Para investidores em geral, duas situações são especialmente intoleráveis: perder uma oportunidade e perder dinheiro.
Em termos de desenvolvimento de uma riqueza e de investimento, o grande erro é imaginar que uma oportunidade se apresenta como uma revelação momentânea e não como resultado de um planejamento.
A construção de um patrimônio financeiro, qualquer que seja o tamanho que ele possa alcançar, não se dá pela captura das oportunidades matinais, reveladas por assessores de investimento a cada saldo disponível em sua conta, mas através de muita informação e de propósitos.
Como disse Warren Buffet – um dos mais bem-sucedidos investidores do mercado mundial –, “nunca invisto em um negócio que não consigo entender”.
O crescimento das operações estruturadas de investimento
Nos últimos anos, houve um aumento na distribuição de produtos financeiros estruturados complexos, sem informações relevantes sobre seus riscos e custos.
Algum assessor de investimento já deve ter entrado em contato com você ou alguém conhecido, oferecendo operações ou produtos de investimento “fantásticos”, através dos quais você poderá investir em mercados de risco e ainda ter seu capital “protegido” contra perdas.
Pois bem, estas operações e produtos adotam estratégias denominadas estruturadas, onde é possível expor ou manter seu capital em um mercado de risco e, ao mesmo tempo, controlar variações negativas de valor, devido a mudanças nas condições de mercado.
Embora estes produtos prometam frequentemente a proteção do capital, geração de renda e diversificação, a falta de transparência associada aos retornos líquidos, riscos e custos esperados tem suscitado preocupações significativas.
As instituições financeiras utilizam técnicas de marketing agressivas para promover estes produtos estruturados, enfatizando o potencial de rendimento e a proteção do capital. Isso pode induzir os investidores a acreditarem que estão acessando produtos sofisticados, de baixo risco e retorno potencial.
Produtos de investimento estruturados geralmente vêm com taxas e encargos ocultos, que não são imediatamente aparentes para os investidores em geral. Essas taxas podem reduzir significativamente os retornos líquidos, beneficiando as instituições financeiras às custas do capital dos investidores.
A comercialização destes produtos enfatiza a rentabilidade potencialmente superior oferecida pelos mercados de risco, aliada à proteção do capital investido, sem, contudo, detalhar o retorno líquido máximo e mínimo esperado, os custos operacionais e o fluxo de caixa exigido.
Promessas de retornos superiores e proteção do capital vêm atraindo investidores que buscam rendimentos superiores aos investimentos de renda fixa, mas com pouca experiência ou tempo para operar em mercados de risco.
Há evidências de que a complexidade desses produtos estruturados é utilizada para atrair compradores desavisados e, ao mesmo tempo, produzir lucros elevados para bancos e distribuidores.
Neste artigo, eu exploro como investidores em geral vêm sendo vorazmente enganados por estas promessas e as potenciais consequências de se investir sem conhecimento e acesso à informação completa.
Entendendo a composição das operações estruturadas
Para que você possa compreender melhor os investimentos estruturados, farei uma breve introdução sobre o mercado de derivativos.
Investir em derivativos envolve a negociação de contratos financeiros, cujo valor é derivado ou está relacionado ao valor de um ativo subjacente, como ações, commodities, moedas, taxas de juros, índices de mercado, entre outros.
Entre os derivativos estão:
▪ Contratos futuros: obrigam os compradores e vendedores a negociarem um ativo específico, em uma data futura, a um preço previamente acordado. Os principais contratos futuros negociam a taxa de juro, o índice de ações, a cotação do dólar e o preço de mercadorias como trigo, petróleo e ferro.
▪ Contratos de opção: dão ao detentor do contrato o direito, mas não a obrigação, de comprar ou vender um ativo a um preço específico, dentro de um período determinado. Os principais contratos de opção negociados dão direito ao titular de comprar ou vender ações e dólares.
Entre os estruturados estão:
Produtos estruturados são instrumentos financeiros que combinam ativos tradicionais, como ações, títulos de renda fixa, índices, moedas, mercadorias ou fundos mútuos, com derivados.
Envolvem uma engenharia financeira complexa, construída com propósitos específicos, como salvaguardar o capital investido da queda nos preços dos ativos subjacentes, alavancar os retornos potenciais ou permitir o ingresso a mercados inacessíveis diretamente.
A teoria financeira tradicional sugere que produtos financeiros estruturados abrangeriam estratégias concebidas para mitigar as consequências de eventos adversos, distribuindo o risco potencial entre várias partes interessadas.
A literatura recente sugere destinações menos bem-intencionadas, onde investidores de varejo são envolvidos pela estrutura sofisticada e ofuscados pela complexidade das operações estruturadas, incorrendo em retornos negativos, ajustados ao risco e altas taxas cobradas por bancos e corretoras.
As modalidades de operação estruturada mais divulgadas pelos emissores e distribuidores:
1. Proteção total ou parcial: são utilizados derivativos para estabelecer travas de baixa e de alta. Isso significa que você pode ter ganhos limitados, mas também sabe o quanto pode perder na operação.
2. Retorno controlado: através do uso de derivativos, o investidor terá um retorno prefixado no período, desde que, em nenhum momento, o ativo desvalorize mais que uma barreira estabelecida.
3. Bilateral: através do uso de derivativos, o investidor ganha com a volatilidade do mercado, sem precisar prever a direção do movimento de preço.
4. Alavancagem: a estratégia que combina a compra de um ativo de menor risco, como um título de renda fixa, com uma opção de compra de um ativo de maior risco, como ações. O objetivo é proporcionar ao investidor um rendimento estável (do título de renda fixa), com a possibilidade de ganhos adicionais (da opção de compra) se o preço do ativo de maior risco subir.
Apresentadas desta forma simplificada, operações complexas como as estruturadas parecem extremamente interessantes, se não fosse a relação risco/retorno desproporcional e custos extraordinários.
Não à toa, a maior corretora do país se tornou alvo de uma ação judicial por promover práticas abusivas na distribuição de produtos estruturados e levar investidores a prejuízos que alcançam R$ 18 milhões.
Os principais relatos feitos nos processos dizem respeito a investimentos em Certificados de Operações Estruturadas (COEs) e em operações estruturadas alavancadas pela corretora.
Os clientes relatam propaganda enganosa sobre os rendimentos, informações sobre os riscos e custos incompletas e promessas de retorno e proteção do capital inicial investido que não se cumprem e resultam em perdas milionárias.
Uso de investimentos estruturados para mascarar riscos e taxas
Demonstrar como a complexidade das operações estruturadas se tornou um subproduto para emissores e distribuidores não é tarefa simples. Tão difícil quanto obter informações detalhadas sobre as transações relacionadas aos produtos estruturados de varejo é fazer comparações com produtos mais simples.
Muitos produtos de investimento estruturados são vendidos diretamente aos investidores por corretores, que, no seu esquema de venda, visam investidores inexperientes.
Entre os produtos de investimento mais divulgados pelo varejo e mais lucrativos para bancos e distribuidoras estão os Certificados de Operação Estruturada – COE.
Os COEs são um instrumento financeiro que combinam características de diferentes ativos, como renda fixa e derivativos, em um único produto. O objetivo é proporcionar ao investidor a possibilidade de obter retornos maiores do que os da renda fixa tradicional, com um risco controlado.
No entanto, é importante entender como esses produtos funcionam, os custos e os potenciais riscos envolvidos.
Um estudo de pesquisadores da FGV mostrou que a esmagadora maioria dos COE’s vendidos a investidores de varejo tinha retorno esperado abaixo da chamada taxa livre de risco, ou seja, de um investimento seguro e sem risco de perda.
“O COE é, em resumo, uma espécie de Cavalo de Troia financeiro… O comprador de um COE típico investiu seu dinheiro em um produto ilíquido, sem garantia de crédito (COEs não têm cobertura do Fundo Garantidor de Crédito) e com retorno esperado abaixo do que poderia ser obtido no Tesouro Direto”, aponta estudo da FGV/EESP “O retorno esperado dos COEs.
Vamos a um exemplo prático.
Um banco emite um COE com as seguintes condições:
▪ Valor Investido: R$ 10.000,00
▪ Prazo: 5 anos
▪ Proteção de capital: 100% do capital investido
▪ Retorno condicional: se o Ibovespa subir mais de 20% no período, o investidor recebe 10% do retorno total. Se o índice subir menos de 20%, o investidor recebe apenas o capital investido.
Se o Ibovespa subir 30%, o banco ganha com a valorização, mas o investidor recebe apenas 10% do retorno total (ou seja, R$ 1.000,00), além do capital investido (R$ 10.000,00).
Se o índice não subir ou cair, o investidor recebe apenas o valor investido (R$ 10.000,00), perde a correção monetária acumulada em 5 anos, e a instituição financeira pode ter usado o seu dinheiro para outras operações que geraram lucro.
Embora os COEs possam parecer atraentes devido à proteção de capital e ao potencial de retornos superiores, eles frequentemente beneficiam mais os emissores e distribuidores do que os investidores, devido às suas estruturas complexas, custos ocultos e retornos limitados.
Considerações finais
A falta de transparência e de uma fiscalização de mercado íntegra no Brasil tornou mais fácil o repasse de produtos de investimento complexos a investidores do varejo, sob a promessa de retorno superior e proteção do capital. Para se protegerem contra a falta de transparência e as armadilhas desenvolvidas pelos emissores e distribuidores, os investidores devem observar as seguintes iniciativas:
1. Eduque-se: obtenha uma compreensão básica dos produtos financeiros, dos riscos e custos associados. Caso não seja possível desenvolver um nível de conhecimento básico ou restar qualquer dúvida sobre o risco e custos de uma oferta de investimentos, opte pelo mais simples e compreensível.
2. Faça perguntas: não hesite em fazer perguntas detalhadas ao seu assessor ou corretor sobre um produto de investimento, incluindo como os retornos são calculados, quais riscos estão envolvidos e todas as taxas associadas.
3. Formalize as respostas: solicite que o assessor/corretor de investimentos formalize as questões relevantes relacionadas à oferta de investimento, especificando:
• Como o investimento gera retorno e qual é a taxa de retorno esperada;
• Quais benchmarks (referências comparativas) são relevantes para avaliar o desempenho do investimento;
• Quais os riscos e perdas potenciais, seja em função de variações de mercado ou inadimplência;
• Por quanto tempo seu capital ficará vinculado e quando você poderá esperar retornos;
• Com que facilidade você pode comprar ou vender o investimento sem impactar significativamente seu preço;
• Como você pode sair do investimento e quaisquer condições ou penalidades para saque antecipado;
• Como o investimento será tributado;
• Detalhamento das taxas de administração, taxas de desempenho, custos de transação e quaisquer encargos ocultos.
Observação importante: não se trata do envio de regulamentos e prospectos, mas da formalização de todos os aspectos que devem ser relacionados no script de venda de um produto de investimento.
4. Cuidado com garantias: Seja cético em relação a qualquer produto que prometa retornos garantidos ou proteção de capital, especialmente se as condições não forem claramente explicadas.
5. Procure aconselhamento independente: considere a contratação periódica de um consultor de investimento independente, sem vínculo com qualquer instituição financeira, que possa fornecer uma avaliação imparcial do produto.
As informações desta coluna são de inteira responsabilidade dos autores e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação.
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