O cerco estava se fechando. E o governo, enfim, decidiu sobretaxar a importação de 11 produtos de aço com uma alíquota emergencial de 25%. A medida vem atender – ao menos parcialmente – ao clamor do setor de siderurgia, que há meses vem acusando perda de competitividade em relação à enxurrada de importação da matéria-prima da China. Mas, coincidência ou não, a resposta veio apenas depois dos Estados Unidos também manifestarem publicamente uma grande preocupação com o tema.
A Câmara de Comércio Exterior do Brasil anunciou nesta terça (23) à tarde a elevação para 25% da tarifa do Imposto de Importação de 11 produtos de aço, mas apenas para o volume importado que ultrapassar um determinado limite, ou cotas, estabelecido para cada um dos itens. O comitê não disse quais são esses produtos, mas já adiantou que outros quatro estão sob análise e poderão receber o mesmo tratamento.
A medida deve entrar em vigor dentro de 30 dias e tem prazo de validade: 12 meses. A importação da maior parte desses produtos já tinha uma taxação entre 10,8% e 12%.
A taxação de 25% atende às reivindicações das siderúrgicas, porque nivela a alíquota à que vigora nos Estados Unidos, México e Europa. Mas o fato de ser uma medida temporária, na visão do Morgan Stanley, parece ser uma opção por um caminho do meio, da conciliação entre os interesses do setor com os do governo, que vem indicando preocupação com a inflação. Uma taxação maior do aço poderia ter impacto nos preços de produtos que têm o aço como insumo.
Tanto é que representantes das indústrias de uso intensivo de aço também começaram a se movimentar nos últimos dias tentando barrar a taxação do produto chinês. Na semana passada, essas entidades foram a Brasília para alertar o governo sobre os riscos que encarecer o aço vindo da China poderia trazer: inflação, aumento dos custos, perda de competitividade da indústria nacional e prejuízos para os investimentos.
Na queda de braço, ganhou o setor siderúrgico. E uma das razões para isso foi a entrada de um player global importante nessa discussão: os Estados Unidos. O presidente americano, Joe Biden, pediu na semana passada a triplicação da tarifa básica sobre o aço chinês para 25%. Taxação que se somaria a outra tarifa de 25%, definida em 2018 pela administração Trump.
Washington anunciou em paralelo o início de uma investigação sobre as “práticas desleais da China nos setores dos estaleiros, transporte marítimo e logística”. A iniciativa responde a um pedido de várias organizações sindicais desses setores, que denunciam as políticas chinesas, “mais agressivas e intervencionistas que as de qualquer outro país”.
Essa movimentação nos Estados Unidos pode ter trazido um senso de urgência ao governo brasileiro. Afinal, o aço que o mercado americano deixar de comprar da China poderia ser destinado ao Brasil. E isso agravaria o quadro por aqui.
Liquidação do aço
O pano de fundo para o incômodo da indústria siderúrgica no mundo é a desaceleração do setor imobiliário na China. Com uma demanda mais fraca, está sobrando aço por lá. Para aliviar o estoque, as siderúrgicas chinesas estão oferecendo o produto para vários países do mundo a preços promocionais. E o Brasil é um desses destinos.
No anúncio da tarifa mais alta, o governo brasileiro admitiu que a decisão foi tomada diante da constatação de que o volume de compras externas da matéria-prima, em 2023, superou em 30% a média das compras ocorridas entre 2020 e 2022.
A China exportou 90 milhões de toneladas e o Brasil foi o sétimo principal destino dos embarques. Parte desses produtos tomou mercado de companhias como CSN, Usiminas, Gerdau e outras produtoras locais, cujas lideranças vêm manifestando publicamente preocupação com essa concorrência.
Um dos executivos mais vocais nessa questão foi o presidente global da Gerdau, Gustavo Werneck. Em entrevista no início do ano para comentar o balanço financeiro da companhia de 2023, Werneck afirmou que os danos das importações à indústria do aço no país foram fortes, levaram à redução de produção das empresas e à queda nos ganhos de competitividade. Com isso, a empresa demitiu mais de mil pessoas no ano passado.
Outras empresas também fizeram coro às reivindicações. Foi o caso da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), que chegou a protocolar no início deste ano duas petições no Departamento de Defesa Comercial (Decom), em Brasília, visando uma potencial abertura de processo antidumping contra material oriundo da China.
Desde o início do ano, o Instituto Aço Brasil, que reúne a maioria das fabricantes locais, também ampliou a pressão sobre o governo federal para que se aplicasse a alíquota emergencial, de 25%, sobre todos os tipos de produtos siderúrgicos importados, principalmente de China, Rússia e Coreia do Sul.
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