A ordem assinada pelo presidente na sexta-feira exige o pagamento de US$ 100 mil por solicitação de H-1B, o que vai comprimir as margens das empresas indianas de terceirização que usam o programa para enviar engenheiros a clientes americanos.
É um golpe para o setor de serviços de TI da Índia, avaliado em US$ 280 bilhões e já afetado pelo crescimento fraco, pela retração nos gastos com tecnologia diante de tensões geopolíticas e pelas tarifas de Trump.
As mudanças ampliam o desgaste na relação Índia-EUA, justamente às vésperas da visita da equipe indiana a Washington para tentar avançar em negociações comerciais. Também reforçam a onda de restrições migratórias no mundo, com impacto direto sobre a nação mais populosa do planeta.
“É uma guerra geopolítica”, disse Chander Prakash Gurnani, ex-CEO da Mahindra, e que hoje comanda uma startup de inteligência artificial. “A mensagem é: estudantes estrangeiros não são bem-vindos, trabalhadores estrangeiros não são bem-vindos, vamos impor as regras que quisermos e sem consistência.”
O visto H-1B é amplamente usado por empresas indianas de TI, gigantes de tecnologia americanas, consultorias e bancos para trazer profissionais qualificados. Todo ano, o programa oferece 65 mil vistos, mais 20 mil para formados em mestrado nos EUA, via sorteio. Em 2025, foram mais de 470 mil inscrições. Uma investigação da Bloomberg mostrou que muitas companhias registram o mesmo funcionário várias vezes para aumentar as chances.
Hoje, o custo do registro para participar do sorteio é de apenas US$ 215, além de outras taxas administrativas. Com a nova regra, os valores explodem. Só a Infosys obteve 2.504 vistos de emprego inicial no ano fiscal de 2024; sob a tarifa de Trump, isso significaria pelo menos US$ 250 milhões em custos.
A oposição indiana culpou Modi por não proteger os interesses nacionais. No sábado, o Ministério das Relações Exteriores disse que governo e setor de tecnologia vão discutir com os EUA um caminho adiante.
Trump argumenta que a medida visa proteger empregos americanos, mas o efeito pode ser o contrário: grandes empresas dos EUA podem acelerar a expansão de centros de desenvolvimento globais na Índia. Microsoft, Google, Goldman Sachs, JPMorgan e Morgan Stanley já operam estruturas desse tipo no país.
“Se não puderem trazer gente para os EUA, vão ampliar suas operações offshore na Índia, mesmo com o custo adicional”, disse Bhaskar Rao, CEO da Digital Sea. Segundo ele, a medida agrada eleitores de Trump, mas levanta dúvidas sobre a reposição de até 85 mil profissionais de nível júnior e médio que dependem do H-1B.
A ordem entrou em vigor neste domingo, já enfrenta questionamentos de legalidade e deve ser contestada nos tribunais. A incerteza levou empresas como Microsoft, Amazon e Alphabet a alertar funcionários contra viagens internacionais.
“O problema dessas decisões é que criam enorme incerteza no ambiente de negócios”, afirmou Arup Raha, economista independente baseado em Cingapura.
As gigantes indianas, como Tata Consultancy Services, Infosys e HCL, reduziram sua dependência do H-1B desde o primeiro mandato de Trump, quando cresceu o trabalho remoto na pandemia. Mesmo assim, o programa segue vital para manter relações com clientes e executar projetos sensíveis em solo americano.
“O movimento quase certamente será questionado na Justiça, e a pressão da indústria de tecnologia para revertê-lo será enorme”, disse Rao. “Com Trump, nada é definitivo.”
Por Sankalp Phartiyal e Anup Ro