Poucos objetos reúnem tantas camadas de significado quanto um relógio mecânico de luxo. Ele é joia — porque brilha, pesa, custa caro. É máquina — porque condensa séculos de engenharia em um espaço minúsculo. É símbolo — porque diz algo sobre quem o usa. E, nos últimos anos, virou também um gráfico, um índice, uma curva de valorização ou de queda.

Essa transformação — do pulso para o painel financeiro — foi impulsionada pelo dinheiro sobrando nos bolsos dos mais ricos durante a pandemia e pelo crescente número de influenciadores e celebridades que projetaram modelos específicos no imaginário digital. 

Existe até o Bloomberg Subdial Watch Index, criado para acompanhar a variação de preços dos 50 modelos mais transacionados, em valor total, no mercado secundário. Os amantes de relógios têm um índice para chamar de seu. 

O Faria Limer

Para Renato Breia, foi o casamento da fome com a vontade de comer. Analista de ações e colecionador de relógios há uma década, ele acompanha de perto os índices e os lançamentos do universo relojoeiro e aplica a lógica de investidor à sua coleção. “Dos meus cinco primeiros relógios, já não tenho quatro, inclusive o TAG Heuer que deu início a minha coleção”, confessa. “Só não vendo mesmo o meu primeiro Rolex.”

Com quase 200 mil seguidores no Instagram, Breia se acostumou a interagir com interessados em ganhar dinheiro no mercado secundário de relógios, mas ele alerta que essa não é uma tarefa simples. “Investir em relógio é coisa para super profissional, é necessário ter acesso a fornecedores e mercados que a média das pessoas não tem”, adverte. 

A capacidade de costurar esses acessos ultra exclusivos ajudam o trader a construir a percepção do que deve ganhar valor no futuro próximo, seja por escassez de um modelo que está prestes a parar de ser fabricado ou por algum outro fator que torne certa unidade uma raridade – ter pertencido a uma celebridade, por exemplo. 

Para quem “opera” de olho no índice da Bloomberg, más notícias: o Subdial Watch Index acumula uma queda de quase 40% nos últimos dois anos. De acordo com Breia, o tombo reflete o estouro de uma bolha que se formou em meio ao excesso de liquidez da pandemia – a “inflação” dos relógios no mercado secundário não foi capturada pelo índice, criado em 2023.

Neste 2025, saiu da mínima em janeiro para acumular, até dezembro, uma alta de 8,5% – perde para o CDI, Ibovespa, S&P500… Será um bom momento para investir? Breia insiste no “deixa disso”. 

“O amador que compra bem seus relógios consegue reter valor ao longo do tempo porque as marcas de luxo conseguem aumentar os preços todos os anos entre 5% e 12%”, explica. A tendência é que mais hora menos hora o mercado de usados capture essa valorização dos novos. Então se você, leitor, é um feliz proprietário de um Patek Philippe, fique tranquilo: as patacas investidas quando da compra dele provavelmente estarão conservadas no longo prazo. 

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