Economia
Dólar segue em tendência de alta mesmo com subida da Selic, dizem especialistas
BC elevou o ritmo de alta dos juros, mas receios fiscais seguem pressionando o dólar.
Apesar do ciclo de alta da taxa Selic ter ganhado força, o mercado brasileiro não deve se tornar suficientemente atraente para o investidor estrangeiro a ponto de reverter a pressão de alta do dólar em novembro. É o que dizem especialistas ouvidos pelo InvestNews, que apontam os riscos fiscais e políticos como os principais fatores responsáveis por manter a tendência de desvalorização do real.
O dólar encerrou outubro com avanço de 3,71% sobre o real, a R$ 5,6476. No mês, a moeda chegou a atingir a máxima de R$ 5,6899 no dia 21, em meio a temores do mercado sobre o teto de gastos depois que o ministro da Economia, Paulo Guedes, admitiu que a regra fiscal pode ficar de lado para acomodar um aumento de gastos para bancar o Auxílio Brasil de R$ 400.
Após dias de tensão no mercado, ainda em outubro, o Banco Central anunciou sua decisão de elevar a Selic em 1,5 ponto percentual, para 7,75% ao ano, sinalizando mais um avanço da mesma magnitude em dezembro e colocando o Brasil na liderança no ranking de maiores taxas de juros reais no mundo.
Juros mais altos tendem a atrair investidores de fora em busca de retorno maior para seus recursos, o que aumenta a quantidade de dólares entrando no país e, na teoria, deveria baixar o preço da moeda norte-americana em reais. Porém, essa não é a perspectiva agora, segundo especialistas.
“Em época em que você aumenta os juros no país, você dá uma certa valorizada na sua moeda porque entra num fluxo de dólar muito grande, então a tendência era que o dólar caísse para o próximo mês. Mas, em virtude desse cenário conturbado político e fiscal, acaba sendo uma incógnita. Sugere-se muito mais que o câmbio vai continuar subindo no próximo mês do que uma depreciação”, analisa Fabrício Gonçalvez, CEO e fundador da BOX Asset Management.
“Nossa taxa de juros hoje é de 7,75%. Porém, mesmo com toda essa atratividade de investimento com essa taxa, não está tendo entrada de capital estrangeiro. Ninguém está querendo investir no Brasil, e isso é ruim”, concorda Leonardo Santana, especialista da Top Gain.
Cenário externo
Se a alta da Selic não é suficiente para amenizar as incertezas dos investidores estrangeiros, há ainda outro fator a ser considerado: o cenário externo. Países de economia avançada também podem reduzir estímulos e até elevar juros.
“A Europa com uma inflação que eles nunca tiveram antes, saindo da pandemia, os Estados Unidos tirando a injeção monetária a partir do mês que vem, de novembro… Isso é ruim para a nossa economia. A gente está bem atento ao que os países lá fora vão fazer para que a gente consiga uma correção maior do dólar”, comenta Anilson Moretti, head de câmbio da HCI Invest.
“À frente, o que nós temos já no início do mês? Política monetária dos Estados Unidos. Desde taxa de juros, que por enquanto está inalterada, mas principalmente as perspectivas econômicas. Uma das que o mercado está aguardando é justamente a retirada de estímulos à economia”, diz Santana, da Top Gain.
Essa retirada, conhecida pelo mercado como “tapering”, incluiria redução de compra de títulos pelo Federal Reserve (Fed), banco central dos Estados Unidos, o que reduziria a injeção de dólares na economia norte-americana e daria força à moeda.
As atenções também devem se voltar aos juros nos EUA. Uma alta faria com que, apesar de ser um dos países com a maior taxa de juros, o Brasil perdesse uma eventual atratividade para os investidores – a não ser que o BC eleve ainda mais a Selic.
Santana não descarta que o cenário peça que o BC, de fato, aumente ainda mais o ritmo de aperto monetário. “Na última reunião tivemos um aumento de 1,5 ponto e já está garantido mais 1,5 ponto. Só que, se o nosso câmbio continuar aumentando, esse 1,5 vai ter que possivelmente ser um pouco maior.”
Quando o dólar vai cair?
Os especialistas ouvidos pelo InvestNews não enxergam sinais de queda do dólar. João Beck, economista e sócio da BRA, afirma que fatores técnicos, como intervenções do BC no câmbio, até podem trazer algum alívio, mas ele seria pontual e de curto prazo.
“É esperado que uma ausência de notícias ruins do Congresso, combinada com a recente mão pesada nos juros desta semana pelo Banco Central, assim como intervenções esporádicas do mesmo Banco Central na ponta vendida do câmbio, deem alívio técnico para a moeda. Há um fluxo, ainda modesto, de recursos estrangeiros entrando no país nos últimos dois meses, números bons de balança comercial, assim como uma temporada de balanços corporativos levemente acima do esperado. Seria um alívio técnico e pontual”, diz ele.
Mas Beck ressalta que “uma valorização do real para prazos mais longos somente (pode acontecer) quando o mercado se convencer de que o puxadinho do teto de gastos é somente para os R$ 100 adicionais do Auxílio Brasil e não por uma opção casuística de ganhar base de governo ou fins eleitorais”.
Diante das incertezas, Santana acredita que o dólar pode chegar a R$ 6 ainda em 2021. “A PEC dos precatórios poderia dar um alívio pelo menos momentâneo no mercado, além de o BC conseguir, com vários swaps (interferências técnicas), controlar o câmbio. Caso contrário, sim, teremos a possibilidade de um câmbio mais alto, chegando facilmente a R$ 5,80 e, quem sabe, R$ 6 até o final do ano, infelizmente, por toda a demanda de saída que a gente tem de dólar.”
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