Um retrofit envolve a atualização de sistemas elétricos, hidráulicos, acessibilidade e mecanismos de combate a incêndios. “Não é maquiagem, é uma requalificação técnica e profunda que traz qualidade igual ou superior a de um prédio novo”, diz Pedro Ichimaru, sócio da Somauma, empresa que opera projetos de retrofit no centro paulistano.
Segundo o executivo, além da atualização técnica, a renovação também contempla “adaptar áreas comuns, incluir espaços para entrega de mercadorias, mudar o térreo para loja e fachada ativa — tudo para dialogar com o modo de morar atual”, diz. E resgatar ativos raros desses empreendimentos, como pé-direito alto, janelas amplas e pisos de taco.
Bruno Scacchetti, CEO da Metaforma, enfatiza a amplitude do impacto gerado pelos projetos. “Prefiro falar em renovação porque embarcamos tecnologia e recriamos a engenharia — não apenas no edifício, mas também nas calçadas, na relação com vizinhos e projetos sociais que ativam o bairro. A paisagem urbana vai junto no processo.”
O retrofit ganhou impulso com o Requalifica Centro, lei municipal sancionada em 2021. O programa concede três anos de isenção de IPTU para os imóveis retrofitados, reduz o ISS para 2% nas obras e dispensa o pagamento de outorga onerosa na conversão de uso (de comercial para residencial ou vice-versa) dos prédios antigos.
“O programa dá sustentabilidade jurídica e financeira ao modelo. Além de destravar burocracias, incentiva moradores, investidores e comerciantes a olhar para o centro com mais confiança e interesse”, diz Scacchetti.
Segundo dados da Prefeitura, desde 2021 foram aprovados 21 projetos de retrofit, que disponibilizaram 1.902 unidades habitacionais — a maior parte nos bairros de Sé, República, Santa Ifigênia, Brás e Glicério. Outros 28 projetos aguardam análise.
“Sem o Requalifica, boa parte das iniciativas levaria anos para ser aprovada. Essa lei criou um canal com o mercado, que passou a ter estímulo para recuperar imóveis em áreas com infraestrutura consolidada, como o Centro”, analisa Claudio Bernardes, vice-presidente do Secovi-SP.

E a valorização?
A valorização do retrofit surpreende quem considera apenas o peso da idade do imóvel. O caso do Basílio 177, da Metaforma, ilustra. O projeto é composto por três edifícios históricos — um deles tombado —, com 274 unidades que vão de estúdios a coberturas de 250 m² na região da República.
Hoje só restam 13% dos apartamentos à venda. “Quando viabilizamos o projeto, os valores estavam na casa de R$ 9.200 por metro quadrado; hoje vendemos apartamentos a até R$ 16.000 o metro quadrado, dependendo da unidade”, conta Scacchetti.
O Edifício Virgínia, da Somauma, também obteve valorização superior a 40% entre a obra de requalificação e a entrega, em menos de dois anos. Localizado na esquina das ruas Martins Fontes e Álvaro Carvalho, próximo à Consolação, dispõe de 120 apartamentos, de 25 m² a 180 m², mas só quatro ainda aguardam um dono.
Um detalhe é importante: a valorização depende da localização do empreendimento. “No centro, onde não há terrenos para lançamentos novos, o retrofit é uma alternativa para garantir valor e agregar qualidade. Já em bairros com alto potencial construtivo, pode ser mais rentável investir em novas edificações”, pontua o representante do Secovi-SP.
Sustentabilidade é chamariz
Além do aspecto econômico, o retrofit segue a cartilha da sustentabilidade por uma regra simples: a preservação da estrutura em si, que reduz os impactos ambientais.
No Edifício Virgínia, houve economia superior a 70% no consumo de água e energia em relação a uma obra nova, pois foram aproveitadas a fundação e demais estruturas — “os maiores vilões no consumo de recursos e emissão de resíduos”, diz Ichimaru.
O Retrofit atrai diferentes públicos, como famílias que buscam localizações privilegiadas, jovens interessados em mobilidade, apaixonados por arquitetura e investidores preocupados com a valorização de ativos “raros” e com a diversificação do portfólio.
“Cerca de 65% dos nossos compradores compram para morar, 35% para investir — mas, normalmente, são pessoas com vínculo afetivo com o centro ou desejo de diversificar em uma região em transformação acelerada”, diz Scacchetti. Ichimaru reforça: “Em locais sem terrenos livres, o retrofit muitas vezes é a única forma de morar bem e com características únicas”.
Como não errar?
Escolher um imóvel que passou por retrofit exige atenção equivalente — ou superior — à compra de qualquer apartamento novo. Veja as recomendações dos executivos e do representante do Secovi-SP:
- Entenda o escopo da obra: “O cuidado é saber se houve atualização de elétrica, hidráulica, normas técnicas, acessibilidade, combate a incêndio e outras garantias ou apenas reforma superficial”, diz o representante do Secovi-SP. O chamado retrofit ‘cosmético’ pode esconder problemas futuros.
- Analise a empresa: “É importante avaliar a experiência da empresa, visitar apartamentos decorados, solicitar documentos, conhecer os sócios, consultar registros na prefeitura e em cartórios. As garantias e assistência pós-venda devem ser claras e equivalentes às entregues em imóveis novos”, recomenda Claudio Bernardes.
- Visite o imóvel decorado: “Ao visitar o decorado, fica clara a diferença entre um retrofit legítimo e uma reforma superficial”, acentua Scacchetti.
- Analise os materiais: “Entender o que foi mantido, como piso de taco antigo, e que tipo de garantia existe para isso também é fundamental”, reforça Ichimaru.
O retrofit é vantajoso em qualquer região da cidade? “Tudo depende de estudo econômico e alternativas: onde o retrofit aproveita ao máximo o ativo, ele vale. Em outros casos, o melhor caminho pode ser demolir e construir um novo empreendimento”, avalia Claúdio Bernardes, do Secovi-SP.
A Metaforma planeja ampliar suas operações para além do centro. Há negociações abertas na Mooca (zona leste) e em Santo Amaro (zona sul). A Somauma planeja desembarcar no Rio de Janeiro, de olho na grande quantidade de prédios subutilizados no centro da capital fluminense.
O retrofit tem potencial para transformar áreas antigas em novos polos de moradia e investimento, diz Claudio Bernardes, do Secovi-SP. “O diferencial é que esses projetos podem suprir demandas cada vez mais específicas”.