José tem imóveis, fazendas e é sócio de algumas empresas. Para evitar qualquer conflito futuro entre seus herdeiros, ele foi orientado a criar duas holdings. Uma patrimonial, para administrar seus imóveis, e outra de participações, para agregar ações e cotas das sociedades.
Reunir todos os bens nesses dois guarda-chuvas facilitou a divisão do patrimônio entre seus quatro filhos, que não vão precisar se preocupar com inventário no futuro.
Não só. O custo tributário da família ficou menor. Enquanto uma pessoa física paga até 27,5% sobre a receita obtida com aluguéis, na holding a alíquota não ultrapassa os 7% do valor obtido com locação ou do lucro da venda de um imóvel, já que os impostos para a pessoa jurídica são mais camaradas.
José também foi cauteloso. Pediu aos advogados que mantivessem seu direito de usufruto. Mesmo depois de dividir os bens entre seus filhos, ele vai continuar tomando as decisões e recebendo os lucros que seus negócios geram.
José é um nome fictício, mas esta história é real – e tem se tornado comum nos escritórios de advocacia brasileiros. Muita gente tem buscado apoio jurídico para colocar o plano de sucessão patrimonial em prática. Não apenas por planejamento, mas porque algumas mudanças vão afetar o bolso dos herdeiros.
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Por conta da reforma tributária, o ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação), que incide sobre heranças e doações, se tornará progressivo a partir de 2025 – variando entre 2% e 8%, de acordo com o volume financeiro do espólio (confira tabela abaixo).
Os estados de São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Alagoas, Amapá, Amazonas e Roraima, que têm alíquota fixa para heranças, terão de aprovar novas regras para se adaptar à novidade.
Veja um exemplo de como a conta pode ficar mais cara. Em São Paulo, hoje, o tributo é de 4%. Quem herda um imóvel de R$ 3,5 milhões, por exemplo, paga hoje R$ 140 mil em impostos. Com a nova alíquota, a quantia subirá para R$ 210 mil.
Valor do patrimônio | Alíquota |
Até R$ 353.600 | 2% |
De R$ 353.600 até R$ 3.005.600 | 4% |
De R$ 3.005.600 a R$ 9.900.800 | 6% |
Acima de R$ 9.900.800 | 8% |
Mas organizar a sucessão não traz só benefício financeiro. “Facilita a transferência de poder. Muitas vezes, evita briga entre os herdeiros, já que tudo é feito de forma consensual com o dono do patrimônio em vida”, explica Nathalia Fernandes, especialista em direito societário do Urbano Vitalino Advogados.
Caminho das pedras
Nessa corrida pela sucessão planejada, a holding é um instrumento bastante usado, porque pode aliviar o bolso e tornar mais fácil a transição de patrimônio.
Ela funciona como uma empresa e centraliza em um único guarda-chuva os bens de uma mesma família – sejam eles imóveis ou negócios – repartidos entre os herdeiros.
“É muito mais prático dividir cotas de uma sociedade do que vários imóveis, por exemplo”.
Rafael Stuppiello, advogado da área de planejamento patrimonial e sucessório do Machado Meyer Advogados.
Mas assim como qualquer negócio, há custos envolvidos, que vão do registro em cartório aos honorários de advogados.
Leandro Nagliate, advogado especialista em direito tributário, calcula: para um patrimônio de R$ 5 milhões, por exemplo, os custos podem chegar a R$ 100 mil.
Se houver a transferência de imóveis para a estrutura de uma holding, o ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis), que varia de acordo com o município, também entra na conta. Mas há exceções. “Se a natureza dela não for a atividade de compra e bem de imóveis ou renda, não incide o ITBI, porque a operação só integralizará os imóveis. O imposto só vai incidir se a atividade preponderante da holding forem imóveis”, destaca Eduardo Silvano, advogado do BMDP advogados.
A holding, de qualquer forma, só é vantajosa quando os bens têm a finalidade de obter renda. Se os imóveis são usados como moradia pela família, o instrumento perde atratividade.
“Tem que ter uma atividade de compra e venda intensa que compense a abertura. A holding não deixa de ser uma empresa. Ela vai ter custos e uma complexidade que só vão se justificar diante de certo volume de patrimônio que faça sentido versus o benefício fiscal”, explica Rafael Stuppiello, do Machado Meyer.
Sobre o usufruto: Nathalia Fernandes, da Urbano, alerta que essa não é uma condição automática “Requer uma declaração de vontade, uma alteração de contrato social da holding”.
E não existe usufruto grátis. A legislação tributária determina o pagamento de um terço do valor do ITCMD. A quantia restante é paga após o falecimento do doador.
Vale o escrito
Quando a sucessão envolve mais de uma geração no comando de uma empresa, a holding também se torna um instrumento relevante. Stuppiello cita como exemplo uma família de dois irmãos, que já tenham filhos.
“É possível ter uma holding representando cada um deles e seus filhos. Quando vierem os netos, o número de pessoas vai aumentar. Para não diluir a participação societária, cada ramo da família já vai ter a sua holding”.
Nesse processo de sucessão também é fundamental estabelecer uma governança para as holdings, deixando claro o papel de cada sócio e as remunerações, por exemplo.
Vale lembrar que tudo precisa estar documentado no contrato ou ata da holding. Quando as regras estão no papel, os conflitos passam longe (ou pelo menos deveriam).
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