Quem acompanhou a novela da sanção do Orçamento da União, em abril, teve um grande exemplo de um conceito de economia não muito conhecido, mas importante para entender por que o impulso do Estado é sempre gastar mais.
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Rememorando: ao sair do Congresso, o Orçamento extrapolava em R$ 26,5 bilhões, nos cálculos do Ibre/FGV, o limite de gastos no ano. Fez isso eliminando despesas obrigatórias, como pagamento de aposentadorias e até a realização do Censo, em troca de obras eleitoreiras nas bases dos deputados e senadores. E também gastos com a Previdência e salários, além de outros importantes.
A lógica era desde o início de que mesmo que as despesas estourassem o teto de gastos, se daria um jeito. Possivelmente, deixando parte do estouro fora do Orçamento do ano, coberto por créditos extras, o que acabou acontecendo. Mas não bastou: na semana passada, já corria a articulação da ala política do governo para resgatar parte dos gastos vetados pelo presidente Jair Bolsonaro ao sancionar o Orçamento.
O tempo todo a pergunta mais lógica é: se a maioria dos gastos é obrigatória e deputados e senadores sabem, por que não financiaram suas obras com o que sobraria no Orçamento, evitando a novela em que se transformou a sanção, com danos de imagem para deputados e senadores e o Ibovespa andando de lado com as preocupações dos investidores? É aí que entra o conceito de custos difusos x benefícios concentrados.
O excesso de gastos acabará incorporado à dívida pública, com o custo, acrescido de juros, repassado às gerações futuras. Além disso, com as preocupações fiscais em alta, o Tesouro Nacional tem sido obrigado a oferecer taxas mais altas e prazos mais curtos para vender títulos. Mais custo para a dívida, que, para ser refinanciada, drena recursos necessários para o país se desenvolver.
Mas este é um custo diluído entre todos os brasileiros. Mesmo bilhões de reais têm o impacto amenizado se pulverizados entre a população. Já o impacto de uma ponte, uma estrada asfaltada ou outra obra é imediato na vida das pessoas beneficiadas. Os resultados, na forma de votos, também são quase imediatos (virão na próxima eleição) para os políticos que se apresentam como responsáveis pela melhoria.
Esta lógica foi percebida mais de cinco décadas atrás pelo economista americano Mancur Olson. A divisão dos bens públicos é vulnerável a situações em que os interesses de uma minoria são super-representados. E os interesses da maioria, difusos, são prejudicados, pois não têm como defender seus interesses com a mesma eficiência, ele escreveu no clássico “A lógica da ação coletiva Bens públicos e teoria dos grupos”.
Um exemplo mais bem acabado ainda envolve a isenção de impostos federais sobre os combustíveis por dois meses, em março e abril, para satisfazer os caminhoneiros, que, insatisfeitos com o aumento dos preços do diesel, ameaçaram fazer greve. Uma renúncia de R$ 3 bilhões paga por toda a população, tenha ou não um caminhão, para beneficiar um grupo relativamente pequeno de brasileiros – 2 milhões.
E não foi a primeira vez. Em 2018, o governo aceitou subsidiar a queda do diesel para encerrar a greve dos caminhoneiros, causando um prejuízo de R$ 13,5 bilhões aos cofres públicos. Entre a categoria, que protestava contra os aumentos diários nos combustíveis, e a Petrobras, alegando ter direito a repassar aos consumidores o aumento do petróleo, a população inteira arcou com o custo de produzir aumentos mensais.
É mais uma razão para a redução do tamanho do Estado, que não só gasta demais como muitas vezes gasta sem critério.