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Por Dentro do Negócio

Venda da Aesop vai ajudar a Natura retomar o fôlego? 

A marca australiana pertence a um segmento premium e vinha sustentando bons resultados para a empresa brasileira

Recentemente a Natura (NTCO3) anunciou a venda da marca australiana Aesop para a L’oreal. O negócio foi fechado por US$ 2,5 bilhões. 

Desde então, uma questão tem intrigado várias pessoas no mercado: o que explica o otimismo inicial, com as ações da Natura subindo cerca de 7% logo depois do anúncio, mas na sequência um recuo de quase 13% nos dois pregões após a venda? 

No curto prazo, as preocupações do mercado sobre o nível de alavancagem da empresa devem diminuir conforme houver capacidade da empresa mostrar uma melhor posição financeira. Porém, a longo prazo, vale questionar se faz sentido que isso aconteça às custas de uma marca premium, que vinha sustentando bons resultados para compensar as quedas da Avon Internacional e da The Body Shop, também negócios da holding Natura &Co.

Desde quando a Natura adquiriu controle da Aesop em 2013, as vendas da marca aumentaram de US$ 28 milhões em 2012 para cerca de US$ 537 milhões em 2022, chegando a quase 400 lojas em 29 mercados. Um sólido crescimento em vendas, rentabilidade e novas competências foram adicionadas à Natura, além de passar a atuar no mercado internacional e oferecer serviços diferenciados no varejo.

A mesma L’oreal que agora compra a Aesop, vendeu a The Body Shop para a própria Natura em 2017, por cerca de US$ 1,1 bilhão. Aliás, a Natura aumentou muito a complexidade do negócio nos últimos cinco anos com novas marcas, países e canais de vendas para tentar formar um ecossistema cada vez mais integrado e digital de beleza.

No entanto, entre 2014 e 2018, a Natura teve resultados abaixo do esperado. Seus negócios só voltaram a crescer em 2019, alinhando o sucesso dos novos canais digitais com sua operação de vendas direta ou porta a porta. Isso deu fôlego e otimismo para a empresa dar vários passos rumo ao desenvolvimento de um ecossistema.

Contudo, com esse fôlego, ela fez movimentos que não foram tão favoráveis, como a compra da Avon em 2019, por 2 bilhões de dólares, uma marca que já estava em declínio.

Além disso, entre várias iniciativas digitais, a empresa adquiriu o aplicativo Singu para oferecer um marketplace e conectar clientes com profissionais do setor de beleza que oferecem serviços de manicure, pedicure, depilação, entre outros.

A premissa era boa: avançar com negócios em tecnologia e serviços, muito além da fabricação e venda de produtos de beleza. Apesar de ser uma estratégia interessante, o Singu ainda não havia se provado em termos de crescimento, demandaria novas competências da empresa e muito caixa para escalar.

Natura
Crédito: Adobe Stock

Perspectiva mercadológica

A transição de negócios estabelecidos com menos marcas e canais de vendas para negócios multimarcas, multicanais e digitais pode fazer com que sua lucratividade caia em território negativo, como foi o caso quando a Natura apresentou prejuízo de R$ 890 milhões no quarto trimestre de 2022, revertendo o lucro líquido de R$ 695 milhões do último trimestre de 2021.

O novo CEO do grupo Natura &Co, Fabio Barbosa, está certo ao falar sobre a busca por eficiência, menor complexidade e maior foco de atuação. Porém, enquanto pode haver otimismo na venda da Aesop a curto prazo, vender uma

marca que ia bem para alavancar a empresa e fortalecer sua estrutura financeira às custas de ficar com marcas em desaceleração, como a Avon e The Body Shop, pode ser preocupante a médio e longo prazo.

Antes do anúncio da venda, vale lembrar também que houve especulações públicas de que a empresa vinha avaliando potenciais operações para a Aesop, incluindo um IPO ou um spin-off (separação do negócio). 

É certo que o momento do mercado seria um complicador para esses caminhos, embora parecessem promissores. Por exemplo, em 18 de outubro de 2022, com as especulações sobre o spin-off da Aesop, vários veículos reportaram que a ação da Natura disparou quase 10% diante dessas duas possibilidades. Olhando movimentos de spin-offs nos Estados Unidos, Europa e Ásia como forma de reduzir complexidade entre múltiplas unidades de negócios, minha análise inicial é de que poderia ter sido um melhor caminho do ponto de vista mercadológico e de destrave de valor em relação ao caminho escolhido, de venda da marca.  

Perspectiva financeira

Mesmo do ponto de vista financeiro ainda há ressalvas, apesar do possível alívio no fluxo de caixa livre da Natura após a conclusão da venda.

Várias análises sobre a venda sugerem que a Aesop foi negociada abaixo do que deveria ter sido, considerando o múltiplo de valor da empresa dividido pelo lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações, o EV/Ebitda.

Mesmo com EV/Ebitda de 12 vezes, acima inclusive deste múltiplo da própria Natura – que é por volta de 5 vezes -, outras empresas no setor e até a própria L’oreal apresentam um múltiplo ainda maior se comparado a essa venda.

Portanto, o aspecto mercadológico e financeiro podem ter conjuntamente contribuído para diminuir o otimismo na operação.

Esse desafio está acentuado e pode ter consequências no futuro, mas isso não deve ofuscar o grande potencial da ousadia, e agora de foco, que a Natura tem mostrado no processo de transformação necessário, desafiador e admirável, sendo um motivo de orgulho por se tratar de uma empresa brasileira.

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