O tombo reflete uma combinação de fatores que reacendeu preocupações do mercado: prejuízo líquido de R$ 1,84 bilhão, consumo de caixa de quase R$ 13 bilhões e salto de 44% na dívida líquida, que agora soma R$ 49,2 bilhões — o equivalente a 4,5 vezes o EBITDA ajustado.
O ponto de inflexão, porém, pode estar numa mudança de tom sutil, mas significativa, no release de resultados. Pela primeira vez, a Raízen admitiu publicamente que avalia, junto aos controladores, um possível aumento de capital.
“As discussões ainda estão em estágio inicial, sem termos definidos ou garantia de execução”, disse a companhia. A leitura do mercado é que a capitalização pode ser necessária para conter o avanço da alavancagem, mas levanta, por outro lado, o risco de diluição para os acionistas atuais, o que motiva a saída do papel.
Na avaliação do UBS, mesmo que uma eventual injeção de capital venha a destravar valor no médio prazo, no curto prazo ela se tornou um novo ‘overhang’ (uma espécie de âncora) para o papel. O banco manteve recomendação neutra para a ação.
Resultado desaponta, mas há algumas balas de prata
O EBITDA ajustado de R$ 1,89 bilhão ficou 14% abaixo da projeção do Safra e 22% abaixo do consenso de mercado. A maior frustração veio da divisão de Açúcar, Etanol e Bioenergia, cujo resultado recuou 24% na base anual, impactado pelo menor volume de moagem de cana, condições climáticas adversas e maior participação de cana de terceiros no mix.
No entanto, o BTG viu “um resultado de melhor qualidade, algo que não se via na Raízen há algum tempo”. O banco destacou o corte de 19% nas despesas gerais e administrativas, a redução do capex (investimentos) e um melhor gerenciamento de riscos nas negociações de compra e venda de açúcar. Nessas operações, a empresa conseguiu preços 5% maiores do que um ano antes.
Um dos poucos pontos de alívio veio da divisão de combustíveis no Brasil, que entregou um EBITDA de R$ 1 bilhão, acima das expectativas dos bancos. “A combinação de margens fortes com ganho de participação de mercado deixa uma boa impressão”, escreveu o banco, em relatório. Já na Argentina, a parada de manutenção da refinaria comprometeu os resultados: o EBITDA da unidade caiu pela metade.
Mesmo assim, a linha final do balanço não resistiu ao conjunto da obra. O Safra havia projetado lucro de R$ 701 milhões — veio um prejuízo de R$ 1,84 bilhão. O UBS, por sua vez, alertou para o consumo de caixa de R$ 14 bilhões no trimestre, ainda que “antecipado”, e reiterou que a desalavancagem precisa acontecer rapidamente.
Venda de ativos e simplificação
Diante do endividamento crescente, a Raízen já vinha promovendo uma forte agenda de desinvestimentos e reestruturação, agora reforçada pela possibilidade de capitalização.
A companhia já vendeu ativos relevantes da operação de geração distribuída, encerrando a joint venture com o Grupo Gera. Também “hibernou” cinco usinas e vendeu outras três, em um movimento para concentrar a operação em unidades mais eficientes. Além disso, colocou à venda a operação de refino e distribuição na Argentina, adquirida por cerca de US$ 1 bilhão em 2019 — e que pode ser a principal fonte de caixa no curto prazo.
A empresa identificou R$ 15 bilhões em ativos com potencial de venda. Só com os negócios já anunciados, a empresa já levantou mais de R$ 3 bilhões. .
“Mesmo uma leve melhora no fluxo de caixa livre pode destravar um upside [potencial de alta] relevante nas ações”, diz o BTG, que manteve a recomendação de compra e preço-alvo de R$ 3,00 — um potencial de valorização de 150% sobre os preços atuais.