Será um momento decisivo para o ‘Milei trade’ — e ninguém quer ser pego do lado errado dessa aposta novamente.

A venda frenética que abalou os mercados da Argentina no mês passado, após o partido do presidente Javier Milei ter sido derrotado nas urnas, deixou investidores globais em alerta para outro possível tombo após as eleições legislativas de domingo.

Gestores e estrategistas afirmam que, se sua coalizão La Libertad Avanza conseguir garantir um terço das cadeiras no Congresso, os mercados poderão ver uma retomada.

Mas, mesmo com essa meta modesta — antes da derrota do mês passado, as expectativas eram de um número maior —, bancos como o Morgan Stanley e o UBS alertam para riscos expressivos de perdas: um desempenho mais fraco provavelmente será visto como uma ameaça à agenda de reformas econômicas de Milei e à enxurrada de dinheiro de ajuda que os Estados Unidos injetaram para sustentar a moeda do país.

“Se as eleições correrem muito bem e o partido dele conseguir um terço, acho que a Argentina vai se recuperar — mas não quero ser pego num cenário negativo”, disse Ray Zucaro, diretor de investimentos da RVX Asset Management, em Miami. “Prefiro estar neutro, sem uma posição grande.”

Os mercados da Argentina se estabilizaram desde que o governo Trump interveio para comprar pesos e ofereceu uma linha de crédito de US$ 20 bilhões para evitar que Milei enfrentasse uma crise cambial antes da eleição.

Os títulos em dólares do país registravam ganhos nesta sexta-feira. As notas com vencimento em 2035 subiam meio centavo de dólar, para perto de 57 centavos de dólar, de acordo com dados indicativos de preços compilados pela Bloomberg. Enquanto isso, a moeda enfraqueceu levemente em Buenos Aires em meio a negociações reduzidas.

Perdas na Argentina

Mas as lembranças das perdas acentuadas do mês passado, que se seguiram à derrota do partido de Milei na eleição de Buenos Aires, estão deixando os investidores tensos. O episódio forçou os bancos de Wall Street a desfazer apostas otimistas e abalou investidores globais que, antes, apostavam que o plano do economista libertário de cortar gastos e regulações poderia virar a pagina de uma Argentina marcada por décadas de inflação altíssima e calotes soberanos.

Isso transformou as eleições legislativas em um teste crucial sobre se Milei será capaz de continuar com sua agenda, que mostrou sucesso na redução da inflação, mas deixou eleitores descontentes devido aos cortes profundos em programas governamentais sem concretizar a prometida recuperação. Ele também enfrenta um escândalo de corrupção envolvendo seu círculo íntimo, o que minou sua imagem de reformista.

Apoio a Milei

A questão central será se Milei conseguirá manter apoio suficiente no legislativo para vetar eventuais medidas da oposição peronista para reverter sua agenda. Os investidores também estarão atentos a sinais de que o resultado o levará a adotar uma abordagem mais conciliadora em relação aos seus adversários políticos.

“O verdadeiro teste estará na estratégia pós-eleitoral de Milei”, escreveu em nota a clientes o economista Diego Pereira, do JPMorgan. Ele disse que uma narrativa de “derrota nacional” provavelmente se consolidará se Milei obtiver cerca de 31% a 32% dos votos e perder na maioria das províncias.

“Possuir um ‘terço de veto’ no Congresso não substitui as alianças necessárias para aprovar reformas macroeconômicas críticas; uma mudança de uma retórica combativa para uma governança pragmática é essencial”, afirmou Pereira.

Pedro Quintanilla-Dieck, estrategista do UBS, disse que operadores “não esperam um resultado forte” para Milei nas urnas, e estima que seu desempenho deve ficar na casa dos 30%.

Há também forte dúvida sobre se a Argentina conseguirá manter a banda de negociação atual para o peso, amplamente visto como supervalorizado. O governo gastou bilhões de dólares em compras da moeda para sustentá-la, enquanto investidores estrangeiros saíam do país e argentinos cautelosos migravam suas economias para a moeda americana, antecipando que o presidente apenas adia outra desvalorização do peso até depois das eleições.

Essas preocupações foram alimentadas por comentários do presidente dos EUA, Donald Trump, que indicou que seu governo cortaria o apoio financeiro se a agenda de Milei fosse derrotada.

Cautela

O Morgan Stanley apontou um possível cenário intermediário, no qual o partido de Milei obtém 30% a 35% dos votos. Esse resultado — não tão positivo quanto Milei com desempenho próximo dos 40% — provavelmente manteria o apoio dos EUA, embora o progresso em sua agenda possa ser lento. A mensagem do banco para os clientes: não façam apostas direcionais significativas antes da eleição.

Na Gramercy Funds Management, Belinda Hill tem adotado uma postura igualmente cautelosa.

“Não acho que ninguém consiga prever o que vai acontecer na votação”, disse Hill, gestora de portfólio do fundo sediado em West Palm Beach, na Flórida. “Estamos mais focados em entender se Milei conseguirá construir uma coalizão após a eleição e quais políticas virão a seguir, para então definirmos o posicionamento adequado.”