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Especulação imobiliária é crime? Entenda a polêmica prática e seus efeitos

Controversa no meio imobiliário, prática pode gerar altos lucros ao especulador, mas impactos negativos às cidades e à população.

Imóveis, imobiliário. Fonte: Freepik.

Especulação imobiliária é um assunto polêmico, muito discutido no mercado imobiliário. Por um lado, a prática é considerada injusta e prejudicial. Já para seus praticantes, é tida como uma boa forma de obter altos lucros.

Segundo o dicionário Priberam, no comércio, o termo especulação refere-se a uma “operação de resultados incertos e arriscados, mas de grande vantagem se for bem sucedida”. Ou seja, é um investimento feito apenas com base em teorias.

Mas você sabe o que é especulação imobiliária e seu significado, como ela funciona e por que ela é considerada injusta por algumas pessoas? Confira neste guia do InvestNews.

O que é especulação imobiliária e como funciona

Especulação imobiliária é o nome dado a uma prática de mercado que consiste na compra de imóveis como casas, terrenos e salas comerciais, sem utilizá-los, apenas com a intenção de vendê-los a um preço maior depois.

Aqui, o investidor não obtém lucro com aluguéis ou outro uso dado ao imóvel, mas sim decorrente da valorização deste, do aumento de seu preço no mercado imobiliário.

Basicamente, o comprador “estoca” esse bem, especulando uma elevação de seu valor de mercado e a obtenção de lucro com a revenda. O objetivo aqui não é utilizar o bem, mas sim obter vantagem sobre o aumento do preço dos imóveis.

Foto de Alex D’Alessio na Unsplash

Vários fatores podem resultar nesse encarecimento do imóvel, como melhorias na estrutura do bairro, no transporte ou até em bairros adjacentes, assim como um aumento da demanda por imóveis da região. Veja abaixo quais são eles.

É importante mencionar que esses são fatores externos que, sozinho, o investidor não consegue alterar. Por isso o termo “especulação”, pois baseia-se em estudos e suposições.

O interesse do especulador é puramente vender a propriedade obtendo o maior retorno possível do investimento. Ele mantém esse imóvel durante determinado tempo até que as condições sejam favoráveis o suficiente para obter o máximo de sucesso possível em seu negócio. 

Assim que consegue atingir esse objetivo, o ciclo de especulação sobre esse imóvel acaba.

Essa é uma prática realizada não apenas por investidores individuais, mas por diversas empresas também – o que tem se tornado um problema crescente em algumas cidades brasileiras.

O que diferencia o especulador de outros compradores de imóveis é a não utilização da propriedade com interesse em sua valorização. Se você possui um imóvel que não utiliza, mas que aluga por temporada, por exemplo, não é considerado especulação.

Imóveis
Crédito: Shutterstock

O que é valor de mercado?

Entender o conceito de valor de mercado é muito importante tanto para compreender como ocorre a especulação imobiliária quanto para apostar em um investimento imobiliário, como em fundos imobiliários (FIIs).

Primeiramente, o valor de mercado não é o mesmo que o valor que se paga em algo no momento da compra, mas sim o preço estipulado pelo mercado de determinado bem. É o valor atingido por um produto com base na concorrência e na lei de oferta e demanda.

É possível chegar a esse valor por meio dos preços de imóveis semelhantes à venda, ou por meio de uma avaliação do imóvel, de preferência, com um profissional qualificado. Serão analisados fatores como localização; valor médio do metro quadrado nessa região; tamanho do imóvel; estado de conservação e até a quantidade de cômodos.

Como se avalia o valor de imóvel?

Segundo a NBR 14653 (Norma brasileira de avaliação de bens), norma da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) responsável pelo controle da avaliação de imóveis no país, a abordagem pelo valor de mercado “identifica a quantia mais provável pela qual um bem seria transacionado no mercado. Alguns tipos de valor podem traduzir ou se identificar com o valor de mercado”.

“O profissional, conforme o tipo de bem, as condições de contratação, o método empregado e a finalidade da avaliação, pode tecer considerações sobre o mercado do bem avaliando de forma a indicar, tanto quanto possível, a estrutura, a conduta e o desempenho do mercado”, diz o documento disponibilizado pelo Ibape (Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia).

De acordo com o documento, “a conjuntura de mercado diz respeito normalmente a variações de curto prazo na oferta e demanda e suas consequências sobre os preços, em função de circunstâncias econômicas, sociais e ambientais”.

Especulação imobiliária é crime?

Apesar de ser considerada injusta, a especulação imobiliária não é considerada crime, já que não é possível impedir que alguém realize a compra de imóveis visando apenas o lucro.

Não existe no Brasil uma regulação específica sobre o assunto, no entanto, existem regras sobre o uso de imóveis, e algumas medidas do governo para frear o número de ocorrências desse tipo.

A especulação imobiliária também tem consequências para as cidades, que serão mencionadas mais abaixo, por isso, os municípios tentam evitá-la.

A Constituição Federal (CF) de 1988  estabelece que a propriedade deve cumprir a sua função social, segundo o inciso XXIII do artigo 5º, que trata do direito básico à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. 

Ainda de acordo com a Constituição, o artigo 182º, regulamentado com a criação do Estatuto da Cidade (Lei n° 10.257/2001), que determina diretrizes gerais da política urbana, define que “a política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem estar de seus habitantes”.

Para tal, o município pode até exigir do proprietário de um imóvel ou terreno não utilizado que promova seu adequado aproveitamento de forma a atender essa função social.

Segundo a Constituição as penas para quem não cumprir o que é estabelecido no artigo são:  

  • Parcelamento ou edificação compulsórios
  • Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo (aumento do IPTU, Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana);
  • Desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais

Como vimos, não há uma lei específica que proíba a prática de especulação imobiliária, entretanto, o poder público adota providências para que esses terrenos atendam ao interesse coletivo.

Fatores que fazem os preços dos imóveis variarem

Imagem de Wirestock em Freepik

Assim como outros produtos do mercado, os imóveis também são impactados direta e indiretamente por alguns fatores. Como mencionado, localização e infraestrutura são alguns deles, além do bom estado de conservação. Confira:

Aumento da demanda/ escassez de imóveis 

Um dos principais influenciadores do valor de mercado de um imóvel é a demanda. Quanto mais pessoas quiserem morar naquela região, mais altos os preços tendem a ficar, já que dificilmente a oferta desses imóveis acompanhará a procura, pois possui crescimento limitado.

Quanto mais terrenos estiverem ocupados em determinado lugar, mais caros ficarão aqueles que restarem. Portanto, o especulador pode aproveitar a escassez desses imóveis para se beneficiar da sobrevalorização daqueles que não estiverem ocupados.

Melhorias de infraestrutura

Outro fator que pode tornar uma região mais atrativa é a melhoria da infraestrutura deste local. 

Investimento público na pavimentação das ruas do bairro, água e sistemas de esgoto, energia elétrica, além do surgimento de escolas, investimentos na rede de transportes da região e acessos aos principais pontos da cidade, ou outros investimentos em obras e acessos que tornem o lugar melhor para viver, acabam valorizando os terrenos desta área.

Questões como investimento em segurança também são importantes, já que imóveis próximos a áreas com policiamento e vigilância, e com baixos índices de criminalidade, são mais valorizados.

Crescimento da cidade

Geralmente, especuladores podem procurar por terrenos ou imóveis mais acessíveis, com preço baixo, em áreas degradadas ou que ainda não estão sendo habitadas. O investimento é feito esperando que uma mudança ocorra e que o local apresente melhorias com o tempo.

Imagem de wirestock no Freepik

Uma parceria da prefeitura com empresas privadas, por exemplo, surgimento de novos estabelecimentos comérciais, parques, aumento demográfico na região, mais empresas, e consequentemente, mais pessoas transitando no local, tudo isso atrai mais gente e possíveis compradores desses terrenos e imóveis, e como consequência, o preço desses imóveis sobe.

Benefícios e consequências da especulação imobiliária

Benefícios

Os principais benefícios da especulação imobiliária referem-se ao possível lucro almejado pelo especulador, já que ela pode gerar grandes problemas para as cidades. Confira:

Lucro para o especulador

A mais óbvia das vantagens é o retorno financeiro obtido com a especulação imobiliária.

Dependendo do valor que foi pago pela propriedade, é possível multiplicá-lo caso tenha a paciência para esperar o momento certo.

Possível investimento em infraestrutura

Alguns citam a possível geração e incentivo de investimentos privados ou aumento de infraestrutura na região como benefício da especulação imobiliária, já que, devido ao impacto que causa na expansão da cidade, a prefeitura pode ser obrigada a fazer investimentos na rede de transportes, por exemplo, para ligar essas áreas, ou investir em outros bairros para comportar a população afastada das regiões onde ocorre a especulação imobiliária, o que será mencionado nas consequências dessa prática.

No entanto, é importante mencionar também a diferença entre incorporador e especulador imobiliário.

Citando o episódio 49 do IbradimCast, podcast do Ibradim (Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário), “a atividade de incorporação imobiliária é justamente o inverso (da especulação). Ela pega um imóvel, normalmente até subutilizado, no geral, porque, principalmente nas nossas cidades, estamos falando de imóveis horizontais, dificilmente um imóvel vertical é utilizado na atividade, e você transforma esse imóvel em um empreendimento imobiliário, seja ele residencial ou comercial e desenvolver uma área é o inverso da atividade de especulação”, disse Vladimir Iszlaji. 

De fato, existe uma confusão entre os termos, no entanto, a própria criação do estatuto da cidade, que justamente tem por um dos principais objetivos evitar a prática de especulação imobiliária, prova que o poder público não considera essa atividade benéfica para a cidade e para a sociedade em geral e, inclusive, a desencoraja fortemente.

Na especulação imobiliária, nada é criado, desenvolvido ou incentivado. O terreno apenas existe, diferentemente da incorporação.

Consequências negativas

Como dito anteriormente, a especulação imobiliária é desencorajada pelo poder público e gera muitos impactos para as cidades e as populações que moram onde ela é praticada. Confira abaixo algumas dessas consequências negativas:

Aumento dos preços na região

A valorização artificial desses imóveis pode ser causada pela especulação imobiliária por meio da lei de oferta e demanda. 

Quanto menos disponibilidade há de um produto, mais seu preço tende a aumentar. O solo é um produto, portanto, isso afeta o preço do metro quadrado de um terreno.

Comprar ou alugar imóvel? (Foto: Pixabay)
(Foto: Pixabay)

Dessa maneira, quando ocorre a especulação imobiliária, as pessoas passam a ter menos opções disponíveis e o preço sobe. Mas esse aumento de preço pode contribuir para gerar outra consequência mais severa, a chamada bolha imobiliária. 

O excesso da prática de especulação imobiliária em uma região pode ocasionar um aumento desenfreado nos preços dos imóveis, sem que esse preço reflita o real valor desses imóveis, muitas vezes alimentados pelos próprios especuladores que, otimistas, pagam valores cada vez mais altos esperando uma valorização ainda maior.

Quando essa bolha estoura, os preços chegam a um nível em que não há mais consumidores o suficiente para tantos imóveis e dispostos a pagar preços tão altos, assim, pode ocorrer um excesso de imóveis no mercado, provocando uma queda brusca nos preços e gerando prejuízos enormes aos especuladores.  

Prejuízos para a cidade

A especulação imobiliária pode gerar uma quebra na expansão das cidades, isso porque há a necessidade de espaço para novas construções e terrenos em regiões mais afastadas costumam ser mais baratos, portanto, mais acessíveis para isso e, geralmente, esses são os imóveis mais vantajosos para o especulador. 

Além disso, essa prática pode gerar uma concentração de lotes vagos nas áreas em que ocorre, dificultando o desenvolvimento e afastando as pessoas da região em questão e até gerando o crescimento horizontal das cidades, em que há o surgimento de novos bairros, até que ele atinja cidades vizinhas.

Essa prática gera pontos de concentração populacional e questões como sobrecarregamento das redes de transporte público, ocasionando problemas de mobilidade urbana também.

Segregação socioespacial 

Como já mencionado, esses terrenos e imóveis comprados pelo especulador não têm um uso social. 

Dessa maneira, as cidades precisam expandir e as populações menos abastadas passam a viver cada vez mais longe dos centros, enquanto existem imóveis sem utilização em áreas mais próximas.

Com a valorização desses terrenos e imóveis, algumas áreas se tornam praticamente inacessíveis para parte da população, expulsando-a para regiões mais periféricas e, geralmente, sem investimentos em infraestrutura, como saneamento básico.

Essa expansão obriga o governo a investir nesses novos bairros cada vez mais afastados,  que nem sempre acontece. 

Além disso, a especulação imobiliária possui consequências para o próprio especulador. O investimento é de alto risco, já que não passa de especulação e pode não gerar o lucro esperado. Esses imóveis também podem precisar de manutenção e até gerar prejuízo, quando desocupados por muito tempo.

Mas principalmente, ele pode sofrer sanções do poder público por meio do aumento dos impostos do imóvel ou outros pagamentos e até a desapropriação dele.

Especulação imobiliária e gentrificação

Ponte do Morumbi – Imagem de Christian Felix Möller Somers/Unsplash

A gentrificação é um processo de transformação urbana caracterizado pela mudança drástica de uma região em que ocorre uma valorização acentuada gerando uma segregação socioespacial.

Basicamente, um local passa a atrair residentes com maior poder aquisitivo e empresas voltadas às classes mais altas, encarecendo o custo de vida na região e afastando os grupos sociais mais pobres daquela área. 

Nesse processo, a mudança de perfil de determinada área acaba gerando a ”expulsão” de classes mais baixas, isolando-as em regiões distantes, nas periferias.

O termo gentrificação vem de “gentrification” (de gentry, “pequena nobreza”), conceito criado pela socióloga britânica Ruth Glass (1912-1990) em London: Aspects of change (1964), segundo artigo publicado na FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP).

A gentrificação descreve o que ocorre em regiões antes degradadas ou sem investimentos, que tornam-se “áreas nobres”.

Qual a diferença entre especulação e gentrificação?

Especulação imobiliária e gentrificação não são sinônimos, entretanto, a segunda pode favorecer a primeira. Isto porque, quando ocorre essa valorização excessiva de uma região, os imóveis passam a ter um preço mais elevado, o que contribui para o sucesso do especulador, que, com certeza, venderá a propriedade por um valor bem mais elevado do que o da compra.

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