Pergunta: Como calcular a valorização anual de um imóvel?
Resposta de Valter Police*:
Essa é uma pergunta que deveria ser feita e debatida mais vezes, uma vez que esse tipo de alocação do patrimônio é muito comum, mas as análises sobre suas vantagens e desvantagens passam muito mais por lendas e sensações do que por fatos objetivos. Assim, te agradeço pela oportunidade de esclarecer um pouco esse tema.
Importante salientar também que vou tratar da valorização do imóvel, como poderia ser feito com qualquer outro tipo de ativo, mas a decisão de compra ou não de um imóvel para uso próprio, normalmente moradia ou veraneio, vai muito além das questões financeiras e deve englobar outros temas como perfil da família, necessidade de liquidez, requisitos de flexibilidade geográfica ou mesmo de tamanho do imóvel, preferências pessoais entre muitos outros.
O cálculo poderia parecer simples, da mesma forma como é, por exemplo, no mercado de ações. Lá, basta você pegar o valor de mercado de uma ação em um determinado dia, compará-lo com o valor de mercado de um ano antes e pronto! Lá estará o número que indicará a valorização da ação. No entanto, os imóveis são bastante diferentes das ações por uma característica fundamental: cada imóvel é único.
Mesmo que sejam na mesma cidade ou no mesmo bairro ou até no mesmo condomínio, eles serão diferentes. Um andar mais alto ou mais baixo, sol pela manhã ou a tarde, estado de conservação, reformas entre tantos outros critérios até mais impactantes como região geográfica, acesso à transportes públicos, escolas, mercados, restaurantes, parques, índices de criminalidade, estruturas de segurança e infinitos outros. Tudo isso torna cada imóvel absolutamente único e, portanto, a medição de seu valor é muito mais difícil do que as ações de uma empresa que são, por outro lado, iguais.
Desta forma, a única maneira de realmente saber a valorização de um imóvel específico é se ele for negociado. Assim, deve-se comparar o valor da venda com o de compra e inserir o prazo para se obter a valorização média anual. Mesmo nesse caso existem alguns “complicadores”. É importante se trabalhar sempre com valores líquidos, ou seja, no valor de compra deve-se colocar o dinheiro efetivamente desembolsado, incluindo aí reformas, impostos e comissões. Na venda, da mesma forma, o que importa é o valor líquido, descontando inclusive os eventuais impostos.
Como se isso não bastasse, durante o tempo em que o imóvel ficou sob propriedade de alguém, pode ter havido fluxos financeiros, seja em termos de receitas, seja de despesas. Rendas de aluguéis podem ser considerados, assim como gastos com acabamentos e móveis, reformas, impostos ou outros custos, lembrando que os valores devem ser sempre líquidos. Com isso em mente e uma calculadora financeira HP-12C, vamos aos cálculos:
Coloque o valor de compra como “PV” (negativo), o valor de venda como “FV” (positivo), uma média entre os gastos e receitas anuais como “PMT” (negativo se forem mais despesas do que receitas e positivo em caso contrário) e o número de anos como “n”. Agora é só apertar o botão “i” e aparecerá sua taxa de retorno anual, específica para o imóvel em questão. Para terminar, é muito importante que se exclua a inflação média do período para, aí sim, termos uma noção mais precisa sobre a valorização verdadeira do imóvel.
Agora, vamos ampliar essa resposta, tentando encontrar a valorização média dos imóveis. A crença popular indica que os imóveis sempre se valorizam e, até por isso, não existem “sustos” nesse mercado. Será que é isso mesmo?
Vamos aos fatos: os dados históricos mostram que a valorização média de um imóvel na cidade de São Paulo em um período de 35 anos foi de apenas 1,23% acima da inflação, de acordo com um estudo feito pelo índice Fipezap, entre 1979 e 2015. Bem menos do que a maior parte das pessoas acredita, não é mesmo?
Ah, algumas observações importantes são que esse estudo não considerou as receitas com aluguéis, mas também não incluiu despesas de manutenção nem impostos. Além disso, os anos posteriores a 2015 não foram benéficos para os preços desse mercado tendo caído até 2019 mais 25%.
Por fim, nenhuma análise sobre um investimento está completa sem elencarmos mais dois componentes: liquidez, que é a maior ou menor facilidade para se transformar o ativo em dinheiro e o risco, que para essa análise vou admitir que seja a oscilação do preço do ativo, embora de uma forma mais ampla, risco possa significar outras coisas também.
A liquidez dos imóveis, como é sabido, é baixíssima. Algumas estimativas, como da Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), indicam que o prazo para a venda de um imóvel é de cerca de 1 ano e 4 meses. De uma forma geral podemos ter como uma boa base um prazo entre um e dois anos. E se nesse período o dono do imóvel precisar do dinheiro? Vai pagar juros caros por isso.
Já sobre o risco, embora a sensação seja a de que os preços sempre sobem, isso só acontece porque, diferentemente dos investimentos no mercado financeiro, não recebemos um extrato mensal dizendo o valor atual do imóvel, nem consultamos no aplicativo o retorno a cada dia ou semana.
De acordo com o mesmo estudo do índice Fipezap, houve períodos de grande valorização, como entre 1985 e 1989 (alta de 63%) e entre 2005 e 2014 (alta de 192%), mas também houve períodos nos quais os preços caíram de forma importante, como entre 1978 e 1984 (queda de 38%), entre 1989 e 1990 (queda de 62%) e entre 1991 e 2004 (queda de 18%).
Note que a oscilação é bastante alta e, quando levamos em conta a baixíssima liquidez e o retorno razoavelmente baixo, podemos concluir que o investimento nessa classe de ativo pode servir como diversificação para a carteira de um investidor, mas fica longe do imaginário popular de ser o “investimento dos sonhos”.
*Planejador da Fiduc
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