a sociedade com o bilionário Rubens Menin para montar seu próprio veículo, a TMC. Junta-se à lista Luiz Estevão, um ex-senador que chegou a ser preso e hoje é dono do Metrópoles, um dos maiores portais de notícias do Brasil – que vem crescendo em audiência e relevância, especialmente na cobertura política.
SBT News e Fábio Faria
A agenda de contatos é um ativo importante no trabalho de Fábio Faria. A estreia do SBT News vai ser em 15 de dezembro e a cerimônia de inauguração, dia 12. Na sede da emissora, em Osasco, são esperados o presidente Lula, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, o presidente da Câmara, Hugo Motta, o dono da CNN Brasil, Rubens Menin, e o VP de relações institucionais da Globo, Paulo Tonet Camargo.
O SBT News representa uma virada importante em termos de posicionamento de marca para o SBT, reconhece Fábio. A direção de jornalismo ficará a cargo de Camila Mattoso, ex-diretora da sucursal de Brasília da Folha de S. Paulo. Na nova hierarquia do jornalismo do SBT, ela está subordinada a Leandro Cipoloni, que carrega a experiência de ter reformulado o jornalismo da RecordTV na década passada e de ter implantado a CNN Brasil.
O time sob comando de Camila inclui nomes vindos de players tradicionais no segmento. Fábio Faria diz que o investimento feito até aqui está basicamente concentrado em contratações. Não revela valores, mas garante que o SBT News nasce “com muita sinergia de custo”, por usar a estrutura já existente no grupo. O SBT tem 110 emissoras afiliadas no Brasil.
Metrópoles e Luiz Estevão
O Metrópoles surgiu em Brasília há pouco mais de uma década, quando a imprensa local enfrentava uma grave crise financeira. Com o fechamento da revista Veja Brasília, o ex-senador Luiz Estevão – àquela época já às voltas com a Justiça – viu uma oportunidade de botar em prática o plano de virar um empresário da mídia.
“Ele sabia que seria preso logo em seguida e precisava de alguém da confiança dele e que tivesse competência para fazer a coisa sair do papel”, explica a jornalista Lilian Tahan, hoje CEO do Grupo Metrópoles.
Egressa da Veja, Lilian era, então, uma conhecida repórter da capital federal e tinha Luiz Estevão como fonte. Quando recebeu o convite, ela topou com dúvidas, mas viu ali a chance de erguer uma redação a partir do zero em um momento em que outros veículos encolhiam. “A crise do Correio Braziliense também já era evidente. Existia espaço para quem estivesse disposto a ocupar o noticiário local.”
O Metrópoles cresceu rapidamente – começou como um portal regional e foi ganhando escala nacional ao longo da década, tudo bancado por Estevão, que permaneceu fiador do negócio mesmo durante os quatro anos em que esteve na Papuda. Nessa época, o senador cassado exercia seu papel de publisher por meio de cartas que trocava diariamente com Lilian.

Luiz Estevão não quis falar com a reportagem do InvestNews.
Para ganhar escala, além do jornalismo político, Estevão usou o entretenimento como estratégia. O grande nome dessa fase é o jornalista Léo Dias – hoje também um empresário de mídia, dono de um portal que leva seu nome e que faz parte de uma série de investimentos de empresários mineiros, entre eles Flávio Carneiro e Antônio Freixo Junior, também sócios de veículos como Brazil Journal e IstoÉ, como mostrou o InvestNews.
“Quando o Léo Dias chegou, houve uma retroalimentação. Ele trouxe muita audiência e nós ajudamos a ampliar a dele”, diz Lilian. Com a marca do Metrópoles mais conhecida, a empresa passou a investir no colunismo político e no jornalismo investigativo.
O Metrópoles virou um canhão. Na logomarca, um letreiro dinâmico que lembra permanentemente ao leitor que ele está no “mais acessado do Brasil”, de acordo com dados compilados pela Comscore.
“Essa é uma marca que eu realmente não gostaria de perder, fico muito em cima disso”, frisa a chefe do portal, que diz comandar hoje uma equipe com “quase 300 jornalistas com carteira assinada” entre a redação de Brasília e as sucursais de São Paulo e Belo Horizonte, esta última em fase de implantação. Para se ter uma ideia do que esse número significa, o G1 tem cerca de 220 jornalistas espalhados em suas redações de São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Belo Horizonte e Brasília, segundo pessoas familiarizadas com o veículo.
Questionada a respeito de uma possível interferência política ou pessoal de Luiz Estevão na redação, Lilian afirma que o ex-senador “nunca entrou na redação para pedir uma pauta ou sugerir um viés”, diz Lilian. “Se ele criou o Metrópoles como projeto de poder, ele usa isso em doses homeopáticas.”
TMC e João Camargo
João Camargo não é exatamente novato nesse ramo – ele e sua família são donos há anos das rádios Alpha, Disney e 89, entre outras. Mas, recentemente, ele acelerou o passo. Artífice dos petits comités mais disputados do PIB e de Brasília, o fundador do think tank Esfera está empenhado na construção da TMC, grupo multimídia sucessor da rede de rádios Transamérica. Fundada em 1976 pelo banqueiro Aloysio de Andrade Faria, a rede foi arrematada em fevereiro por João Camargo e por seu irmão, Neneto, ao valor de R$ 70 milhões.
Segundo João, houve duas outras ofertas: uma do publisher da Forbes Brasil, Antonio Camarotti, e outra de Flávio Carneiro – o mesmo já citado nesta reportagem. A Forbes, porém, não estava interessada na praça de São Paulo, avaliada em R$ 45 milhões. A proposta de Carneiro, R$ 120 milhões, foi muito superior à dos outros concorrentes, mas, de acordo com Camargo, as herdeiras de Aloysio Faria barraram a venda por questões de compliance – o empresário mineiro já teve seus problemas com a Justiça.
A TMC surge, então, de um investimento vindo direto dos bolsos da família Camargo: R$ 70 milhões pela rede Transamérica e mais R$ 50 milhões que estão sendo investidos agora. O dinheiro está fluindo para equipamentos e contratações que vão estabelecer redações-estúdio da TMC no Rio de Janeiro, Brasília, Belo Horizonte, Curitiba e Recife. Em São Paulo, a TMC deve se mudar nos próximos meses para três andares em um prédio na Avenida Paulista, a menos de 500 metros da sede da CNN Brasil, onde João Camargo deu expediente como chairman até o fim de agosto.

Depois de enxugar radicalmente o quadro de funcionários da CNN – foram mais de 500 demissões, praticamente metade do total de empregados –, Camargo conseguiu fazer a empresa dar lucro em 2024 pela primeira vez desde a fundação, seis anos atrás. Ele virou o chefão da CNN Brasil por convite do dono da TV, o empresário Rubens Menin, também controlador do Banco Inter e da construtora MRV.
A passagem de João pela CNN terminou de forma conturbada. Desde o fim de agosto, João e Rubens estão rompidos. Menin teria ficado contrariado ao descobrir que Camargo transformaria a rede recém adquirida em CNN/Transamérica, um processo que já estava sendo tocado por funcionários da CNN sem que Menin tivesse pleno conhecimento dele, disseram ao InvestNews fontes próximas ao projeto.
“Ele [Rubens Menin] não se sentiu confortável e eu achei que era questão de [quebra] de confiança”, comentou João Camargo. “Aí eu falei para ele: ‘olha, então você cuida da sua padaria que eu vou abrir o meu boteco'”.
Sem tempo a perder, João Camargo fez a TMC nascer para o público e para os anunciantes em novembro de 2025. “Eu vou repetir a mesma fórmula que eu fiz lá [na CNN Brasil]. Se deu certo lá, por que não daria certo na TMC?”
Por ora, os custos todos estão sendo cobertos por investimentos próprios, mas Camargo já está fazendo uso de sua agenda de contatos para dar viabilidade financeira à emissora. A TMC, já está fazendo a cobertura dos eventos da Esfera, hoje dirigido por Camila Camargo, filha de João.
“O dinheiro está fora da empresa, então não adianta você ficar sentado lá dentro”, diz João. “Eu até financiei meu motorista para ele comprar uma licença de táxi, aí eu contrato ele todo dia para ficar comigo”.