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Economia

Por que as declarações de Lula sobre a economia deixaram o mercado em alerta?

Por que investidores reagiram de forma negativa a falas do petista sobre gastos sociais e responsabilidade fiscal?

Passada a “lua de mel” do resultado das eleições, o mercado reagiu de forma negativa, no final desta semana, a falas do recém-eleito presidente Luis Inácio Lula da Silva sobre o quadro fiscal do país.

Na quinta-feira (10), o Ibovespa, principal índice da B3, chegou a afundar 4% e o dólar ultrapassou R$ 5,40 após o petista declarar que é preciso colocar a questão social na frente de assuntos que interessam somente ao mercado financeiro.

22/08/2022 REUTERS/Carla Carniel

Após a repercussão, Lula tentou minimizar a reação de investidores, que reagiu mal a declarações suas criticando a necessidade de cumprir regra fiscal em detrimento de gastos sociais e defender que algumas despesas deveriam ser consideradas investimentos.

“O mercado fica nervoso à toa. Eu nunca vi um mercado tão sensível como o nosso. É engraçado que esse mercado não ficou nervoso com quatro anos do (governo Jair) Bolsonaro”, disse Lula ao deixar o Centro Cultural Banco do Brasil, sede da transição de governo.

Em discurso durante encontro com parlamentares aliados no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), Lula da Silva fez críticas à “estabilidade fiscal”, defendeu que algumas despesas deveriam ser consideradas investimentos, falou sobre o papel dos bancos públicos, criticou dividendos da Petrobras e fez declarações sobre crescimento e inflação.

Opinião do mercado

“Após assumir o cargo é esperado que o presidente eleito não adote mais um discurso ‘eleitoral’, portanto não haveria necessidade de ele ressaltar pontos mais populistas de sua proposta. Mas não foi o que ocorreu”, escreveu a equipe de research da Guide Investimentos em relatório.

“Quanto mais o novo governo demora para fazer essa transição, mais o mercado vai ficar nervoso”, diz Luciano Sobral, economista-chefe da Neo Investimentos. “O mercado está colocando um preço para esse cenário de mais gasto, sem uma fonte de financiamento clara.”

“As declarações (do Lula) coroam uma percepção de uma mudança dessa linha (mais otimista) da semana passada. Agora, há uma visão de muita preocupação com o que vem pela frente”, diz Silvio Campos Neto, economista da consultoria Tendências. “É um movimento que marca uma reversão das expectativas do mercado com o novo governo.”

Veja a seguir os temas levantados pelo presidente eleito nos quais o mercado está de olho:

Gasto social x ajuste fiscal

Em sua fala, Lula questionou a preocupação excessiva em cortas gastos e preservar o teto, que estabelece que as despesas públicos não podem crescer acima da inflação.

“Por que as pessoas são levadas a sofrerem por conta de garantir a tal da estabilidade fiscal desse país? Por que toda hora as pessoas falam que é preciso cortar gastos, que é preciso fazer superávit, que é preciso fazer teto de gastos? Por que as mesmas pessoas que discutem teto de gastos com seriedade não discutem a questão social neste país?”, questionou.

Segundo “O Estado de S. Paulo”, ganhou força na equipe de transição a opção de retirar as despesas do Auxílio Brasil do teto de forma permanente, o que desagradou o mercado. Para o setor financeiro, a saída que vem sendo negociada pela equipe de transição, que também teria de ser feita via PEC, pode deteriorar a trajetória de sustentabilidade da dívida pública.

Segundo o petista, é preciso mudar a forma de encarar determinados gastos que são feitos pelo poder público. “É preciso mudar alguns conceitos. Muitas coisas que são consideradas como gastos neste país, precisam passar a ser encaradas como investimento. Não é possível que se tenha cortado dinheiro da farmácia popular em nome de que é preciso cumprir a meta fiscal, cumprir a regra de ouro”, disse Lula.

Críticos à expansão sem controle das despesas afirmam que a responsabilidade fiscal é o que permite mais gastos para o social ao se economizar com a conta de juros da dívida.

Estatais e dividendos da Petrobras

O presidente eleito afirmou, ainda, que as estatais serão “respeitadas” no novo governo e que a Petrobras (PETR4) não será “fatiada”. O petista também disse que os bancos públicos voltarão a ser bancos de investimentos.

Em seu discurso, Lula criticou o volume de dividendos pagos pela Petrobras a acionistas. “A ideia é esvaziar o caixa da Petrobras para que a gente não possa fazer nada”, acusou o presidente eleito.

Bancos públicos

Lula também afirmou que o governo atual quer “esvaziar” o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para acabar com a capacidade de investir do banco de fomento. Ele disse ainda que o Banco do Brasil (BBAS3) e a Caixa não serão privatizados.

“Muitas coisas consideradas como gastos devem ser consideradas como investimentos”, declarou o presidente eleito. “A coisa mais barata em um País é cuidar dos pobres. A coisa mais cara é pagar o sistema financeiro o que o Estado lhe deve”, emendou.

Metas de inflação x crescimento

Em sua fala, Lula questionou a existência de metas de inflação, em vez de metas para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).

O presidente eleito lembrou que, durante seus dois mandatos, entre 2003 e 2010, o Brasil respeitou as metas fiscais, os índices de inflação e deixou o País com superávit, em vez de dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Lula reafirmou, como fez na campanha eleitoral, que o país tem que retomar a credibilidade, a estabilidade e a previsibilidade. “A sociedade não pode ser pega de surpresa”, disse o petista.

Volta da fome

Lula se emocionou e chegou a interromper sua fala quando citou um trecho do discurso que fez em sua vitória de 2002, ao comentar o tema da fome, que voltou à pauta nacional. “Se quando eu terminar esse mandato cada brasileiro estiver tomando café, almoçando e jantando, eu terei cumprido, outra vez, o meu papel”, disse. “Restabelecer a dignidade do povo é a única razão de eu voltar. Se quando eu terminar esse mandato, cada brasileiro estiver tomando café, almoçando e jantando, terei cumprido minha meta.”

Ele afirmou ainda que pretende conversar com o agronegócio para entender “qual é a bronca” do setor com sua eleição, já que este pagava juros menores durante a gestão petista em relação ao cenário atual. O agro foi um dos principais setores a apoiarem a reeleição de Jair Bolsonaro.

*Com Estadão Conteúdo e Reuters

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