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Economia

Quebra do SVB: analistas descartam contágio sistêmico; entenda efeitos

Mercado espera crédito mais caro e política monetária menos agressiva do Fed após falência do banco de startups.

O banco americano Silicon Valley Bank (SVB), conhecido por investir em startups, teve a falência decretada após não conseguir mais saldar dívidas, em meio ao aumento da taxa de juros nos Estados Unidos. Foi a maior crise do sistema financeiro americano desde 2008. Especialistas ouvidos pelo InvestNews não acreditam em um contágio sistêmico, mas alertam para crédito mais caro e esperam uma política menos agressiva do Federal Reserve no aumento dos juros.

Para resguardar a economia nacional e evitar um grande colapso financeiro global, o banco central dos EUA anunciou medidas de controle para a economia – levando a uma forte alta dos títulos públicos globais. O Federal Reserve (Fed) afirmou que os clientes do Silicon Valley Bank poderão ter acesso ao dinheiro de todos os depósitos a partir desta segunda-feira (13) e criaram um novo instrumento para dar aos bancos acesso a fundos emergenciais.

SBV
Sede Silicon Valley Bank na Califórnia, EUA 10/03/2023. REUTERS/Nathan Frandino

O Fed também tornou mais fácil para os bancos tomarem empréstimos em emergências com um novo programa de financiamento a prazo, que oferece empréstimos de um ano aos bancos em condições facilitadas.

O SVB foi o banco que mais cresceu nos últimos anos, em meio a um cenário de juros baixos. Desde 2019, seu balanço patrimonial aumentou quase 250%, com sua base de clientes institucionais que fizeram depósitos que poderiam migrar rapidamente de instituição financeira com o aumento da taxa de juros.

O que provocou a falência do SVB?

O Silicon Valley Bank quebrou na última sexta-feira (10) após uma “corrida ao banco” dos seus clientes para sacar seus investimentos. Somente nesta data, US$ 42 bilhões foram sacados, cerca de 1/3 dos depósitos.

O SVB comprou bilhões de dólares em títulos públicos do governo americano nos últimos anos com o capital de seus clientes, uma operação comum entre bancos. No entanto, o banco aplicou em títulos de longo prazo em busca de uma taxa de retorno um pouco maior quando os juros americanos estavam próximos a zero. Com o cenário de inflação muito alta, o Fed teve que elevar sua taxa de juros (em cerca de 400%), provocando a desvalorização desses títulos.

“Os clientes da SVB, em sua grande maioria, eram startups e companhias de tecnologia, e estas empresas geralmente precisam de muito caixa, ‘cash burn’. Os fundos de Venture Capital começaram a secar, pois empresas ficaram com dificuldade de captar mais investimentos, e então isso as levou a acessar os fundos que estavam depositados na SVB”, afirmou Alex Kim, sócio da A7 Capital.

Com os clientes sacando o dinheiro de suas contas, o banco precisou liquidar os seus próprios ativos e os títulos públicos para poder honrar a demanda de saque. Quando o banco realizou venda desses títulos e sinalizou um prejuízo de quase US$ 2 bilhões, o mercado financeiro ficou em alerta.

“O fundo garantidor de crédito americano garante todos os depósitos até US$ 250 mil, só que 97% de todos os correntistas tinham acima desse valor porque são empresas. Ele não estava sozinho, o próprio Signature Bank foi fechado também ontem pelo FDIC”, afirmou Andrey Nousi, CEO da Nousi Finance.

O CEO da iHUB Investimentos, Paulo Cunha, explica que os bonds (títulos públicos americanos) de longo prazo geralmente têm taxa pré-fixadas. Quando se tem um ciclo de alta dos juros, os bonds valem menos no curto prazo. E caso necessitem vender antes, valerão menos.

“Esse ‘descasamento’ de prazos que ele tem aplicado nos bonds, conforme ele for sofrendo resgate, fez com que o patrimônio do banco não valesse nada, por isso que ele sofreu essa intervenção. Então foi praticamente um descasamento dos prazos e um mal gerenciamento dos riscos por parte dos gestores do banco. Não deveriam ter aplicado em juros tão longos.”

Ilustração com o logo do SVB (Silicon Valley Bank) 10/03/2023 REUTERS/Dado Ruvic

Qual o tamanho do SVB?

O Silicon Valley Bank (SBB) era o 16º maior banco dos Estados Unidos, com patrimônio de US$ 210 bilhões. Não era considerado um banco muito grande, porém era de grande relevância para o setor de tecnologia e um dos principais incentivadores de startups e novas tecnologias no Vale do Silício, na Califórnia.

Além disso, 20% das startups mundiais tinham conta no banco, o que representa cerca de 40 mil startups, isso significa que ele representa uma grande fatia que impacta mas não acaba com o ecossistema financeiro de startups.

Já o Signature Bank, que também quebrou, tinha patrimônio de US$ 110 bilhões.

Quais os efeitos para o mercado?

Embora o SVB represente uma fatia considerável ,os efeitos foram minimizados pelo FDIC (Federal Deposit Insurance Corporation), o “FGC” do mercado americano, para que os credores receberam seus recursos. O regulador está em busca de um comprador para o SVB, para evitar o efeito dominó do sistema financeiro.

“O efeito cascata de problema na alienação dos títulos ainda existe, pois os juros nos Estados Unidos devem permanecer em patamar alto por um período maior, mas a atuação do FED foi rápida nos 2 casos e mitigou o risco de contaminação sistêmica”, disse Kim.

Andrey Nousi disse que o contágio de uma crise financeira entre os bancos ainda “não está estancado”.

Paulo Cunha, CEO da iHUB Investimentos, disse que o principal efeito a temer em relação à quebra da instituição é o início de uma desconfiança no sistema financeiro como um todo, e isso iniciar uma corrida bancária, em relação a crédito.

“Nenhum banco tem o dinheiro todo caso todo mundo corra para sacar, todos os bancos trabalham de forma alavancada. O efeito de curto prazo será algo mais especulativo, alterando o preço dos papéis.”

Nesta segunda-feira (13), as principais criptomoedas se recuperaram após intervenção no SVB.

Como o Brasil pode ser afetado?

Segundo o Bloomberg Línea, existem várias startups brasileiras que ainda possuem aproximadamente US$ 10 milhões expostos ao SVB, ou seja, mais de US$ 50 milhões.

“O nome das startups afetadas no Brasil ainda não é conhecido publicamente, mas indica que a crise no setor bancário dos EUA deve desembarcar no país sul-americano em breve, pode ser que com o passar das semanas sentiremos um impacto maior, mas por enquanto tudo segue normal”, declarou Raphaela Oliveira, head de investimentos da Efund.

Para Andrey Nousi, o Brasil poderia ser afetado pela “histeria” provocada por rumores infundados como de que bancos digitais brasileiras tivessem investimentos no SVB se alastrassem pelo país. Ele também ressaltou que o Federal Reserve tende a baixar a taxa de juros para evitar o colapso financeiro.

“Com a economia em apuros, o capital mundial seca das regiões mais arriscadas e vai para as menos arriscadas. Em um primeiro patamar, a gente pode ver o dólar se desvalorizando por conta da queda das taxas de juros, mas se confirmar uma recessão o dinheiro migra para os EUA e títulos do Tesouro americano. O Brasil tem conseguido sair ileso disso, graças a sua Selic exorbitante, maior juros real do mundo.”

Para o sócio da A7 Capital, inicialmente, as startups brasileiras poderiam ser impactadas, pois muitas delas possuíam valores no banco, e com a quebra, iriam conseguir resgatar apenas US$ 250 mil. “Mas o Fed, no final de semana, assegurou resgate integral dos valores. Então o risco de muitas startups e empresas de tecnologia de sofrerem um problema em seu caixa, foi mitigado.”

Para Alex Kim, no momento, o sistema financeiro não é afetado pela quebra do SVB.

“O mercado aqui tem característica de usar caixa e capital de curto prazo em ativos que não são impactados com flutuação de juros e também não costumam usar títulos estrangeiros para essa parcela do capital por conta, também, do risco cambial. Porém, vale lembrar que empresas brasileiras sofrem dificuldades em tomar crédito”, ressaltou.

Qual a expectativa para o setor bancário?

A analista Raphaela Oliveira diz que esse é um momento de atenção para os bancos de pequeno porte.

“O impacto será sentido principalmente por bancos menores que sofrem mais para a geração de caixa e pagamento das dívidas com o aumento dos juros, devem-se ficar atentos a alavancagem operacional dessas instituições e como o Fed irá se comportar frente aos juros e esses impactos econômicos.”

Em relação às expectativas para o setor bancário, Paulo Cunha afirma que o possível receio em relação ao sistema pode atingir diretamente o preço dos bancos. “Uma perda de rentabilidade também será vista, então eles podem passar a ser menos rentáveis.”

Já Andrey Nousi diz não acreditar em risco de contágio sistêmico como o ocorrido em 2008, porque os bancos são menores. “Bancos maiores estão muito bem capitalizados e sofrem menos impacto. Mas isso não quer dizer que essa crise financeira não traga uma recessão para os Estados Unidos, porque impacta vários outros setores. O crédito fica mais restrito e pequenas empresas terão dificuldade de pegar empréstimo.”

Há risco de uma nova crise financeira mundial?

Em 2008, ocorreu a maior crise do mercado financeiro desde a grande depressão de 1929. Originada nos Estados Unidos, a crise da subprime teve início com o estouro da bolha de hipotecas no mercado financeiro e se alastrou pelo restante do mundo.

O Federal Reserve (Fed), banco central americano, o Tesouro Norte Americano e FDIC (Federal Deposit Insurance Corporation), na tentativa de mitigar os efeitos da quebra do SVB e do Signature e proteger a economia americana, decidiram agir rapidamente, desta vez, e informaram que os clientes do SVB poderão ter acesso ao dinheiro dos depósitos a partir do dia 13 de março.

“A rápida intervenção da um alívio no sentido de conter uma eventual contaminação do sistema, o que provavelmente virá junto com uma mudança na politica de juros do Fed. A tendência é que, para suavizar a possibilidade de novos casos, o Fed adote uma postura mais dovish [menos agressiva no aumento de juros] para as próximas reuniões”, afirmou Alex Kim, da A7 Capital.

O analista Paulo Cunha diz que a crise de 2008 gerou um certo aprendizado para a terra do Tio Sam.

“Na época, o governo americano demorou muito em dar assistência para os bancos quando eles começaram a quebrar, deixando que as instituições quebrassem sucessivamente, tornando a crise muito pior do que poderia ter sido. Existia todo um debate me relação ao risco moral. Mas hoje a situação parece ter mudado e governo entendido que nesses casos é necessário uma atuação de resguardo rápida”, declara.

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