Uma coalizão formada por 230 organizações e empresas, que se define como “um dos raros foros de diálogo entre o agronegócio e ambientalistas”, enviou ontem ao governo federal um conjunto de seis propostas para deter o desmatamento na Amazônia. O documento, ao qual o “Estadão” teve acesso, foi encaminhado ao presidente Jair Bolsonaro e ao vice-presidente Hamilton Mourão, além dos ministérios da Agricultura, Meio Ambiente, Economia e Ciência e Tecnologia. As propostas chegaram ainda às mãos de líderes e parlamentares da Câmara e do Senado, ao parlamento europeu e embaixadas de países europeus.
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A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura reúne nomes da área ambiental como WWF Brasil, WRI Brasil, TNC, Imazon e Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). Do lado do agronegócio e da indústria estão companhias como JBS, Klabin, Marfrig, Amaggi, Basf, Danone, Natura e Unilever.
Segundo o diretor executivo do Ipam, André Guimarães, representante da Coalizão Brasil, as medidas atacam as causas do desmatamento e podem ser implantadas imediatamente, com resultados permanentes. “O desmatamento descontrolado cria instabilidade ao País, ao clima, ao meio ambiente, aos empresários. Quem ganha com isso é quem opera na ilegalidade“, diz Guimarães. “O que nós precisamos é de mais vozes sensatas e equilibradas para uma sociedade que construa respostas e mude posturas do próprio setor privado. Estamos construindo consensos.”
Propostas
A primeira das seis ações propostas para reduzir o desmatamento pede a retomada da fiscalização, com punição pelos crimes ambientais identificados. “Para retomar e intensificar ações de fiscalização é necessário apoiar e ampliar o uso de inteligência e expertise do Ibama, Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) e Funai, com responsabilização pelos ilícitos ambientais por meio da punição ágil, ampla e eficiente dos infratores”, afirma o documento.
Segundo a coalizão, notificações e embargos de áreas podem ser realizados de forma simples e quase automaticamente, cruzando os dados de desmatamento com as informações de bancos de dados oficiais, como Sistema do Cadastro Ambiental Rural (Sicar) ou registros de Posse de Terras (que permitem a identificação do detentor da terra).
Outra medida cobra a suspensão dos registros do Cadastro Ambiental Rural (CAR) que incidem sobre florestas públicas e responsabilização por eventuais desmatamentos ilegais. Há mais de 11 milhões de hectares no sistema declarados sobre florestas públicas que acabam sendo utilizados para legitimar processos de grilagem.
A terceira ação prevista pela coalizão pede a destinação de 10 milhões de hectares à proteção e uso sustentável, com a meta de selecionar, num prazo de 90 dias, a partir do Cadastro Nacional de Florestas Públicas, a terra que possa ser designada como área protegida de uso restrito e de uso sustentável em regiões sob forte pressão de desmatamento. Esse foi o caso, por exemplo, da criação de 24 milhões de hectares de áreas sob proteção na região da Terra do Meio, no Pará.
A quarta proposta prevê que a oferta de financiamentos passe a adotar critérios socioambientais. A ideia é que, quando observados os cadastros ambientais rurais com desmatamento posterior a julho de 2008, essas operações de crédito sejam bloqueadas até que o responsável apresente à instituição financeira a autorização de supressão emitida pelo órgão responsável para o local desmatado.
Em uma quinta ação, as empresas e associações pedem total transparência e eficiência às autorizações de cortes de vegetação. Elas pedem que os órgãos estaduais de meio ambiente tornem públicos os dados referentes às autorizações que emitem, por meio do sistema Sinaflor, do Ibama.
A sexta e última proposta requer a suspensão de todos os processos de regularização fundiária de imóveis com desmatamento após julho de 2008, até que as áreas estejam plenamente recuperadas. “Quem desmata em área não regularizada comete crimes ambientais e não deve ser beneficiado com a regularização fundiária”, afirmam as companhias e organizações.
Prioridade
O desmatamento deixou de ser uma preocupação só de parte da sociedade ou de organizações ambientais para entrar no rol de prioridades dos investidores. A preservação da Amazônia está na pauta das instituições internacionais e dos principais bancos privados brasileiros – Bradesco, Itaú Unibanco e Santander -, que têm alertado para as consequências dos impactos econômicos causados pela destruição da floresta.
Desde o ano passado, quando o Brasil registrou volumes recordes de desmatamento, o governo passou a ser fortemente pressionado, inclusive pelo agronegócio, para tomar medidas efetivas de combate aos crimes ambientais.
Para Marcello Brito, presidente da Associação Brasileira de Agronegócio (Abag), também da Coalizão Brasil, o desmatamento da Amazônia se confirma como um dos maiores riscos à economia brasileira, porque o agronegócio responsável pode ser prejudicado em suas exportações se o País não combater os crimes ambientais. “O trabalho da coalizão reforça as diversas iniciativas que estão em andamento. Essas medidas não reinventam a roda, elas apenas cobram que sejam colocadas em prática ações já possíveis”, comenta Brito. “Não procuramos confronto ou contraponto com o governo. Buscamos uma mensagem concreta. Claramente temos um efeito de mudanças climáticas no mundo. É o agronegócio sério, com todas essas empresas, que pede uma ação.”