O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) decidiu dar uma ajuda ao mercado de ETFs no Brasil. A escala do programa chama a atenção: trata-se de um impulso de R$ 1 bilhão no total.

A instituição iniciou uma chamada pública que vai até 5 de dezembro para selecionar 5 fundos de índice negociados em bolsa para receberem até R$ 200 milhões cada um. Serão selecionados 3 ETFs de ações, 1 de renda fixa e outro de estratégia híbrida. Os aportes vão ocorrer por meio do BNDESPar, a área que adquire participações de empresas e fundos do banco.

O diretor de desenvolvimento de negócios da BlackRock Brasil, Cristiano Castro, diz que a gestora vai participar do processo. “O volume de investimento proposto é perfeito. Quando soubemos da iniciativa tivemos medo de que viria algo que não fosse tão significativo, mas R$ 200 milhões por fundo ajuda a destravar várias estratégias.”

A iniciativa do BNDES pode funcionar como uma espécie de catalisador para o mercado. Com o aporte, os ETFs escolhidos vão ganhar tamanho para atrair investidores institucionais de maior porte. Um movimento que, por sua vez, espera-se, incentive outros fundos de pensão menores, fundos de investimentos e family offices a incluir ou aumentar a fatia investida em estratégias de índices. Ou seja, cria uma espécie de efeito bola de neve.

Existe uma forte concentração no mercado em termos de volume de negociação. Dados da B3 mostram, por exemplo, que no segmento de ETFs de renda variável apenas quatro veículos dominaram 99% do volume negociado de janeiro a outubro deste ano. Dos R$ 120,64 bilhões movimentados, BOVA11 e BOVV11, ambos ETFs que seguem o Ibovespa, o SMALL11, atrelado ao índice Small Caps, e SPXR11, que segue o S&P 500, foram responsáveis por R$ 120,33 bilhões.

Castro, da BlackRock, explica ainda que, além da liquidez, o volume aportado pelo BNDES vai possibilitar que os ETFs beneficiados destravem diversas estratégias utilizadas por investidores mais sofisticados, como o aluguel das cotas do fundo, uma forma de se posicionar para ganhar com a queda do índice, por exemplo. “Quando um ETF quando bate um volume mínimo, algo próximo a R$ 100 milhões, começamos a ver os investidores alugando o papel e fazendo operações como a de ‘long and short‘ (combinação de posições para ganhar na alta – o long – ou na queda – o short – do papel).”

O diretor executivo e de Investimentos da Nu Asset, Andres Kikuchi, enxerga ainda o movimento do BNDES como uma espécie de endosso de novas estratégias, caso dos ETFs híbridos, ou seja, de índices que combinam renda fixa e variável. “O programa vai buscar um desenvolvimento do mercado além da renda variável.”

O especialista destaca ainda que o processo de avaliação do banco de fomento vai levar em conta vários aspectos como qualidade da gestão, transparência e até estrutura de custos. “Esse tipo de validação vai ajudar também no próprio desenvolvimento da indústria de provedores de fundos de índice no Brasil.”

O CEO da Rio Bravo, Paulo Bilyk, ressalta que o crescimento do mercado de ETFs passa também pela atração de novos investidores e participantes. “Lá fora, por exemplo, os ETFs fazem parte da composição dos portfólios de investidores de todos os tamanhos.”

Kikuchi, da Nu Asset, lembra ainda que no Brasil o mercado de fundos de índice é concentrado em renda variável, enquanto, na verdade, o brasileiro aloca muito mais na renda fixa. Na visão do especialista, os ETFs de renda fixa vão ser um dos motores do avanço da indústria do país nos próximos anos.

Além de ser o maior mercado de investimentos local, os fundos de índice de renda fixa oferecem algumas vantagens para os aplicadores em relação aos fundos tradicionais. Os ETFs não têm come-cotas, que é a cobrança antecipada do imposto de renda sobre os ganhos. Além disso, não há a cobrança de IOF, que incide sobre o retorno dos fundos de renda fixa tradicionais se houver resgates em até 30 dias.

Os gestores consideram ainda o próximo ano como um período de aceleração do crescimento da indústria de ETFs no país. Não apenas pela ajuda do BNDES, mas pelas mudanças regulatórias recentes introduzidas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que traz exigências para os assessores de investimentos de divulgar informações qualitativas e quantitativas sobre remuneração, arranjos, possíveis conflitos de interesse.

Na avaliação dos gestores, existe um incentivo para a mudança da forma de remuneração dos assessores, que formam um canal importante de distribuição de fundos e ETFs, de um modelo de comissões para outro baseado em uma taxa fixa cobrada sobre o patrimônio administrado.

O modelo dominante atual incentiva a recomendação dos produtos que oferecem uma maior comissão na venda, o que favorece o conflito de interesses. No caso da taxa fixa, a remuneração do assessor acaba atrelada ao desempenho dos portfólios, quanto melhor, maior será seu pagamento.

Na avaliação de Castro, da BlackRock, o formato de comissões não incentiva a distribuição de ETFs por parte dos assessores de investimentos, porque a remuneração pela venda é baixa. No entanto, uma migração para o sistema de taxa fixa pode impulsionar a oferta nesse canal. Isso porque os fundos de índice têm custo de administração bem menor comparado aos fundos tradicionais e, com isso, potencialmente podem oferecer retorno maior ao aplicador.

Essa mudança pode impulsionar o crescimento da demanda por ETFs. Conforme Bilyk, da Rio Bravo, atualmente, os principais canais de distribuição de ETFs acabam sendo as plataformas e os aplicativos de bancos digitais, quase em um sistema de auto-atendimento.

“O crescimento dos ETFs no mercado americano aconteceu dessa mesma maneira”, afirma Kikuchi. “Essa questão da transparência das taxas levou muitos assessores a saírem de um modelo de rebate para um de ‘fee based’ e, atualmente, esses sistemas de remuneração são meio a meio lá fora. Essa transformação levou a um forte avanço dos ETFs.”