É uma questão de tempo para que o mercado entenda que a última decisão do Copom foi técnica, e que todos os integrantes do comitê estão alinhados sobre o diagnóstico do momento atual da inflação. Essa foi a mensagem que o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, reiterou em evento realizado em São Paulo.
A divisão no placar da decisão, afirma, gerou ruídos, e isso fez subir o prêmio de risco – o juro adicional que os investidores exigem para financiar o Tesouro. “Mas foi uma questão técnica, acho que ao longo do tempo as pessoas vão entender, vai ficar claro”, disse.
Não é a primeira vez que Campos Neto fala sobre os quatro votos dissidentes, a favor de uma redução da Selic em 0,5 ponto porcentual. Mas o assunto continua na pauta, confirmando que a ansiedade gerada pelo evento não foi superada. Não apenas os juros futuros e o dólar em alta expressam esse desconforto, como alguns dos participantes do encontro promovido pelo Lide, que reuniu cerca de 200 executivos de empresas e instituições financeiras.
Uma pesquisa realizada pela Febraban junto a instituições financeiras, diz o presidente da entidade, Isaac Sidney, mostrou o seguinte: 44% dos entrevistados entendem que a divisão do placar afetou a “credibilidade monetária”, e que isso se traduz na piora das expectativas de inflação.
Já Henrique Meirelles, ex-ministro e ex-presidente do BC, destacou a importância das expectativas no resultado da política monetária. Antes do evento, mencionou, em conversa rápida com o InvestNews, sua preocupação com a sucessão de Campos Neto.
Campos Neto reconheceu que esses ruídos ajudam a piorar as expectativas de inflação. Mastambém afirma que, dentro de três ou seis meses, esses receios devem passar. E que ficará claro que a diretoria toda “é muito técnica”.
A divergência, afirmou, foi apenas sobre o custo de se manter o guidance – a sinalização – de que haveria um novo corte de 0,5 ponto. Sobre o aumento dos riscos no cenário de inflação, todos estavam de acordo, garantiu.
O que está atrapalhando a vida dos bancos centrais neste momento, explicou Campos Neto, é que, depois de um período de queda da inflação, não há um potencial de desinflação adicional no horizonte – nem no Brasil, nem no mundo.
A inflação dos serviços continua alta, assim como a de energia. Ao mesmo tempo, a de bens já está baixa, e, portanto, tem pouco espaço para quedas adicionais. Parte desse quadro se explica pelo fato de que o mercado de trabalho continua aquecido, mesmo com o aperto monetário dos BCs.
Isso pode ser uma pedra no sapato de que espera por cortes mais firmes nos juros. Por outro lado, é uma notícia boa em si. Mostra que a atividade econômica resistiu bem – não entrou em recessão com os juros altos.
“A corrida só acaba depois da última milha”, afirmou Campos Neto. “E estamos na última milha da inflação”.
Veja também
- Dólar mais barato, real mais caro: como a nova direção dos juros afeta a sua vida
- Lula não percebeu que inflação castiga mais do que a Selic, diz Zeina Latif
- Dólar volta a subir após declarações de Lula
- Haddad diz que governo vai superar ‘qualquer que seja’ decisão do Copom
- Copom: voto unânime na Selic em 10,5% pode embaralhar sucessão do BC