Por volta das 16h29, o dólar era negociado a R$ 5,3209, praticamente estável. Em setembro, a moeda americana acumulou recuo de 2%.
A queda do dólar está, atualmente, na conta do Federal Reserve (Fed, o banco central americano). Isso porque a autoridade planeja cortar os juros ao menos mais uma vez e, quem sabe, até mesmo duas antes de 2025 acabar.
Porém, no caso do Brasil, esse roteiro de fraqueza do dólar parece ter um “plot twist”, ou seja, uma reviravolta programada no próximo ano. E o que pode acontecer para mudar o cenário atual?
É que o início do ciclo de queda da taxa de juros no Brasil vai coincidir com uma desaceleração do ritmo de corte pelo Fed ou até mesmo uma pausa prolongada lá fora. Esse cenário pode reforçar a cautela entre investidores globais.
Uma postura menos voluntariosa para tomar risco pode secar, justamente, uma das fontes da recente valorização das moedas emergentes: a busca por diversificação fora do mercado americano.
Inflação nos EUA ainda não foi domada
Uma mudança de posicionamento do Fed teria como causa uma preocupação com um aumento de pressão sobre preços nos próximos trimestres. Acontece que o BC dos EUA passou a manifestar, logo após a decisão de retomar os corte de juros em setembro, estar desconfortável com a persistência da inflação.
O índice de preços de gastos com consumo pessoal (PCE), a medida de inflação preferida do Fed, subiu para 2,7% em agosto, o que indica uma leve aceleração comparado aos 2,6% de julho. “Com o PCE avançando para 2,7% em 12 meses, fica claro que o Fed terá de manter cautela na condução da política monetária”, afirma Pedro Da Matta, CEO da Audax Capital.
O plano de voo do Fed leva em consideração uma redução de juros para evitar a aceleração do desemprego. Mas, por outro lado, há a necessidade de calibrar o ritmo do afrouxamento de maneira a evitar a volta da inflação. Daí a necessidade de o BC americano adotar uma postura mais prudente em algum momento nos próximos trimestres.
“Acho que nem poderíamos chamar esse movimento de um ciclo de cortes”, afirma o sócio e gestor da Az Quest, Eduardo Aun. “Parece-me mais um ajuste fino devido à deterioração marginal do mercado de trabalho. Não vejo espaço para muito mais cortes além dos já sinalizados pelo Fed.”
BC brasileiro não tem pressa para cortar
Do lado de cá, o relatório Focus, que reúne as projeções de instituições financeiras em relação a juros, inflação e PIB, mostra que o mercado vê a Selic em 12% ao fim de de 2026. Isso significa uma redução de 3 pontos percentuais.
Se o BC fizer reduções de 0,25 ponto na Selic, precisaria de 12 reuniões para chegar na projeção do Focus. Porém, como o Comitê de Politica Monetária (Copom) se reúne apenas oito vezes no ano, a estimativa de Selic a 12% no fim do próximo ano embute a perspectiva de vários cortes de 0,5 ponto.
Em resumo, enquanto o Fed tem sinalizado haver chance de cortar uma vez ou nem cortar os juros em 2026, por aqui o mercado avalia que o BC brasileiro vai acelerar o passo no ano que vem. Com a redução do chamado diferencial de juros, o mercado local tende a se tornar menos atrativos aos investidores estrangeiros.
As estimativas da equipe de pesquisas econômicas do Itaú, por exemplo, reforçam essa dualidade de cenários daqui até o fim do ano e o que poderá ser visto já em 2026. O time do Itaú, liderado pelo economista-chefe Mario Mesquita, ressaltou ver o real forte no curto prazo. Mas, para o próximo ano, “o estreitamento do diferencial de juros, o prêmio de risco e o cenário desafiador das contas externas limitam perspectivas mais favoráveis”.
Os especialistas do banco enxergam o dólar no fim de 2025 em R$ 5,35. Mas preveem que a moeda americana termine 2026 cerca de 3% mais alta. Segundo a casa de análise, a taxa de câmbio deve subir para R$ 5,50 no ano que vem. Isso significa que, na visão do Itaú, a maior parte da potencial desvalorização do dólar frente ao real já passou.
O Focus também mostra uma visão menos otimista para 2026. O relatório do BC projeta uma taxa de câmbio de R$ 5,58 no final do ano que vem.
Volatilidade pode voltar
Aun, da AZ Quest, lembra ainda que o real tem sido muito utilizado em operações de “carry trade”, ou seja, quando uim investidor toma emprestado em moeda de juros baixos e investe em outra moeda de juros altos para capturar o diferencial de juros (“carry”). Se houver uma reversão da tendência do dólar fraco, o desmonte de posições de carry em reais levaria a um aumento da volatilidade no mercado brasileiro.
Para o ano que vem, o especialista em portfólio da Azimut Brasil WM, Marcelo Bacelar, cita ainda o problema da piora nos números de conta correte no país como outro ponto de pressão contra o real. “Não é um desespero, mas é um sinal amarelo porque começa a mostrar uma saída de dólares estrutural.”
Apesar das nuvens cambiais mais escuras em 2026, as previsões não desenham nenhum cenário crítico, mas, basicamente, uma mudança de ventos no horizonte. De qualquer modo, parece que, pelo menos as viagens internacionais no fim de ano estarão garantidas.