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No fio da navalha monetária: conter a inflação ou estimular o crescimento?

A manutenção dos juros num patamar alto mundo afora traz de volta o risco de estagflação, dizem estrategistas do BofA e do JP Morgan.

Manter as taxas de juros altas para enfrentar uma segunda onda de inflação ou baixar os juros para impulsionar a economia? Na coluna em que tratamos desse assunto, no início de março, afirmamos que os bancos centrais mundo afora deveriam ter muita cautela em suas estratégias ao longo de 2024. A ideia seria evitar que a política monetária gerasse um efeito excessivamente danoso sobre o crescimento econômico.

Nas últimas semanas, destacados economistas de Wall Street fizeram alertas similares: há riscos de a economia americana entrar em um ciclo de estagflação, termo que descreve um período com inflação alta e, ao mesmo tempo, recessão.

Ao longo de março, os investidores digeriram dois relatórios de inflação americana mais quentes do que o esperado. Um dos termômetros do mercado, o índice de preços ao consumidor (CPI), subiu a uma taxa de 3,2% nos últimos 12 meses encerrados em fevereiro.

Marko Kolanovic e Michael Hartnett, chefes de Estratégias Globais, respectivamente, do JP Morgan e do BofA, fizeram esse alerta. Segundo os dois, por conta de um cenário inflacionário ainda indefinido, o FED tem insistido em uma política severa de juros. Porém, como o efeito do crédito caro é a queda no consumo, a atividade econômica tem dado sinais de fraqueza. Como, aliás, nos revelam os casos de Alemanha, Japão e Inglaterra, cujos PIBs patinaram em 2023. Daí os analistas verem riscos de estagnação nos EUA caso o FED não ajuste sua rota.

De fato, se o FED errar a mão na taxa de juros há o risco de “sacrificar” um ganho relevante no PIB sem que, em contrapartida, haja um avanço efetivo no combate à inflação. O receio maior é de que, com um eventual atraso no movimento de queda, não seja mais possível reverter os malefícios da atual política monetária.

Na literatura econômica, as políticas monetária e fiscal são vistas, frequentemente, como as principais armas de política anti-inflacionária. No Brasil, a estratégia tem se concentrado na artilharia da política de juros. De forma simplificada, a ideia é que a alta da taxa de juros reduza o consumo das famílias e das empresas e, por consequência, colabore no controle de preços.

A política monetária brasileira também está na berlinda. Mesmo com o bom comportamento dos índices de preços, a taxa de juros se mantém elevada. Aliás, isso é o que o resto do mundo, a exemplo dos EUA, também está enfrentando. A grande questão é se os bancos centrais estão sendo excessivamente prudentes.

Voltando para a Terra Brasilis: depois de um ciclo de alta que elevou a Selic a 13,75%, a taxa de juros básica vem recuando lentamente, situando-se neste momento em 10,75%. Embora o BC ainda insista na condução de uma política monetária fortemente restritiva, o Relatório Focus, alto-falante do mercado financeiro, prevê que a inflação permanecerá acima do centro da meta em 2024.

Apesar de a taxa de inflação estar nos últimos anos acima do centro da meta, o Regime de Metas de Inflação, modelo de política monetária adotado pelo Banco Central, tem alcançado um relativo êxito. Desde sua introdução, há 25 anos, o regime conseguiu manter a inflação dentro da meta em 18 ocasiões.

Porém, mesmo exibindo bons números nesse campo, o modelo se defronta com críticas pesadas. Isso porque o regime de metas também é acompanhado de taxas de crescimento muito baixas. Desde sua adoção, o PIB tem crescido cerca de 2% ao ano em média. Uma política monetária rigorosa tem acompanhado esse quadro sofrível.

A despeito dessas críticas, amenizar a pressão sobre a taxa de juros, no atual contexto, requer a adoção de uma política fiscal muito mais comedida. Dado o elevado endividamento do governo, a melhora fiscal não só reduziria a percepção de risco por parte do mercado, mas também atenuaria eventuais pressões de consumo. Um bom resultado orçamentário moderaria o consumo e, ao mesmo tempo, valorizaria o real. Essa combinação de consumo menor e dólar mais barato, por sua vez, faria a inflação cair.  E seria essa queda, afinal, que abriria espaço para uma redução consistente da taxa de juros.

Em resumo, o dilema dos juros é um problema que transcende o poder regulatório dos bancos centrais e, por isso, os coloca sob o fio da navalha de decisão sobre a melhor política monetária a praticar. No Brasil é difícil pensar em uma queda mais permanente da taxa básica, se não houver, preliminarmente, um efetivo esforço fiscal.

*Alexandre Furtado é economista e sócio de Clients & Markets da Grant Thornton

*Mauro Rochlin é Doutor em Economia (UFRJ) e coordenador acadêmico na Fundação Getúlio Vargas

As informações desta coluna são de inteira responsabilidade dos autores e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação. 

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