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Finanças

Gringos sacam R$ 7 bi em ações e puxam queda do Ibovespa, enquanto CDS sobe

Especialistas apontam piora na percepção de risco para o mercado brasileiro, com exterior e ruídos políticos.

Com um forte movimento de saída dos estrangeiros, o mercado brasileiro tem sentido na pele o mau agouro que dá fama ao mês. Com o Ibovespa ainda sem saber o que é fechar uma sessão em alta em agosto, o índice acumula a mais longa sequência negativa deste século. Enquanto isso, em mais um mau sinal sobre a percepção de risco para os ativos locais, o CDS (Credit Default Swap), título que funciona como uma espécie de seguro para operações de crédito no país e mensura o risco-Brasil, tem subido – e o avanço ganhou força nos últimos dias. 

Especialistas citam o cenário externo como um dos fatores que vem prejudicando a percepção de risco para os mercados emergentes, especialmente em meio à perda de ímpeto da economia chinesa. Mas, internamente, ruídos políticos vêm elevando as preocupações sobre o cenário fiscal, com dúvidas inclusive sobre cronograma do arcabouço fiscal.

Nesse cenário, até esta terça-feira (15), são 11 quedas seguidas do Ibovespa, igualando a série negativa alcançada pela última vez há quase 40 anos. Em meio a essa sequência, que chama a atenção é que boa parte desse movimento é conduzida pelas vendas dos investidores estrangeiros na renda variável nacional. 

Dados parciais da B3 do mês até a última sexta-feira (11) mostram que os gringos sacaram R$ 7 bilhões em recursos externos em ações já listadas (mercado secundário). O período mais atualizado sobre as retiradas de capital externo na B3 coincide com a maior sequência de dias negativos do Ibovespa desde 1998, quando esteve sob o impacto da crise na Rússia, com o índice à vista enfileirando nove quedas consecutivas em ambos. 

Para se ter uma ideia, o montante parcial deste mês supera em quase R$ 3 bilhões as saídas registradas ao longo de maio. À época, o fluxo de capital estrangeiro ficou negativo em R$ 4,1 bilhões, no terceiro déficit mensal do ano até então. 

Prédio da B3 em São Paulo 06/07/2023 REUTERS/Amanda Perobelli

Porém, o forte ingresso de recursos externos em janeiro (R$ 12,5 bilhões), junho (R$ 13,5 bilhões) e julho (R$ 8,9 bilhões) – além da entrada de R$ 3,2 bilhões em abril – ainda sustenta um superávit dessa conta no ano, em quase R$ 25 bilhões até meados deste mês (exceto IPO/follow on). 

Mas, voltando as atenções para o movimento mais recente, se no mercado de ações a direção apontada pelos estrangeiros tem sido de saída, o CDS também indica uma piora na percepção de risco. Até esta terça-feira (15), o contrato com vencimento em 10 anos acumulava alta mensal de mais de 11%. Em 2023 até agora, no entanto, ainda há queda de mais de 17%.

Os números não mentem

Ainda que se saiba que a perspectiva de queda dos juros básicos seja favorável à tomada de risco, em especial nas ações, o fluxo diário de investidores estrangeiros na bolsa brasileira no mês em que o Comitê de Política Monetária (Copom) promoveu o primeiro corte na taxa Selic em três anos vai contra essa premissa.

Prevalece, então, uma velha máxima no mercado financeiro, que diz que “contra fluxo não há argumentos”. Além disso, o rendimento oferecido pela renda fixa continua atraente para os investidores locais (institucional e individual). “O mercado de ações local está perdendo força”, avalia um diretor da tesouraria de um banco estrangeiro.

Ainda segundo a B3, bancos e grandes fundos de investimentos já retiraram mais de R$ 30 bilhões da renda variável neste ano, sendo R$ 3,3 bilhões só no dado parcial de agosto. Já os residentes individuais ingressaram com R$ 2,6 bilhões apenas neste mês, elevando o superávit de 2023 para R$ 4,9 bilhões.

“Brasileiro é rentista, só sai dos juros estiverem bem baixos”, comenta um operador sênior de renda variável de uma corretora nacional. “Com esse juro hoje [13,25%], vai correr risco [na bolsa] para quê?”, indaga. Com isso, os gringos que fizeram a bolsa subir quando entraram, levando o Ibovespa a superar a máxima de 2022, são quem fazem o índice à vista cair agora.

Para completar a “tempestade perfeita”, a piora dos ativos de risco não é uma exclusividade tupiniquim. Também há uma clara deterioração da posição técnica nos mercados globais, com os investidores corrigindo os preços, em especial das bolsas. “Isso significa que o mercado doméstico ainda está frágil e sujeito a correções adicionais”, conclui um operador sênior de renda variável de uma corretora nacional.

Percepção de risco sobre o Brasil: por que a piora?

Especialistas ouvidos pelo InvestNews comentam que o cenário fiscal ajuda a explicar o movimento recente do CDS, assim como a sequência de quedas do Ibovespa e a alta do dólar sobre o real, que voltou a ser cotado acima da casa dos R$ 4,90 nos últimos dias. 

Embora os avanços do arcabouço e da reforma tributária tenham ajudado a melhorar a percepção de risco anteriormente, agora, são justamente as incertezas envolvendo o avanço da agenda econômica no Legislativo que estão no radar do mercado. 

Haddad e Lira se cumprimentam no Palácio do Planalto 18/04/2023 REUTERS/Ueslei Marcelino

Leandro Petrokas, diretor de research e sócio da Quantzed, atribui o movimento do CDS à percepção de risco dos estrangeiros sobre o Brasil com “ruído político, principalmente com atrito entre Executivo e Câmara“. 

Declarações do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao jornalista Reinaldo Azevedo nesta segunda-feira (14) repercutiram mal no meio político, alcançando também o mercado. 

Após dizer em entrevista que a Câmara está “com poder muito grande”, Haddad disse a jornalistas que ligou para o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para esclarecer as falas. “Minhas declarações não são uma crítica à atual Legislatura”, afirmou.

Lira, por sua vez, escreveu sobre o tema em seu perfil no X, antigo Twitter. “É equivocado pressupor que a formação de consensos em temáticas sensíveis revela a concentração de poder na figura de quem quer que seja.”

Esplanada dos Ministérios com o Congresso Nacional ao fundo, em Brasília 07/04/2010 REUTERS/Ricardo Moraes

Na reação do mercado, o ponto chave foi que os ruídos tiveram impacto sobre o cronograma das discussões sobre o arcabouço: o relator, deputado Claudio Cajado (PP-BA), afirmou nesta terça que a reunião com líderes e Lira para debater as alterações promovidas pelo Senado foi remarcada para a próxima segunda-feira (21). Anteriormente previsto para a noite da segunda-feira (14), o encontro havia sido cancelado após as declarações de Haddad.

Depois dos mau-estar, Lira disse que há possibilidade de o arcabouço ser resolvido na próxima semana.

Para Gustavo Cruz, estrategista chefe da RB Investimentos, “a fala do Haddad no podcast do Reinaldo Azevedo gerou um pouco de desgaste” em um momento em que já havia preocupação sobre o arcabouço fiscal.

“A gente sabe que os deputados estão aguardando a reforma ministerial e o Executivo está segurando. Por mais que o arcabouço já tenha sido meio que aprovado na Câmara e no Senado, ainda falta bater o martelo final, e isso aumenta um pouco o risco país.”

Gustavo Cruz, estrategista chefe da RB Investimentos

A informação de que a conclusão da tramitação do arcabouço fiscal depende da reforma ministerial tem sido publicada por veículos de imprensa, mas o governo nega. 

No início do mês, Haddad chegou a dizer a jornalistas após reunião com Lira que o deputado “falou que não tem nada a ver arcabouço fiscal com mexida em ministério”. No dia seguinte, Lira declarou, também a jornalistas, que o prazo para votação do arcabouço é 31 de agosto. 

Cenário externo também pesa

Além dos ruídos políticos, o cenário externo também tem impactado a percepção de risco nos mercados emergentes – o que inclui o Brasil. E, nos últimos dias, o principal fator que tem impulsionado as incertezas é a China. 

Dados desta terça mostraram que o crescimento da produção industrial na China desacelerou de 4,4% em junho para 3,7% em julho na comparação com o ano anterior. Já as vendas no varejo passaram de uma expansão de 3,1% para 2,5%. 

Rua de Pequim 18/04/2023. REUTERS/Tingshu Wang

“A questão chinesa impacta, obviamente, não só o Brasil, mas a sensação é que a gente tem uma economia mais fraca no mundo. Os dados de produção industrial e varejo foram não só abaixo do que era previsto pelo mercado, mas também abaixo do mês anterior. Então, é uma desaceleração”, diz Cruz. 

“A China, sendo um grande motor da economia mundial, um dos principais países consumidores de diversos produtos e serviços mundo afora, de outros países, tem forte peso”, complementa Leandro Petrokas.

Este conteúdo é de cunho jornalístico e informativo e não deve ser considerado como oferta, recomendação ou orientação de compra ou venda de ativos.

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