Economia

Preço da gasolina recua, mas petróleo e impostos deixam incertezas para 2024

Brent, mudanças na Petrobras e na tributação: relembre a trajetória dos preços entre guerra na Ucrânia e de Gaza.

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O preço da gasolina caiu 1,53% em outubro, ajudando a segurar a alta de 0,24% do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), segundo dados divulgados nesta sexta-feira (10). Mesmo com o foco do mercado externo nos preços do petróleo pelo novo conflito no Oriente Médio, o valor por litro nos postos brasileiros segue na casa dos R$ 5 – bem diferente dos mais de R$ 7 da época da eclosão da guerra na Ucrânia. Porém, para os próximos meses, especialistas apontam que o cenário é de indefinição. 

Isso porque, além do conflito geopolítico na Faixa de Gaza, ainda há dúvidas sobre o que será da demanda por combustíveis no mundo diante das incertezas sobre a economia da China e a continuidade do aumento de juros nos Estados Unidos, que impacta a atividade global como um todo. 

Trabalhador abastece carro em posto de gasolina da Petrobras em Brasília. 07/03/2022 REUTERS/Adriano Machado

Nesse cenário, a oferta também segue no foco, de olho nos movimentos da Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados (Opep+). Nos últimos meses, anúncios de cortes de produção chegaram a puxar o barril do Brent para máximas de US$ 94

Enquanto isso, no Brasil, se a disparada da gasolina foi contida em 2022 pelo corte de impostos federais, para 2024 a perspectiva é de aumento do Imposto sobre Operações e Serviços (ICMS), já anunciado pelos estados. 

Duas guerras: o que mudou? 

Segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), o preço médio da gasolina nos postos pelo país estava em R$ 5,65 por litro no encerramento da última semana, enquanto, lá fora, o barril do Brent ronda o patamar de US$ 80. 

Em 2022, o preço do combustível chegou a R$ 7,28, em média, após a invasão da Ucrânia pela Rússia, dando origem ao conflito que levou a cotação do petróleo a mais de US$ 116 por barril. 

Uma das grandes diferenças entre os dois momentos está no possível impacto dos conflitos para o mercado de petróleo. Se uma guerra com a Rússia significava certeza de envolvimento de um dos principais produtores do mundo, no caso de Israel o impacto seria sentido somente com uma eventual inclusão de outros países da região, como o Irã.

“Cerca de um terço das exportações de petróleo do mundo tem origem no Oriente Médio, mas Israel e Palestina não são grandes regiões produtoras, não se compara a Arábia Saudita ou Irã”, explica João Victor Marques, pesquisador da FGV Energia.

No entanto, não se pode esquecer que “sempre tem um risco”, como aponta Pedro Rodrigues, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), sobre a possibilidade de “o conflito crescer e chegar até o Irã”. Não à toa, logo após o ataque do Hamas a Israel, a cotação do petróleo chegou a subir mais de 4% como efeito imediato das primeiras incertezas, dissipadas na sequência. 

  • Confira ações da Petrobras (PETR4)
Bomba de petróleo em Almetyevsk, Rússia. REUTERS/Alexander Manzyuk/File Photo

Mas, além dos envolvidos diretos nos conflitos, os especialistas comentam ainda o cenário econômico de cada momento, e como essas diferenças também afetam os preços. 

“A guerra da Ucrânia acabou acelerando uma trajetória que já estava acontecendo no mercado. Vínhamos de um aumento sustentado nos preços do petróleo, porque a gente saiu de um momento de sobreoferta em 2020 e, em 2021, naquele momento de retorno das atividades, com uma demanda mais fortalecida, a situação da oferta já não se encontrava mais como nos anos anteriores à pandemia”

João Victor Marques, pesquisador da FGV Energia

Marques aponta, assim, que o conflito no leste europeu apenas “acirrou” um cenário que já apontava para o petróleo em alta.

De lá para cá, porém, surpresas pelo caminho mudaram as perspectivas para as cotações. As principais foram a decepção com a atividade na China e os indícios de um aperto monetário mais longo e intenso que o esperado nos Estados Unidos – dois fatores que pressionam a demanda por combustíveis para baixo. 

Área de compras em Xangai 10/05/2021. REUTERS/Aly Song

Agora, a expectativa é de que a economia chinesa volte a acelerar nos próximos meses, enquanto a Opep+ tem se mostrado pronta para mais cortes de oferta de petróleo se isso for necessário para segurar os preços – embora o que se esteja vendo seja outros países aumentando sua produção, como Estados Unidos, conforme aponta Rodrigues. 

E foi nesse cenário que explodiram as primeiras bombas em Israel e Gaza. “Essa crise mais uma vez acirra os fundamentos de mercado que já estavam colocados”, diz Marques. 

No Brasil: o que não se controla…

Ainda que a disparada do preço a gasolina em 2022 vindo em pleno ano eleitoral, mudanças nas regras de mercado impediram controle político da Petrobras para que a estatal (assim como se havia feito anos antes) segurasse os preços de forma artificial – mesmo com uma sequência de trocas no comando da empresa

Foi nesse contexto que, em maio daquele ano, a Petrobras anunciou uma mudança na política de preços, abandonando a Paridade de Preços de Importação (PPI) para adotar outros critérios nos reajustes nas refinarias, sob a justificativa de reduzir o repasse da volatilidade ao mercado interno. 

Logo da Petrobras em refinaria de Paulínia 25/05/2022 REUTERS/Paulo Whitaker/File Photo/File Photo/File Photo

O que se viu nos meses seguintes até agora foi uma diminuição na frequência dos reajustes, embora os valores praticados pela estatal ainda sigam, de maneira geral, a tendência do que acontece lá fora. 

“Com a mudança, a política de preços se tornou menos transparente, porque a Petrobras botou variáveis incalculáveis. É impossível para qualquer analista saber o que aquilo quer dizer do ponto de vista quantitativo, criou uma obscuridade no mercado interno”, critica Rodrigues, do CBIE, porém emendando que, na prática, os efeitos da nova políticas acabaram sendo os mesmos da anterior.

“No final do dia, a Petrobras acaba seguindo um pouco da PPI sem falar que é PPI. Em uma das últimas mudanças, com a ANP estava alertando para desabastecimento, e a Petrobras foi obrigada a reajustar. A defasagem (dos preços internos na comparação com o exterior) chegou a 25%, e a companhia chegou a dar aquele grande aumento.”

Pedro Rodrigues, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE)

A grande atenção sobre os reajustes da Petrobras reside no fato de que o Brasil, apesar de ser autossuficiente em petróleo, não refina todo o combustível que consome. Assim, preços mais baixos internamente desestimulam que importadores tragam o que falta do mercado externo, já que pagariam lá fora um valor mais elevado do que a Petrobras, que detém a maior parte do mercado brasileiro, pratica por aqui. 

A questão ganha ainda mais força com a atividade econômica do Brasil surpreendendo positivamente nos últimos meses – o que eleva a demanda por combustíveis. “As vendas de gasolina estão bastante altas. Em relação ao ano passado no acumulado do ano, o crescimento é de quase 14% em volume. Isso em função da própria situação econômica do país”, diz Marques. 

“O que tem minimizado é que a atividade de refino tem sido bastante elevada. A Petrobras tem batido recordes nas refinarias, com a ambição da companhia em recuperar participação do mercado após o aumento da participação de importadores e refinarias que foram privatizadas”, complementa o especialista. 

… E o que se controla

Outra mudança entre o período da guerra da Ucrânia para o conflito em Gaza é que, no primeiro, houve corte de impostos sobre a gasolina no Brasil. Agora, a perspectiva não é a mesma. 

Em 2022, o governo do então presidente Jair Bolsonaro, buscando frear o aumento da gasolina nas bombas, zerou o PIS/Cofins sobre o combustível. A medida teria duração até o final daquele ano, mas a equipe de transição do governo de Luiz Inácio Lula da Silva conseguiu prorrogar a isenção por mais alguns meses. A gasolina foi reonerada parcialmente em março e totalmente em julho. 

Nesse intervalo, houve mudanças também no ICMS, que passou a ter cobrança fixada em R$ 1,22 por litro, deixando portanto de ter alíquotas proporcionais ao valor e definidas por cada estado, variando entre 17% e 18%.

Vista aérea do Congresso, em Brasília 18/04/2013 REUTERS/Ueslei Marcelino

O valor das alíquotas fixas foi definido em março deste ano pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), mas a lei complementar que mudou a regra foi criada ainda no governo de Jair Bolsonaro, em março de 2022. 

Naquela ocasião, o preço da gasolina nas bombas estava na casa dos R$ 7. Quando a medida entrou em vigor, em maio, o preço por litro já estava em R$ 5,26. Assim, na prática, a mudança na regra do ICMS acabou resultando em gasolina mais cara para o consumidor. 

Isso  porque, considerando o percentual de 18% de ICMS, o valor médio do tributo seria próximo de R$ 0,94 por litro em maio – ou seja, abaixo da nova cobrança fixada em R$ 1,22. Considerando o preço de agora, seria de R$ 1,01, aproximadamente, também abaixo do valor estabelecido. 

Mas as perspectivas para o preço nos próximos meses, considerando o ICMS, são de aumentar ainda mais. Isso porque os secretários de Fazendas dos estados e do Distrito Federal aprovaram no dia 20 de outubro um aumento de 12,5% nas alíquotas. Isso vale a partir de 1º de fevereiro de 2024. O valor vai passar a R$ 1,3721 por litro.

Enquanto isso, no cenário externo, resta acompanhar o que deve acontecer com a cotação do petróleo.

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