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IPOs de empresas brasileiras nos EUA batem recorde em 2021; veja 5 motivos

No ano, 4 companhias já abriram capital no exterior; especialistas explicam o que está impulsionando o movimento.

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Recentemente, o Banco Inter (BIDI11) aprovou seu plano de reorganização societária que prevê a listagem de ações na Nasdaq e o fim da negociação de suas units e ações na B3. O banco justificou o fortalecimento da marca como empresa global de tecnologia no setor financeiro, além do aumento de sua base de investidores. E não é só o Inter que vê essas vantagens. O número de companhias brasileiras optando por fazer seu IPO em Nova York já é recorde em 2021. Mas o que vem motivando este movimento?

Segundo a Economatica, provedora de dados financeiros, até 13 de outubro de 2021, 11 empresas brasileiras já tinham aberto capital no exterior, sendo quatro delas só este ano, com destaque para as companhias do setor de tecnologia.

O analista Fernando Martin, da Levante Ideias de Investimentos, avalia que esta é uma tendência que pode ganhar força, em especial com as empresas ligadas ao setor de tecnologia.

“A digitalização da economia e a transformação digital são algo real. É uma grande tendência em diferentes setores. Vejo uma curva ascendente para estes negócios digitais e a abertura de capital das empresas deste segmento lá fora tende a ganhar força”, avalia.

Para Martin, o número de IPOs no exterior só não está mais forte porque as empresas de tecnologia listadas recentemente no Brasil ainda não teriam força para alcançar a Nasdaq. “São empresas com capitalização de mercado de R$ 5 bilhões, o que é muito pouco para conseguir chegar à Nasdaq. Precisam de maturidade. Faltam boas candidatas para alcançar a bolsa norte-americana, com capitalização maior, operação e governança redondas”, defende o analista.

Flávio de Oliveira, sócio-fundador da Zahl Investimentos, também enxerga esse movimento como tendência, junto de uma influência indireta da pandemia.

“A pandemia acelerou muito as empresas de tecnologia. As companhias de e-commerce ganharam grande visibilidade. E quando tem esse movimento, automaticamente, tem as empresas querendo crescer. E, como elas querem crescer e estão mais capitalizadas, demandam serviços. Então, cria-se uma cadeia de empresas e, com o objetivo de crescimento, pode abrir o capital lá fora. A pandemia abriu certas janelas que essas empresas podem entrar”, afirma Oliveira.

Motivos para o IPO no exterior

Diversos são os fatores que têm estimulado empresas brasileiras a abrirem seu capital no exterior. Segundo os especialistas ouvidos pelo InvestNews, os principais são:

Regulamentação

No Brasil, desde o ano 2000, existe o Novo Mercado, um segmento destinado à negociação de ações de empresas que adotam, de forma voluntária, práticas de governança corporativa adicionais às que são exigidas pela legislação brasileira. As empresas listadas neste segmento podem emitir apenas ações com direito de voto, as chamadas ações ordinárias (ON).

Martin explica que essas ações no Brasil têm a proporcionalidade de número de papéis e de votos e que todos os IPOs no país agora estão dentro deste Novo Mercado. Ou seja, se o investidor tem 100 ações, terá direito a 100 votos, o que não acontece no exterior, segundo o analista, pois nos Estados Unidos, por exemplo, existe a possibilidade de ter ações com pesos de votos diferentes.

“O controlador pode ter menos de 50%, mas continua tendo controle, pois ele pode ter ações com mais votos, são as golden share. Esse é um dos pontos que tem sido motivo para empresas abrirem capital lá fora”, afirma Martin.

Possibilidade de maior visibilidade

Segundo Martin, listada no exterior, a empresa pode ter uma avaliação melhor e conseguir alcançar múltiplos de negociação maiores devido à possibilidade de maior notoriedade da companhia.

“Normalmente, as empresas conseguem uma avaliação diferenciada em relação ao que conseguiriam no Brasil. De certa forma, isso enriquece o controlador, acionista e faz com que seu patrimônio seja melhor avaliado, apreciado”, diz o analista da Levante Ideias de Investimentos.

Ele cita o exemplo da XP e do Banco BTG Pactual (BPAC11). Martin explica que são empresas que atuam no mesmo setor, mas possuem múltiplos diferentes, pois, normalmente, a empresa listada no exterior consegue alcançar, por questão de “vitrine”, uma avaliação melhor.

Mercado com maior expertise

Martin considera que no exterior, em especial nos Estados Unidos, o mercado financeiro tem mais apetite e expertise para avaliar empresa de tecnologia.

“Tem um conjunto de métricas, conhecimento e analistas capazes de entender  melhor esses casos. Exemplo a PagSeguro e Stone. São empresas que o mercado brasileiro como um todo tem uma dificuldade de compreender, por serem consideradas caras, que o valuation não faz sentido. E lá fora elas já são melhores compreendidas. Isso também favorece a listagens dessas empresas techs/growth/digital no exterior”, aponta o analista.

Múltiplos mais altos

Oliveira diz que, no exterior, os múltiplos são mais altos. Segundo ele, os Estados Unidos, por exemplo, tem bolsa de valores muito mais desenvolvidas, com uma presença menor de juros e, consequentemente, mais liquidez.

“Em teoria, o dinheiro que está lá tem mais dificuldade de escoar diretamente para cá. Faz mais sentido abrir o capital no exterior porque o múltiplo sai mais alto”, aponta o  sócio-fundador da Zahl Investimentos.

Maior volume de negociação e mercado maduro

Os Estados Unidos, por exemplo, possui um número de investidores maior do que na B3. Por lá, mais de 50% da população investe na bolsa de valores. Já no Brasil, cerca de 1,5%.

“O exterior tem muita disponibilidade de dinheiro.  Os Estados Unidos são um país com uma população infinitamente mais rica, com maior número de investidores e em um mercado de capitais muito mais pujante e participativo do que aqui”, considera Oliveira.

Riscos e desafios

Apesar de terem pontos positivos que estimulem a abertura de capital no exterior, os especialistas ouvidos pelo InvestNews apontam a necessidade de atenção com as condições de mercado no exterior.

“A Nasdaq  tem sido muito aberta e receptiva paras as empresas de tecnologia, de crescimento, mas não sabemos se vai perdurar. Teoricamente, estas empresas não deveriam ser afetadas pela percepção de risco Nasdaq, pois elas têm resultados em reais. Mas, na prática, podem ser influenciadas. Nasdaq sendo afetada, pode ter um efeito nas companhias de tecnologia brasileiras também”, avalia Fernando Martin.

Já Oliveira aponta que a questão de legislação pode ser um ponto de atenção para as companhias que desejam abrir seu capital no exterior. “Acredito que a SEC (órgão regulador de valores mobiliários dos Estados Unidos) é muito mais severa que a CVM (Comissão de Valores Mobiliários). Pode se tornar mais caro fazer as adequações a ela, podendo, assim, a empresa correr mais risco. Isso é algo com que a companhia teria que conviver”, diz.

O sócio da Zahl Investimentos destaca também a importância do valor da empresa ser um desafio para estar listada lá fora. “Aqui, a companhia pode ser dominante. Nos Estados Unidos, por exemplo, pode ser uma small cap”, alerta.

Investidor deve mirar estas companhias?

Marin explica que o conselho é o de sempre: ver fundamentos, estudar a empresa, tentar observar quais são os drivers de valor e se faz sentido ter estas ações na carteira,  que costumam carregar um pouco mais de risco, o que pode ser entendido pelo lado bom e ruim.

Além disso, ele lembra ainda que as empresas que estão listadas no exterior, se não tem BDRs disponíveis no Brasil, o investidor terá que ter uma conta em corretora estrangeira para ter acesso aos papeis, tendo que ficar atento a possíveis custos e burocracias.

 Já Oliveira considera que, independentemente de a empresa estar listada no Brasil ou no exterior, o importante é o investidor ter investimento em moeda forte e diversificar geograficamente os investimentos.

“O investidor tem que comprar os fundamentos da empresa. Ver se ela é boa, se tem expectativa de crescimento e diversificar geograficamente pelo mercado em que elas atuam. É importante diversificar e dar atenção para bons ativos, mas não só olhar para a empresa por ela ser brasileira. Isso é secundário”, conclui.

Brasileiras que já fizeram IPO no exterior

Confira as empresas brasileiras que abriram capital fora do país e o desempenho de suas respectivas ações desde o IPO até 13 de outubro de 2021:

Empresa Data do IPO Valor de mercado (US$)
Zenvia (ZENV) 21/07/2021
Vtex (VETX) 20/07/2021
Vinci Partners (VINP) 27/01/2021
Patria Investments (PAX) 21/01/2021 2,797 bilhões
Vitru (VTRU) 17/09/2020
Vasta Platform (VSTA) 30/07/2020 356,950 milhões
XP Inc (XP; XPBR31) 10/12/2019 19,567 bilhões
Afya (AFYA) 18/07/2019 1,834 bilhão
Stone Co. (STOC31) 24/10/2018 9,894 bilhões
Arco Platform (ARCE) 25/09/2018 1,097 bilhão
PagSeguro (PAGS; PAGS34) 23/01/2018 11,456 bilhões

Fonte: Economatica, em 13/10/2021

Zenvia (ZENV)

As ações da startup gaúcha brasileira começaram a ser negociadas em julho deste ano na Nasdaq, em Nova York.

Na oferta pública inicial, os papéis da companhia foram precificados a US$ 13 e a Zenvia levantou US$ 150 milhões.

A empresa é especializada em serviços de comunicação entre clientes e empresas e oferece produtos como rastreamento de pedidos, chatbot e desenvolvimento de processos de vendas, por exemplo.

Desde de seu IPO até o dia 13 de outubro de 2021, as ações da companhia tinham ganhos de 5,77%.

Vtex (VETX)

A companhia captou US$ 361 milhões na sua oferta pública inicial de ações nos Estados Unidos em junho de 2021.

Alguns dos seus investidores venderam 19 milhões de ações a US$ 19 cada uma, ficando acima da faixa de US$ 15 a US$ 17 do prospecto para a oferta.

A empresa é uma plataforma de e-commerce software as a service, ou seja, ela elabora a estrutura para que lojistas possam cadastrar seus produtos, fazer a integração de meios de pagamento, cálculo de frete etc, permitindo que que companhias consigam fazer as venda de seus produtos  de forma online.

Desde o seu IPO até 13 de outubro de 2021, as ações acumulavam desvalorização de 3,63%.

Vinci Partners (VINP)

A companhia brasileira de gestão de recursos de terceiros levantou ao menos US$ 250 milhões na sua oferta pública inicial de ações na Nasdaq, nos Estados Unidos, em janeiro de 2021. O preço por ação foi fixado em US$ 18.

A empresa informou que intenção com o recurso é financiar investimentos em seus produtos, aquisições estratégicas e para fins corporativos.

Desde o seu IPO até 13 de outubro de 2021, os papéis da Vinci acumulavam uma desvalorização de 21,67%.

Patria Investments (PAX)

A gestora de ativos alternativos levantou R$ 512 milhões no seu IPO, com cada ação saindo a US$ 17, acima da faixa indicativa, que foi fixada entre US$ 14 e US$ 16.

A intenção da Patria Investiments com os recursos é fazer investimento em suas operações por meio da compra de gestores de ativos, carteiras, além de canais de distribuição. O objetivo também é financiar compromissos de capital de fundos novos e existentes.

Desde de sua abertura de capital, em janeiro de 2021, as ações da gestora estavam com valorização de 2,5% até o último dia 13 de outubro.

Vitru (VTRU)

A companhia de ensino a distância de Santa Catarina estreou na Nasdaq em setembro de 2020. A empresa, que controla a Uniasselvi, precificou suas ações a US$ 16 por papel, ficando abaixo da sua faixa indicativa de US$ 22 a US$ 24, e levantou  US$ 96 milhões.

Na época, a empresa informou que o objetivo com o recurso era a expansão dos negócios, inclusive por meio de aquisições.

Desde sua estreia na Nasdaq, os papéis da companhia acumulavam queda de 3,06% até 13 de outubro de 2021.

Vasta Platform (VSTA)

A  subsidiária de educação básica da Cogna (COGN3), levantou US$ 405,87 milhões em seu IPO em julho de 2020. Cada ação saiu a US$ 19, ficando acima da faixa indicativa que era de US$ 15,50 a US$ 17,50. 

Na época, segundo a empresa, o objetivo com os recursos era usar metade para o pagamento de parte da dívida devida à controladora Cogna e a outra metade para financiar sua a expansão por meio de aquisições ou investimentos em negócios complementares.

Desde sua estreia em bolsa dos Estados Unidos até 13 de outubro de 2021, as ações da Vasta acumulavam queda de 77,37%.

XP Inc. (XPBR31)

A corretora levantou US$ 2,3 bilhões em seu IPO na bolsa norte-americana Nasdaq, com ação precificada em US$ 27, acima da faixa  indicativa que estabelecia o valor de cada papel entre US$ 22 e US$ 25.

Desde a sua abertura de capital no exterior, as ações acumulavam valorização de 29,63% até 13 de outubro de 2021.

Afya (AFYA)

O grupo brasileiro de educação, que é especializado em cursos de medicina, abriu seu capital na Nasdaq em 2019, levantando US$ 300 milhões, a US$ 19 por papel. A faixa estimada estava entre US$ 16 e US$ 18 por ação.

A Afya surgiu da união da NRE Educacional, maior grupo de faculdade de medicina do Brasil, e da Medcel, de cursos digitais preparatórios para provas de residência médica. 

Do seu IPO até 13 de outubro de 2021, as ações da companhia valorizavam 3,63%.

Stone (STOC31)

A empresa de meios de pagamento criada em 2012 levantou US$ 1,5 bilhão no seu IPO na Nasdaq. A companhia vendeu suas ações a US$ 24, ante uma faixa de preço entre US$ 21 e US$ 23.

Desde 2018, ano da sua abertura de capital, até 13 de outubro de 2021, os papéis acumulavam valorização de 33,54%.

Arco Platform (ARCE)

A empresa do setor de educação captou US$ 194,5 milhões na sua oferta inicial de ações na bolsa de valores norte-americana Nasdaq.

A Arco Educação cearense é focada em soluções educacionais, oferecendo conteúdo, tecnologia e serviços para escolas da educação infantil ao ensino médio.

Da chegada na bolsa norte-americana até 13 de outubro de 2021, as ações acumulavam valorização de  8,91%.

PagSeguro (PAGS34)

A empresa de meios de pagamentos e maquininhas de cartão controlada pelo grupo UOL abriu o capital na bolsa de Nova York (Nyse) em janeiro de 2018 e levantou cerca de US$ 2,27 bilhões.

A companhia vendeu ações a US$ 21,50 cada, valor que superou a faixa indicativa de preço de US$ 17,50 a US$ 20,50.

Do IPO até 13 de outubro de 2021, os papéis da empresa acumulavam ganhos de 61,95%.

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