A palavra “maturidade” nos remete a uma percepção de evolução de algo ao longo de um tempo, está diretamente relacionada à temporalidade.
Estou escrevendo esta coluna em minha casa na “roça”, numa região de grande produção de flores no interior do Rio de Janeiro. Os agricultores locais conhecem bem a importância da maturidade e do seu processo natural de evolução para a produção das flores, sabem o momento certo para colher as rosas e vendê-las ainda com os seus botões fechados, antes de desabrocharem e ficarem maduras, quando estarão abertas e lindas enfeitando a casa de seus clientes.
Analogamente, os investimentos em ESG ainda estão em um estágio de maturidade muito baixo, na fase de semeio da “plantação”, aguardando o amadurecimento até desabrochar. Se você é um investidor no Brasil, terá acesso a pouquíssimos fundos de renda fixa sustentáveis, voltados para investidores qualificados na sua maioria, aqueles que possuem altos valores de investimentos.
Terá acesso mais pleno a investimento em ações ou fundos de renda variável de empresas com mais maturidade em sustentabilidade na Bolsa, por exemplo, lastreados pelo Índice de Sustentabilidade Empresarial – ISE da B3. Porém, ainda são poucas aquelas que possuem maturidade em todos os quesitos do ESG: ambientais, sociais e de governança.
Terá pouquíssima ou nenhuma entrada nos investimentos em fundos de créditos sustentáveis como os lastreados em créditos de carbono, mercado ainda muito limitado e de difícil acesso, que começa a ser explorado por algumas empresas brasileiras que querem compensar suas emissões de gases do efeito estufa ou, pelo BNDES, que passou a ter uma linha para comprar tais créditos e incentivar a geração destes ativos financeiros pelas empresas.
Não é culpa de ninguém que nosso mercado financeiro e de capitais ainda esteja em um estágio de maturidade baixo para os investimentos sustentáveis, pelo contrário, faz parte de um processo de amadurecimento natural dos projetos, empresas e, claro, do próprio mercado.
Pensem da seguinte forma, o que temos para hoje em termos de investimentos mais maduros em ESG foi construído ao longo dos últimos 22 anos e começou pelo “G” de governança, quando dois eventos movimentaram o ano de 2001 e chacoalharam o ambiente empresarial mundial com efeitos nos mercados financeiros até os dias atuais.
O primeiro foi a descoberta do caso Enron, empresa gigante de energia americana, que manipulou seus balanços com a ajuda de empresas e bancos, escondendo dívidas de US$ 25 bilhões por dois anos consecutivos, tendo inflado artificialmente os seus lucros. O segundo, a queda das torres gêmeas nos Estados Unidos, causada por ataques terroristas.
Esses dois eventos extraordinários revelaram o grau de imaturidade em termos de riscos, controles e governança corporativa que as empresas e mercados estavam expostos. A partir desse momento, foram criadas regulações mundiais no âmbito dos mercados financeiros e de capitais que viraram tendência para coibir fraudes, ações violentas no mundo e do tipo de investimento que passamos a escolher.
A carteira de investimentos passou a ser gerida sob essas premissas e o mercado financeiro passou a oferecer mais e mais produtos com essas características. Isso é o que está começando a acontecer com as demais letras do ESG, o E (em inglês, para ambiental) e o S (de social).
Daqui a pouco, olharemos para trás e perceberemos que esse movimento inicial dado por todas as movimentações de governos e empresas em prol da salvação do mundo foi o grande precursor para a potencialização da elevação da maturidade necessária para que possamos ter acesso e retorno dos investimentos ESG e, assim como a rosa, que desabrocha no momento certo, virmos a beleza que será o desabrochar desse mercado, salvar o mundo e lucrar.
*Alexandre Furtado é Presidente do Comitê de Informações ESG da Fundação Getúlio Vargas e Diretor de ESG da Grant Thornton. |
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