Finanças
No acumulado do ano até agora, Ibovespa tem 2º pior retorno em ranking de índices de 28 países
Apesar disso, especialistas mantêm previsões positivas para a bolsa brasileira em 2024.
Após a disparada de 22% em 2023, o Ibovespa, principal indicador da B3, vem se destacando no começo de 2024 como um dos piores desempenhos entre seus pares pelo mundo, em um movimento puxado pela saída de dinheiro estrangeiro do mercado brasileiro. Mesmo assim, especialistas ainda projetam um cenário positivo nos próximos meses, com expectativa de aquecimento da economia do Brasil e queda nos juros dos Estados Unidos – embora as incertezas fiscais e outros riscos continuem no radar.
Até o fechamento desta quarta-feira (21), o Ibovespa acumulava queda de 3,1% em 2024, o segundo pior desempenho em uma lista com os principais índices de 28 países, com dados compilados pelo Investing.com. O retorno do indicador brasileiro ficou levemente à frente somente do recuo de 3,19% do principal índice de Hong Kong. Veja abaixo:
Paralelamente à queda do Ibovespa neste início de ano, a B3 registrou a primeira retirada de recursos estrangeiros da bolsa brasileira desde 2016 no período. No acumulado de 2024 até o dia 15 de fevereiro, o saldo ficou negativo em mais de R$ 14 bilhões, quebrando uma sequência de quatro anos de entrada líquida de recursos, conforme dados destacados pelo especialista Einar Rivero, CEO da Elos Ayta.
Especialistas apontam diversos fatores para a debandada de dinheiro gringo, e o primeiro deles é técnico. “Tanto novembro quanto dezembro foram meses de alta forte, foi o famoso rali de final de ano, e agora tem um pouco de realização de lucro. São investidores estrangeiros colocando esse lucro no bolso agora”, aponta Marcelo Boragini, sócio e especialista em renda variável da Davos Investimentos.
O reflexo do desempenho da bolsa em 2023 nas primeiras semanas de 2024 também é citado por Thomas Monteiro, estrategista-chefe do Investing.com. “Devemos levar em consideração que o efeito de base é bastante alto para o Ibovespa após o índice ganhar cerca de 22% no ano passado”.
“Ou seja, de maneira geral, podemos dizer que a bolsa está passando por uma fase considerada mais de consolidação dos ganhos do que de sub-performance.”
Thomas Monteiro, estrategista-chefe do Investing.com
Mas nem tudo pode ser jogado na conta da máxima de que “está caindo porque antes subiu”. Túlio Menezes, Gestor de Recursos CGA do Grupo Fractal, afirma que, “além desse movimento técnico, outro fator que contribuiu para a recente queda em 2024 foram os dados econômicos mistos dos Estados Unidos”.
Sobre esse ponto, Boragini lembra que “o mercado estava muito otimista com relação ao início do ciclo de queda de juros americanos, com a corrente otimista trabalhando com uma queda já agora em março”. Mas, diante dos últimos indicadores, no entanto, “o mercado já começa a ajustar projeções do início do ciclo para o meio de ano, em junho ou julho”.
A expectativa mudou. O resultado? “Iinvestidores estrangeiros podem optar por retirar capital do Brasil, buscando mercados considerados mais seguros ou com melhor potencial de retorno”, responde André Vasconcellos, vice-presidente do conselho Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (IBRI). Isso significa “uma pressão de venda nas ações listadas na bolsa brasileira”.
Fatores internos
Para além do efeito base e dos sinais sobre os juros nos Estados Unidos, especialistas também apontam que o cenário doméstico também pendeu mais para o lado negativo neste início de 2024.
“A gente teve em janeiro e começo de fevereiro maior incerteza fiscal, incerteza se a gente vai ter um ano marcado por Congresso travado, sem votar outras pautas importantes para o governo”, comenta Leonardo Cappa, economista-chefe da TRAAD, emendando que “já estamos no final de fevereiro e há cerca de 20 MPs paradas para o Congresso analisar”.
“Vai se aproximando do momento em que elas travam a agenda de votações do Congresso, e algumas são muito importantes, como a prorrogação do Desenrola, que é uma das medidas para ajudar a aumentar o crédito no Brasil. Mas a principal é a reoneração da folha de pagamentos.”
Cappa acrescenta que também pesa na balança a queda de ações que têm forte participação na composição do Ibovespa. Uma delas é a do Bradesco (BBDC4), que decepcionou o mercado na divulgação do último balanço e acumula queda de mais de 18% no ano até agora.
Outro exemplo é a Vale (VALE3), que tem recuo acima de 13%, com o mercado acompanhando a cotação do minério de ferro no exterior e os rumores sobre uma eventual troca no comando da empresa.
Mas otimismo permanece
Apesar do destaque negativo entre os pares mundiais, o Ibovespa ainda tem boas perspectivas para os próximos meses, segundo os especialistas ouvidos pelo InvestNews.
Um dos principais motivos citados é a queda dos juros nos EUA, que, mais cedo ou mais tarde, em algum momento de 2024 deve ser iniciada. “E quando isso de fato acontecer o dinheiro estrangeiro volta, o fluxo estrangeiro volta para o Brasil”, diz Marcelo Boragini.
Além disso, as perspectivas para a economia do Brasil seguem favoráveis, o que sustenta as previsões de continuidade da queda da Selic. “Apesar dos últimos três anos terem sido marcados por momentos conturbados globalmente, com impactos significativos nos indicadores de inflação de diversos países, o Brasil tem se destacado positivamente em termos de política monetária”, complementa Túlio Menezes.
Também comentando sinais considerados positivos da atividade econômica, Leonardo Cappa aponta a queda do desemprego e melhora da renda das famílias.
“Quanto mais a agenda macro for melhorando e os resultados das empresas forem mostrando essa melhora do ambiente, do emprego, da queda da Selic, mais a nossa bolsa deverá subir.”
Leonardo Cappa, economista-chefe da TRAAD
Há ainda outro fator por trás do otimismo dos especialistas sobre a bolsa brasileira. “O mercado brasileiro continua barato em comparação com outros mercados de potencial semelhante”, diz Thomas Monteiro.
Túlio Menezes calcula que, “atualmente, o Ibovespa opera com um múltiplo P/L (preço/lucro por ação) de 7,80 vezes, abaixo da média de 15 anos do índice, que é de 11 vezes”. “Isso indica que os ativos locais estão descontados em relação à média histórica”, explica.
Previsões x riscos
Apesar de esperarem um novo ano de ganhos, especialistas não vislumbram um avanço tão intenso como o de 2023. “Eu estimaria acima do CDI para o ano”, diz Cappa. Mas o economista ressalta: “eu duvido um pouco daquelas expectativas muito otimistas falando de Ibovespa a 160 mil pontos”.
“Claro que não é impossível, mas eu acho mais difícil, porque o crescimento também deve ser limitado, a Selic provavelmente não vai cair tanto quanto alguns gestores acham. Muitos gestores estão falando em Selic a 8% neste ano. Eu acho bem mais difícil. Deve ficar entre 9 e 9,5%”, afirma ele.
No entanto, o avanço projetado para a bolsa depende de alguns fatores ainda rodeados de incertezas, como aponta Túlio Menezes. “Na média, as instituições estimam que o índice Ibovespa chegue a 144 mil pontos, o que vai ao encontro das perspectivas positivas mencionadas”.
“No entanto, além dessa visão otimista com possíveis quedas de juros e as empresas operando de forma saudável, o lado fiscal também é crucial. Caso não seja corrigido, pode contribuir negativamente para os indicadores macroeconômicos e, consequentemente, afetar os ativos locais.”
Túlio Menezes, Gestor de Recursos CGA do Grupo Fractal
Thomas Monteiro acrescenta que “a expectativa de um real relativamente valorizado em relação ao dólar é um outro fator a ser levado em consideração, uma vez que espanta o investidor estrangeiro que precisa de vantagens competitivas mais altas para compensar os riscos.”
Ainda assim, o especialista se mostra otimista. “Nesse sentido, diria que as perspectivas são razoavelmente positivas – o que significa um ganho anual por volta de 10%.”
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