Um dos destaques de ESG (acrônimo em inglês para os aspectos ambientais, sociais e de governança) que mais me chamou atenção nessa semana foi a notícia de que o Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas está estudando reconhecer 1038 municípios brasileiros em estado permanente de emergência climática.
O anúncio de que o governo está estudando a edição de um decreto para reconhecer estado de emergência climática nesses municípios veio da ministra Marina Silva em meio a sua visita aos locais atingidos por fortes chuvas em Manaus, capital do Amazonas, que causaram a perda de casas habitadas por mais de 170 famílias.
De acordo com a ministra, o decreto viria pela necessidade do governo de manter uma ação permanente nesses municípios, que segundo mapeamento realizado pelo governo são considerados comprovadamente vulneráveis às ações climáticas.
Em entrevista coletiva, a ministra afirmou que a ciência já permite prever que eventos extremos, seja de seca ou de fortes chuvas, devem continuar e que, em alguns casos, até mesmo a remoção de populações de áreas de risco deverá ser planejada e executada.
Na minha opinião, desde a movimentação do novo governo que tomou posse em janeiro de 2023, será a decisão mais importante do Brasil relacionada ao combate aos efeitos do aumento de temperatura da terra e às emissões de gases nocivos na atmosfera.
Existem outros elementos na mesa que podem pesar a favor do decreto, listo três que considerei mais relevantes:
1 – Acesso aos recursos do fundo da ONU de combate aos danos climáticos
A ministra está certa quando diz que ao decretar estado de emergência terá uma consequência positiva de gerar uma ação permanente do governo brasileiro nesses municípios. Mas há outra peça importante nesse tabuleiro, uma possível ajuda externa com recursos vindos do fundo de investimento global contra danos climáticos assinado pelos países mais ricos na Cop 26, Conferência Climática das Nações Unidas (ONU) realizada no ano passado. Se o Brasil decretar estado de emergência nesses municípios se candidatará de imediato a ser um dos primeiros países beneficiados pelos recursos desse fundo internacional.
2 – Momento certo para decretar emergência climática
O momento é super oportuno para se fazer esse movimento, o motivo é que no último dia 20 de março foi lançado o Relatório Síntese sobre Mudanças Climáticas pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), órgão da ONU que monitora o clima. O relatório traz à tona as perdas e danos que vêm sendo causados pela mudança global do clima e quais tendências devem continuar no futuro. O IPCC alerta que os desastres naturais relacionados ao clima estão atingindo especialmente as pessoas mais vulneráveis e os ecossistemas mais frágeis, como os manguezais, áreas costeiras e semidesérticas. Ou seja, esse decreto viria com um argumento forte para que a ONU e o fundo pudessem nos ajudar financeiramente e operacionalmente nos projetos desses municípios.
3 – Liderança climática mundial
Por fim, desde que o presidente Lula foi eleito, um dos movimentos estratégicos mais fortes anunciados pelo novo governo foi o de tornar o Brasil um dos líderes e protagonista no combate aos danos climáticos mundiais. Criar esse decreto vai conseguir tirar do papel projetos que podem ser replicados para outros países com financiamentos robustos para garantir uma prevenção maior e conseguir evitar danos maiores de desastres naturais causados pelas mudanças no clima em nosso planeta e nos trazer naturalmente essa liderança.
Vamos aguardar para ver, mas o debate já está valendo e acredito que os argumentos na mesa prevalecerão para a decisão de se publicar ou não o decreto.
Alexandre Furtado é Presidente do Comitê de Informações ESG da Fundação Getúlio Vargas, Sócio e Diretor de ESG da Grant Thornton.
As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação.
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