O material genético oferecido pertence a Pavel Durov, bilionário fundador do aplicativo de mensagens Telegram.
Em conferências, redes sociais e sites de notícias, a clínica descrevia Durov como alguém com “alta compatibilidade genética” e informava que ele arcaria com os custos da fertilização in vitro para mulheres com menos de 37 anos interessadas em usar seu esperma, descrito como “altamente disputado”.
Um banner no site da clínica, chamada AltraVita, ainda anuncia seu “biomaterial” ao lado de uma foto do executivo e do logotipo do Telegram.
“As pacientes que vieram eram todas muito bonitas, bem-educadas e saudáveis”, disse um ex-médico da clínica, que avaliou várias voluntárias. Ele acrescentou que as participantes precisavam ser solteiras, para evitar complicações legais. “Elas queriam ter um filho de, bem, um certo tipo de homem. Viam esse tipo de figura paterna como a ideal.”
A iniciativa amplia uma linhagem biológica que Durov, hoje com 41 anos e que mora atualmente em Dubai, afirmou em uma postagem pública no Telegram incluir ao menos 100 filhos em pelo menos 12 países — sem contar outros seis filhos concebidos com três mulheres diferentes.
O executivo, nascido na Rússia, escreveu em julho de 2024 que começou a doar esperma por volta de 2010. Primeiro ajudou uma amiga que tentava engravidar; depois, passou a doar de forma anônima, segundo ele, para aliviar a escassez de “material genético de alta qualidade”.
Embora tenha parado de doar há anos, afirmou, seu esperma congelado ainda estava disponível na clínica AltraVita.
No verão europeu mais recente, Durov tornou a oferta ainda mais atraente em uma entrevista a uma revista francesa, ao anunciar que seus filhos biológicos receberiam partes iguais de sua herança.
A revista Forbes estima seu patrimônio em US$ 17 bilhões, embora a maior parte esteja vinculada ao valor do Telegram — empresa que ele diz pretender deixar para uma fundação sem fins lucrativos.
Durov também afirma possuir uma quantidade não especificada de bitcoins comprados em 2013. A declaração sobre a herança provocou uma enxurrada de mensagens de pessoas alegando ser seus filhos, segundo ele.
“Desde que consigam comprovar que compartilham meu DNA, talvez daqui a 30 anos, terão direito a uma parte do meu patrimônio depois que eu morrer”, disse Durov no podcast de Lex Fridman, em outubro. Ele afirmou ainda que pretende tornar público seu DNA para que seus filhos biológicos possam se encontrar.

Bilionários reprodutores
Durov passa a integrar um pequeno grupo de algumas das pessoas mais ricas e influentes do planeta que vêm esticando os limites da ética e da tecnologia reprodutiva.
Alguns recorrem a testes genéticos e até exploram edição genética para produzir filhos com características desejadas. Outros, como Elon Musk, falam em ter muitos filhos tanto como resposta ao declínio populacional quanto como parte de uma visão de colonizar o espaço com seus descendentes.
Durov apresenta suas doações de esperma como um esforço para aliviar a escassez de sêmen saudável e incentivar outros homens a fazerem o mesmo. Por trás disso está uma visão mais ampla de que partes do Ocidente estariam em declínio.
O fundador do Telegram escreve com frequência sobre ameaças à liberdade e à privacidade impostas por regulações tecnológicas na Europa e em outros lugares.
“Um mundo sombrio e distópico está se aproximando rapidamente — enquanto dormimos”, escreveu ele em outubro, ao criticar medidas como identidades digitais, checagens de idade online e prisões relacionadas a publicações em redes sociais. “Colocamos a nós mesmos em um caminho de autodestruição — moral, intelectual, econômica e, por fim, biológica.”
A postagem de Durov, no ano passado, revelando que havia concebido mais de 100 filhos gerou uma resposta irônica de Elon Musk, que já reconheceu ter ao menos 14 filhos.

“‘Números de amador, rs’ — Gêngis Khan”, escreveu Musk na rede X, em referência a estudos que sugerem que cerca de 16 milhões de pessoas no mundo podem descender do líder mongol do século 13.
“Já volto, vou aumentar a capacidade antes de produzir mais”, respondeu Durov, citando um meme do jogo StarCraft conhecido pela frase “spawn more overlords”, usada quando o jogador atinge o limite de unidades.

A clínica
A principal promotora do esperma de Durov é a AltraVita, clínica privada de fertilidade sediada em Moscou, voltada a clientes ricos russos e estrangeiros. Em seus materiais promocionais, a clínica afirma oferecer embriões “seletivos” e com checagem para evitar doenças genéticas.
A AltraVita foi fundada por Sergey Yakovenko, especialista em genética e fertilidade que se descreveu, em entrevista a uma publicação russa, como amigo de longa data de Durov. Yakovenko não respondeu aos pedidos de comentário.
Durov “não tem qualquer envolvimento financeiro, gerencial ou operacional com a clínica, nem acompanha suas atividades de forma sistemática”, disse Devon Spurgeon, porta-voz do executivo.
Segundo ela, Durov mantém contato com o diretor da clínica por “trocas pessoais de mensagens uma ou duas vezes por ano, geralmente sobre assuntos totalmente alheios à clínica”.
Yakovenko também publicou trabalhos sobre clonagem humana, e a AltraVita participou de um projeto russo que afirmou, em outubro, ter clonado com sucesso uma vaca “recordista em produção de leite”, no sudoeste da Rússia. O projeto foi liderado pela Altragen, empresa de clonagem cofundada por Yakovenko com uma companhia agrícola.
Tanto a AltraVita quanto a Altragen afirmam em seus sites que pretendem avançar nessa área, “atraindo a atenção da comunidade científica e do público em geral para as perspectivas e possibilidades da clonagem”.
A AltraVita inicialmente concordou em responder perguntas sobre o programa de doação financiado por Durov, mas depois cancelou a entrevista, afirmando que o próprio Durov havia orientado a clínica a recusar.
Durov disse no Telegram que inicialmente era cético em relação à doação de esperma, mas que Yakovenko o convenceu de que era seu dever cívico — tanto por seus “bons genes” quanto pela tendência de longo prazo de queda na contagem de espermatozoides e aumento da infertilidade masculina.
O programa ganhou especial ressonância na Rússia, que enfrenta uma crise demográfica persistente, agravada pela emigração e pela guerra.
“A escassez de esperma saudável se tornou um problema cada vez mais sério em todo o mundo, e tenho orgulho de ter feito minha parte para ajudar a aliviar isso”, escreveu Durov em 2024.

Na entrevista à revista francesa, ele atribuiu a “queda rápida na concentração de esperma em homens em muitas regiões do mundo” em parte à poluição plástica, classificando o fenômeno como uma ameaça “à nossa sobrevivência”.
A AltraVita também anuncia a possibilidade de testes genéticos dos embriões e a escolha do sexo.
Durov não participou da seleção nem dos exames médicos das potenciais mães, que passam pelos mesmos testes exigidos de pacientes regulares de fertilização in vitro, segundo o ex-médico da clínica.
“De repente, surge uma oportunidade: está tudo pago, e o doador é alguém tão bem-sucedido, inteligente e bonito”, disse o médico.
Anna Panina, de 35 anos, moradora de Moscou, afirmou que considerou participar do programa. “É uma oportunidade maravilhosa de se tornar mãe de um ser humano bonito e inteligente”, disse.
O bilionário
Nascido em 1984, filho de educadores, na então Leningrado, Durov sempre demonstrou interesse por línguas e história. Ele ganhou notoriedade em 2006 ao criar a VK, uma espécie de clone do Facebook que lhe rendeu o apelido de “Mark Zuckerberg russo”. Fundou o Telegram em 2013, pouco antes de ser afastado da VK.
Conhecido por vestir quase sempre roupas pretas — exceto quando posa sem camisa exibindo o abdômen definido —, Durov defende uma visão libertária, rejeitando alinhamentos com Estados e o poder centralizado. Ele apresenta o Telegram como uma ferramenta de resistência ao autoritarismo, tanto na Rússia quanto no Ocidente.

Durante anos, financiou o aplicativo com recursos próprios e empréstimos. Hoje, o Telegram é lucrativo e conta com mais de 1 bilhão de usuários ativos mensais. Em documentos apresentados a investidores em uma emissão de títulos, a empresa informou ter gerado mais de US$ 500 milhões em lucro no ano passado, segundo documentos analisados pelo The Wall Street Journal.
Com pouca moderação de conteúdo, o Telegram se posiciona como espaço neutro em conflitos como as guerras na Ucrânia e em Gaza, mas também é criticado por servir de plataforma para propaganda extremista. A empresa afirma ter bloqueado mais de 42 milhões de grupos e canais que violaram suas regras apenas neste ano e diz ter fornecido dados de endereços de internet em alguns casos de terrorismo e crimes, segundo autoridades.
Durov voltou às manchetes no ano passado após ser preso na França e acusado preliminarmente de envolvimento em atividades ilegais no Telegram, como tráfico de drogas e pornografia infantil, além de se recusar a cooperar com a polícia. Ele nega as acusações e afirma que a polícia francesa usou o endereço de e-mail errado ao buscar ajuda. A investigação segue em andamento, e promotores dizem que a cooperação da empresa melhorou.
Na vida pessoal, Durov segue um estilo de vida voltado à saúde: evita álcool e cafeína, promove exercícios físicos e longas noites de sono.
Ele teve seus dois primeiros filhos em 2009 e 2010, quando ainda comandava a VK. Foi por volta desse período que começou a doar esperma à AltraVita. Depois, teve três filhos com a advogada Irina Bolgar, nascidos entre 2013 e 2017, na Rússia.
Bolgar afirma ter mantido um relacionamento de uma década com Durov, que teria se deteriorado até que, em 2023, ele cortou todo o apoio financeiro, incluindo o aluguel da casa da família em Genebra, após ela se recusar a se mudar para Dubai com as crianças.
Ela também registrou uma queixa criminal na Suíça alegando agressões contra o filho mais novo. Durov nega as acusações, que sua porta-voz classifica como parte de uma “disputa acirrada de custódia”.
Após tornar públicas as doações, veículos russos localizaram o perfil de um “Doador nº 6” em uma clínica de Moscou que correspondia à descrição de Durov — programador russo, empreendedor, fluente em vários idiomas, descrito como “trabalhador, decidido, fiel aos seus princípios e amante da liberdade”.
Hoje, o site da AltraVita exibe sua foto ao lado da frase: “seu número seis”.
Escreva para Sam Schechner em sam.schechner@wsj.com e para Thomas Grove em thomas.grove@wsj.com
Traduzido do inglês por InvestNews