As inundações e as chuvas intensas que assolaram o sul do Brasil estão prejudicando o setor agrícola, motor da economia nacional, com indústrias desde a fabricação de automóveis até bancos e seguradoras se preparando para interrupções.
Chuvas intensas no Rio Grande do Sul, estado mais ao sul do Brasil, deixaram cidades inteiras debaixo d’água e fecharam indefinidamente seu principal aeroporto. Mais de 400 municípios e 1,5 milhão de pessoas foram afetados, segundo os dados governamentais mais recentes. Cerca de 164 mil moradores foram deslocados e 100 morreram como resultado da precipitação, que começou em 28 de abril.
Estimativas iniciais da Enki Research sugerem um impacto econômico de pelo menos US$ 2,5 bilhões no estado (R$ 12,7 bilhões). Esse número preliminar, baseado em modelos de pesquisa e dados de satélite, deve aumentar, já que os níveis de água ainda estão altos e mais tempestades são esperadas na região nos próximos dias.
“Isso se refere a danos físicos à infraestrutura e à agricultura, juntamente com perdas de receita comercial não recuperadas dentro de seis meses”, disse Chuck Watson, da Enki. “Mais chuva está prevista para a próxima semana, então, infelizmente, provavelmente ficará pior.”
Os primeiros efeitos já foram vistos na agricultura, com o preço da soja subindo devido ao temor de “redução na colheita e piora na qualidade”, segundo um relatório da XP Inc. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse na terça-feira que o país pode ter que importar arroz e feijão – o Rio Grande do Sul responde por cerca de 60% da produção de arroz, um item básico na dieta do país. A produção de carne também pode ser afetada, já que o estado é responsável por cerca de 17% da produção de carne suína e 13% de aves do país, disse a XP.
A empresa de serviços e insumos agrícolas Tres Tentos Agroindustrial SA caiu mais de 6% devido a preocupações com o impacto das enchentes em suas operações. A produtora de arroz Camil Alimentos SA estava atrás do índice Ibovespa no início desta semana, com a XP estimando que cerca de 15% das safras na parte sul do estado ainda precisavam ser colhidas. As ações se recuperaram na quarta-feira depois que a empresa disse que conseguiu manter o suprimento de arroz e feijão estável apesar dos desafios logísticos.
A BRF SA também caiu no início desta semana após suspender atividades em algumas de suas unidades na região, com analistas estimando que entre 10% e 15% de sua capacidade total possam ser impactados. A ação subiu na quarta-feira depois que a empresa divulgou os resultados do primeiro trimestre.
Com perdas em larga escala esperadas no agronegócio, que representa um quarto da economia brasileira, os bancos provavelmente terão que renegociar dívidas para o setor, estendendo prazos e oferecendo taxas de juros mais baixas, disseram analistas do Bank of America em um relatório. Sua maior preocupação é com o Banrisul, o banco estadual formalmente conhecido como Banco do Estado do Rio Grande do Sul SA, que tem 85% de seus empréstimos vinculados ao Sul do Brasil, disse o BofA.
As ações do Banrisul caíram cerca de 8,3% nesta semana, ficando atrás de um amplo índice de bancos brasileiros. Em comunicado na terça-feira, o banco disse que estava totalmente operacional e tentando apoiar os clientes da melhor maneira possível. As chuvas não tiveram impacto material nas propriedades do banco, disse, acrescentando que ainda não podia estimar o impacto do evento climático em seus negócios.
Entre os financeiros, o BofA também citou o Banco ABC Brasil SA e a corretora XP Inc, cada um com cerca de 20% de suas carteiras de empréstimos expostas à região, seguidos pelo Banco do Brasil SA, com 18%, Nubank – formalmente conhecido como Nu Holdings Ltd – e Banco Bradesco SA, com 15% cada.
As inundações também forçaram paralisações na fabricação. A Gerdau SA interrompeu as operações em duas unidades, que representam cerca de 5% da capacidade total de aço da empresa e cerca de 10% da capacidade de aço do Brasil, enquanto a General Motors suspendeu os trabalhos em sua fábrica no estado até sexta-feira, estendendo uma paralisação programada.
As concessionárias de serviços públicos também devem registrar perdas: a Eletrobras teve uma usina fechada devido a inundações, e a CPFL Energia SA deve sofrer impactos em seus segmentos de transmissão e geração após uma barragem em uma de suas usinas hidrelétricas ter sido danificada e as instalações inundadas. A XP estima que cinco dias sem energia para os 250.000 clientes da empresa custariam 15 milhões de reais (US$ 3 milhões) em receita.
As empresas ainda estão avaliando os impactos. A Gerdau disse que as operações no estado permanecem paralisadas até que as atividades possam ser retomadas com segurança, enquanto a Tres Tentos disse que suas fábricas e lojas estão operando normalmente. Bradesco, BRF, ABC Brasil e Banco do Brasil se recusaram a comentar – os dois últimos devido aos períodos de silêncio antes dos resultados. Eletrobras, CPFL e Nubank não responderam imediatamente aos pedidos de comentário.
Veja também
- Em almoço com banqueiros, Haddad tenta reconquistar o mercado. Mas o caminho será longo
- Americanos querem que Trump resolva imigração primeiro e desigualdade de renda na sequência
- PIB dos EUA cresce 2,8% no 3º trimestre impulsionado por gastos de defesa e consumo
- Dólar a R$ 6,00 e pressão sobre os juros: o contágio do ‘Trump trade’ para o Brasil
- O pacote de estímulos da China ainda não convenceu os economistas. A solução? Mais estímulos