Com um dia de atraso foi encerrada a COP28. E como no filme 007 ou na música de Paul MacCartney, da original “Live and let day”, para vivermos, temos que deixar o petróleo e gás morrerem. O lema foi o foco principal do documento final da conferência climática das Nações Unidas (ONU): realizar uma transição energética que permita abandonar progressivamente o uso dos combustíveis fósseis.
A meta é 2050, porém, o texto não deixou muito claro se até esta data os países terão que abandonar completamente a dependência de energias fósseis ou se ocorrerá uma redução gradual até que as energias limpas se tornem predominantes nas matrizes energéticas.
No filme 007 – “Viva e Deixe Morrer” – James Bond lutou bravamente para deter um traficante que estava dominando as ruas com uma poderosa droga, a heroína, que gerava altos danos à população. Ironia do destino, a metáfora é verdadeira no que tange aos combustíveis fósseis, que são hoje os maiores causadores de emissão de gases nocivos ao planeta e que pode acabar com a raça humana.
Em nossa vida real, foi uma grande vitória para o mundo ter aparecido pela primeira vez em um documento da COP a menção ao fim de tais energias sujas e com aprovação das autoridades de todos os países, inclusive dos maiores produtores de petróleo e gás do mundo, como o anfitrião da conferência.
Porém, a negociação nos bastidores foi muito acalorada, com representantes dos países insulares ameaçados literalmente de sumirem do mapa, e por outro lado, países europeus dizendo que se a eliminação gradual dos combustíveis fósseis não constasse no documento final, que eles abandonariam as negociações.
Já as autoridades dos países que são os maiores produtores de petróleo e gás rejeitaram qualquer menção à eliminação gradual (“phase out”) desses combustíveis. A favor deles contava muito o fato da COP ter sido realizada nos Emirados Árabes Unidos.
O consenso chegou e os 199 países e a União Europeia chegaram a um acordo que foi muito comemorada pelo presidente da conferência climática, Sultan Al Jaber, que diante de aplausos dos ministros e autoridades presentes manifestou com ar de vitória que “pela primeira vez temos uma linguagem sobre combustíveis fósseis em uma declaração”.
Ou seja, oito anos após o Acordo de Paris ter iniciado mais concretamente a luta contra os efeitos negativos da mudança climática, a comunidade internacional aprova uma transição de um combustível que gerou o maior crescimento econômico da história da civilização humana para energias limpas que poderão dar uma nova arrancada no sentido de nossa sobrevivência no planeta.
O foco do documento residiu muito na transição para sistemas de energia com baixa emissões de gases nocivos ao meio ambiente, com a utilização mais ampla de tecnologias renováveis, nucleares e de captura e armazenamento de carbono. Além disso, foram propostas diversas medidas para triplicar a capacidade de produção de energia renovável globalmente, dobrando a taxa média anual de eficiência energética até 2030. O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, afirmou que “a era dos combustíveis fósseis deve acabar – e isso será feito com justiça e equidade”.
Vamos ver para crer, mas acredito que agora com a meta de fim dos combustíveis fósseis instituída, mesma que sem uma clareza de quando isso ocorrerá de fato, será incentivada a criação de diversas tecnologias que trarão muitos caminhos para atingirmos esse objetivo. E, como no trecho da música do Paul MacCartney, trilha sonora do filme 007, “Viva e deixe morrer”, esperemos que possamos viver e deixar viver com o fim dos combustíveis fósseis.
Alexandre Furtado é Presidente do Comitê de Informações ESG da Fundação Getúlio Vargas, Sócio e Diretor de ESG da Grant Thornton.
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