Segundo uma levantamento feito pela Flow Executive Finders, consultoria especializada em recrutamento de altos executivos que analisou as 80 empresas do índice nos últimos 30 meses, ao menos oito desses novos comandantes estão estreando na função.
Todos os estreantes vieram de promoções internas e assumem justamente num ciclo em que o custo de capital aperta as empresas. Cenário que coloca a sustentabilidade do negócio em primeiro plano, em vez da expansão da companhia.
Essa movimentação também mudou o perfil de liderança que chega ao topo. Ao promover profissionais internos, as empresas deixam para trás a lógica do “CEO protagonista” – um executivo veterano contratado para concentrar decisões e “resolver” a estratégia – num movimento que, como define Bernardo Cavour, sócio da Flow, marca o fim do modelo do CEO “one man show”.
No período analisado, Marcelo Martins (Cosan), Ciro Neto (Iguatemi), Alberto Kuba (WEG), Rossano Marques (Yduqs), Renato Raduan (RD Saúde), Rinaldo Pecchio (Taesa), Marcelo Noronha (Bradesco) e Gustavo Pimenta (Vale) estrearam na cadeira. Cada um, à sua maneira, descobriu rapidamente que o manual usado por lideranças anteriores já não dá conta do ambiente atual.
“O que vemos é uma combinação rara: CEOs assumindo sob restrição de capital, com conselhos mais exigentes e mercados muito menos tolerantes ao erro”, afirma Cavour, responsável pela análise.
A fotografia brasileira espelha um movimento global. Um estudo da consultoria Russell Reynolds, que analisou mais de mil empresas em 13 índices internacionais, mostrou que o tempo médio dos CEOs no cargo caiu de 8,4 anos para 7,2 anos desde 2021 — com casos chegando a 4,9 anos, o menor nível desde 2018.
Exigência mudou
Segundo o sócio da Flow, a pressão não recai apenas sobre os recém-chegados. Mesmo entre as companhias que não trocaram de CEO, os executivos veteranos viram seu mandato se transformar.
O ciclo de abundância e expansão que marcou o período de juros baixos deu lugar a um ambiente de capital escasso, margens comprimidas e conselhos muito mais intervencionistas, relata Cavour. “Mesmo os CEOs que permaneceram no posto precisaram, de certa forma, recomeçar.”
A mudança, porém, não está apenas em quem assume, mas em como a liderança passou a ser exercida. Nos últimos anos, os conselhos passaram a ocupar um espaço maior na formulação de estratégia e na discussão de riscos. Depois de perdas relevantes de valor e projetos que fracassaram em entregar o retorno prometido, poucos boards operam hoje com a mesma distância que mantinham no passado.
Para Cavour, tanto nas empresas listadas quanto nas companhias fechadas, a demanda por novos líderes continua concentrada em perfis capazes de reorganizar a estrutura de capital. A prioridade, diz ele, é encontrar executivos aptos a reduzir alavancagem, simplificar estruturas, revisar investimentos e recuperar previsibilidade – o que também explica por que tantos CFOs têm ascendido ao topo.
“A imensa maioria dos mandatos que chegam até nós ainda é de reorganização, não de crescimento”, afirma. Entre 2021 e 2022, muitas companhias aceleraram projetos, elevaram custos e expandiram suas operações num ambiente que não se confirmou. Agora, com capital mais caro e mercado menos tolerante ao erro, o foco virou corrigir excessos.
Nova geração
Esse pano de fundo molda os desafios dos estreantes. Marcelo Martins, que assumiu o comando da Cosan em novembro de 2024, entrou com a missão explícita de reestruturar e enxugar a companhia após a crise de endividamento que levou o grupo a um aumento de capital de R$ 10 bilhões neste ano. Marcelo Noronha, no Bradesco, que virou CEO um ano antes de Martins, também herdou um mandato centrado em reorganizar um banco pressionado por perda de rentabilidade.
Rossano Marques, na Yduqs, estreia em um setor que continua tendo que lidar com inadimplência elevada e margens comprimidas. Já Alberto Kuba, na WEG, vive um cenário distinto: estreia numa empresa que quase não muda de liderança e cuja principal missão é preservar o ritmo de expansão global em um ciclo mais cauteloso.
Se atravessarem esse ciclo, pondera o sócio da Flow, os estreantes do Ibovespa podem formar uma das gerações mais completas de CEOs – treinada para operar sob uma restrição maior. “É uma escola dura, imposta pela conjuntura. No fim da história, não será sobre os executivos que assumiram a cadeira de CEO, mas sobre quem conseguiu ficar nela”, conclui.