Em excelente texto da jornalista Fabiana Ortega, no InvestNews, especialistas consultados sobre o caso Americanas citaram que a governança da varejista tem que ser revista e que foi posta em xeque. Logo, qual será a reação dos investidores? E dos reguladores?
Existem diversas perguntas, mas preferi me concentrar nestas duas, a começar pela segunda. Tive a experiência de participar de diversos projetos regulatórios para aumentar a governança corporativa das empresas no mercado de capitais brasileiro. Um deles foi a criação pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) do Formulário de Referência de Companhias abertas (FRE).
Como a própria CVM diz em seu site: o Formulário de Referência reúne todas as informações referentes às empresas, como atividades, fatores de risco, administração, estrutura de capital, dados financeiros etc. Foi criado como ferramenta de fiscalização para evitar fraudes como a ocorrida.
Elaborada sob modelo dos relatórios 20F do mercado americano, utilizando o modelo inglês do aplique ou explique, a empresa informa se adota ou não tal prática de governança questionada pela CVM, quando não adota, ela tem que explicar o motivo da não adoção.
Claro que ela possui limitações para descoberta de fraudes, nesse caso contábil e também de falta de transparência, como a ocorrida nas Americanas. Por esse motivo, sempre é aperfeiçoada, como no ano passado em sua parte de ESG (acrônimo em inglês para fatores ambientais, sociais e de governança) através da Resolução No 59 da CVM.
Normalmente, o efeito imediato do lado do regulador é soltar uma série de normas para tentar coibir o tipo de fraude existente. Respondendo diretamente o questionamento, o efeito do regulador será o de criar regras que aumentem a sua régua, exigindo mais informações e transparência, além de aumentar as punições para quem publicar inverdades ou não informar fatos relevantes para a empresa.
Porém, a resposta para a primeira pergunta, qual será a reação dos investidores? Essa só saberemos ao longo desse e dos próximos anos e está relacionada diretamente a forma de ação da CVM e da justiça contra os fraudadores. Espera-se uma punição exemplar, o que coibirá outras fraudes similares no futuro.
No fundo, fraude pode acontecer em qualquer empresa e país, mas a única forma de coibir não é aumentando só a régua regulatória, mas punindo os culpados.
Essa é a diferença entre o mercado americano e o brasileiro. Lá, eles punem com diversas ações de acionistas minoritários que rendem bilhões de indenizações contra a empresa e os executivos culpados pela fraude, além da mão forte da Justiça que os coloca na cadeia. Acredito que precisa ser feito o mesmo em terras brasileiras, única forma de realmente todos cumprirem as práticas de governança estabelecidas.
Sou otimista, acredito que esses eventos adversos trazem frutos positivos para o aumento da governança, mas fico muito receoso de se colocar em xeque o ESG por conta de uma fraude. O pior efeito nesse caso é a saída dos investidores do nosso mercado. Nesse momento, é aguardar as investigações e gerar confiança nos investidores que esse caso foi uma exceção. Uma dica para empresas e seus administradores, aumentem a transparência.
Alexandre Furtado é Presidente do Comitê de Informações ESG da Fundação Getúlio Vargas, Sócio e Diretor de ESG da Grant Thornton.
As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação.
Veja também
- BB Asset busca parcerias para alcançar R$ 2 trilhões em ativos
- Imóveis mundiais perderão 9% do seu valor por conta de tragédias climáticas
- A boiada passa, chega a conta e fica a pergunta: quem vai pagar?
- Desastres climáticos: a função social das empresas e o novo papel do investidor
- Cadeia produtiva é pilar para estabelecer círculo virtuoso da agenda ESG