A SAF do Atlético Mineiro, controlada pelo empresário Rubens Menin, estruturou um Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) para captar R$ 90 milhões em sua primeira emissão, apurou o InvestNews.

A operação, coordenada pela Galapagos Capital, terá como garantia receitas recorrentes da SAF, incluindo patrocínios, direitos de arena, vendas de jogadores e mensalidades do programa de sócio-torcedor, além das contribuições do Clube Social.

A primeira emissão foi registrada nesta semana na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sob o rito automático, destinada exclusivamente a investidores profissionais — aqueles que possuem mais de R$ 10 milhões aplicados. A operação se encerra nesta terça-feira (9), quando os recursos entram no fundo e passam a ser disponibilizados para a SAF mediante a cessão dos recebíveis, que não foram detalhados no documento acessado pela reportagem.

O fundo foi desenhado para permitir a antecipação de receitas sem comprometer a estrutura de capital da SAF. Pelo regulamento, publicado na semana passada, apenas créditos considerados líquidos e certos podem entrar no portfólio. 

Trata-se da segunda estrutura desse tipo em um grande clube brasileiro: no ano passado, o São Paulo Futebol Clube captou R$ 240 milhões em um FIDC também coordenado pela Galapagos.

Como funciona

O uso de um FIDC por clubes de futebol permite antecipar receitas futuras sem recorrer a empréstimos bancários ou debêntures tradicionais – linhas em que o custo costuma ser maior. O clube cede ao fundo o que teria direito a receber ao longo dos próximos meses e anos; o FIDC, por sua vez, vende cotas a investidores que passam a receber diretamente o fluxo desses contratos.

Em troca, o Atlético Mineiro recebe o dinheiro à vista, com custo menor do que o crédito bancário padrão – e com governança mais rígida. A Galapagos impôs alguns critérios: o fundo só pode comprar créditos não vencidos, não litigiosos e de devedores que não apresentaram atrasos superiores a 30 dias.

Também é vedada a entrada de “recebíveis fabricados” ou operações intercompany – um tipo de engenharia em que o clube cria ou transfere artificialmente créditos entre empresas do mesmo grupo para inflar o lastro do fundo. A vedação busca evitar distorções contábeis e garantir que apenas receitas reais e verificáveis sustentem a carteira.

Pelo regulamento, os recebíveis que entram no FIDC precisam remunerar ao menos o benchmark previsto em cada contrato acrescido de até 1,70% ao ano – referência que, em operações desse tipo, costuma ser o CDI, por exemplo.

SPFC x Atlético

Embora a estrutura utilize a mesma arquitetura – um FIDC lastreado em receitas do futebol e organizado pela própria Galapagos – há duas diferenças centrais: o Atlético já opera como SAF, enquanto o São Paulo ainda tem a estrutura de um clube social.

No caso do São Paulo, o FIDC veio acompanhado de covenants explícitos: teto de gastos com futebol, superávit obrigatório, limite de endividamento e disciplina orçamentária. Como não existe separação patrimonial formal entre clube social e operação do futebol, os investidores exigiram travas diretas no fluxo de caixa e no comportamento financeiro do clube.

Na SAF do Atlético Mineiro, esse tipo de intervenção não existe, uma vez que a operação já funciona como empresa independente, com patrimônio segregado. A ideia, de acordo com o documento, é que o clube utilize o FIDC como um mecanismo recorrente de monetização de receitas, que pode ser ampliado em emissões futuras.

SAF do Galo

A SAF do Atlético-MG foi criada em julho de 2023, quando o clube aprovou a venda de 75% do futebol para a recém-formada Galo Holding, por R$ 913 milhões, em um movimento que buscava organizar o passivo e profissionalizar a gestão esportiva e financeira do clube.

A Galo Holding é comandada pelos chamados “4R’s” — Rubens Menin e Rafael Menin, controladores da MRV e do Banco Inter; Ricardo Guimarães, presidente do Banco BMG; e Renato Salvador, sócio da rede de hospitais Mater Dei — grupo de empresários que há anos vinha injetando recursos no clube e que, com a SAF, formalizou de vez o controle.

A estrutura recebeu depois um novo investidor de peso: Daniel Vorcaro, então controlador do Banco Master, instituição liquidada pelo Banco Central no mês passado. Vorcaro investiu, por meio do fundo Galo Forte FIP, cerca de R$ 300 milhões para adquirir uma participação relevante na SAF, estimada em aproximadamente 20%.

Seu avanço na estrutura, porém, foi interrompido após a deflagração de investigações da Polícia Federal envolvendo o Master. Em meio à crise, Vorcaro foi destituído do Conselho de Administração da SAF, embora sua participação societária permaneça formalmente no capital.

Desde a criação, os aportes feitos pelos acionistas já superam R$ 1 bilhão, somados ao investimento inicial, sustentando um plano de reequilíbrio financeiro que envolve a Arena MRV, a folha salarial e a reorganização das dívidas.