Negócios
CEO do Fleury: ‘Queremos cuidar mais da saúde e não só da doença’
Executiva aponta medicina preventiva e envelhecimento da população brasileira como oportunidades de crescimento para o grupo.
Com 280 unidades de atendimento, somadas aberturas próprias e aquisições, o Grupo Fleury (FLRY3) enxerga novas oportunidades na área de prevenção de saúde. Por esse motivo, a empresa anunciou em dezembro uma joint venture com o Hospital Israelita Albert Einstein para a criação de uma área de genômica, focada em testes genéticos.
A nova empresa foi batizada de Gênesis e ainda aguarda aprovação do Cade. O Fleury espera que em 2022 seja possível colocar no mercado um portfólio de 300 testes (o maior do país no segmento) para atender demandas das áreas de oncologia, cardiologia, psiquiatria e até pediatria.
Segundo Jeane Tsutsui, CEO do Fleury, o mercado que envolve o segmento da genômica deve atingir R$ 2 bilhões até 2025. Contudo, pode ser alcançado tanto pelo Fleury como pelos concorrentes.
O diferencial, segundo ela, está na equipe por trás do desenvolvimento destes testes, além da visão do grupo de trabalhar cada vez mais no segmento de medicina preventiva. “A nossa visão é cada vez mais cuidar da saúde e não apenas da doença”, aponta Jeane.
Segundo dados da Economatica Brasil, a receita líquida do Fleury no acumulado de 2021 até setembro foi de R$ 2,854 bilhões. Apenas no terceiro trimestre, os exames genéticos do grupo já aportaram R$ 66 milhões.
Em entrevista ao InvestNews, Jeane Tsutsui explica as principais oportunidades de crescimento para 2022, que incluem além da área genômica, o envelhecimento da população brasileira e exclusividade com planos de saúde.
De acordo com dados da Economatica Brasil, desde sua abertura de capital em 2009, as ações do Fleury (FLRY3) já valorizaram 222%. No acumulado de 2021 até 27 de dezembro, os papéis recuavam 32,28%, enquanto o Ibovespa, principal índice da B3, caiu 11,31% no mesmo período.
Esta entrevista faz parte do quadro do InvestNews CEO Responde, que traz cinco perguntas sobre as principais dúvidas do mercado sobre negócios de capital aberto. Confira o que já foi publicado:
- CEO da PDG: após recuperação, cautela é a palavra de ordem
- CEO da Oncoclínicas: troca de liderança levará companhia a um próximo nível
- CEO da Wiz: novos parceiros vão fortalecer receita após saída da Caixa
- CEO da Kepler: Nosso grande desafio é reduzir o déficit de armazenagem agrícola
- CEO da Orizon revela planos de triplicar tamanho da empresa
- CEO da Locaweb: ‘Nosso caixa vai só para aquisições e isso é um privilégio’
InvestNews – Sobre a joint venture com o hospital Albert Einstein para atuar na área genômica: alguns dos principais concorrentes do Grupo Fleury, como Dasa e Hermes Pardini, também olham para esse mercado. Qual será o diferencial da companhia?
Jeane Tsutsui – A área de genômica vem apresentando um desenvolvimento muito grande não apenas no Brasil, mas também em outros mercados, como nos Estados Unidos.
Isso graças ao avanço tecnológico, sequenciamento de próxima geração, que permitiu ao longo do tempo reduzir os custos dos testes, somado ao maior conhecimento da área média em relação a aplicação deste tipo de teste nas diversas áreas da medicina.
No Grupo Fleury nós temos uma área específica de genômica deste 2017, que apresentou nos últimos anos um crescimento de 40% ao ano. Só nos 9 primeiros meses de 2021 o crescimento foi de 50%.
A gente também reuniu um grupo de pesquisadores, cientistas, para fazer o desenvolvimento de novos testes, porque é uma área que envolve muita tecnologia e conhecimento especializado.
Então, olhando daqui para a frente, essa parceria com o Hospital Albert Einstein é uma oportunidade de juntar forças, em termos de equipes que fazem produção científica, equipes que conhecem e são especialistas no desenvolvimento de novos produtos para que a gente possa acelerar essa oferta de soluções integradas na área de genômica.
Quando falamos de um mercado endereçável (toda a população capaz de se tornar cliente ou consumir o produto da empresa; esse mercado é o mesmo para os concorrentes) de R$ 2 bilhões até 2025, nós estamos colocando uma oportunidade de crescimento de uma área nova. Esse mercado é uma estimativa com base do que a gente vê em mercados globais que experimentaram essa evolução na área genômica.
Mas esse mercado endereçável depende de colocar novos produtos, ter um relacionamento médico e ao longo do tempo ter mais credenciamento e incorporação dos exames pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar).
Então é uma jornada, mas com a união de forças com Albert Einstein – que possui uma reputação médica e tem mostrado capacidade de produção científica e de conhecimento ao longo do tempo – é vital para que ocorra a construção do que mencionei.
IN$ – O mercado endereçável para a área genômica é de R$ 2 bilhões até 2025. Desse total, quanto o Fleury ambiciona agregar para a receita? Existe alguma meta?
Jeane Tsutsui – Como uma empresa de capital aberto, nós não damos guidance (projeção) sobre o atingimento da receita futura. Mas apresentamos um mercado endereçável, com um histórico baseado no crescimento deste nos últimos anos.
O ponto que o Fleury enfatiza é o valor dessa nova parceria, porque os exames de genômica são diferenciados e trazem um valor muito grande. Por exemplo, para um paciente que precisa fazer um diagnóstico específico, uma criança com distúrbios de desenvolvimento, um paciente com tumor ou câncer que precisa tomar um medicamento específico.
São aplicações onde a área genômica pode fazer a medicina personalizada. A partir dos resultados dos testes podemos direcionar um tratamento específico, agregando valor para o paciente e para os médicos que conduzem o caso.
Em termos de potencial, estar na fronteira do conhecimento é algo que sempre fez parte da história do Fleury. Faz parte dessa trajetória de diferenciação e da nossa missão de prover soluções cada vez mais complementares para a gestão de saúde e bem-estar das pessoas.
A medicina genômica permite prevenir doenças, porque com base na análise do perfil você consegue avaliar o risco de desenvolvimento de novas doenças e inclusive usar esses dados para fazer melhor gestão da saúde populacional.
IN$ – Falando desse potencial, a parceria nasce com o maior portfólio de testes do país, mais de 300. A genômica envolve diversas áreas, oncologia, cardiologia, psiquiatria. Pode explicar como serão divididos esses testes e quais áreas vão atender?
Jeane Tsutsui – O nosso portfólio de testes é muito diferenciado, foi desenvolvido com equipes de conhecimento técnico, validados por uma avaliação analítica, clínica e certificados por órgãos internacionais.
Cito alguns exemplos de como os testes podem auxiliar em diversas áreas: Antes de uma criança nascer é possível identificar se ela tem alguma doença genética, por meio do teste NIPT Panorama (do inglês, Non-Invasive Prenatal Test), a partir de uma amostra de sangue de uma mão gestante. O teste ajuda a identificar por exemplo o síndrome de Down.
Outro exemplo de aplicação é na área farmacogenômica, para identificar se uma pessoa vai responder melhor a um tratamento ou outro. Muito útil na psiquiatria, no uso de antidepressivos e outros medicamentos. Outras áreas envolvem doenças neurológicas, oncologia, cardiologia. Temos testes para abranger diferentes situações clínicas.
Um aspecto interessante é a visão de prevenção, porque uma coisa é você ter a doença e usar os testes para fazer um diagnóstico e tratamento específico, e outra é fazer uma estratificação do risco, com base em dados familiares. Cada vez mais tem se falado em medicina preventiva para evitar que as pessoas desenvolvam doenças.
A visão do Fleury é cuidar cada vez mais da saúde e não apenas da doença. Isso é fundamental para a sustentabilidade do sistema de saúde e a área genômica facilita isso, com mudanças de hábitos nas pessoas, interferindo em características genéticas e diminuindo o risco de desenvolvimento de doenças.
IN$ – O Fleury tem um projeto de exclusividade com alguns planos de saúde que podem garantir uma receita robusta no 1º trimestre de 2022. Como isso vai funcionar? O elevado nível de desemprego não atrapalha nesta linha de receita?
Jeane Tsutsui – Nós já fechamos alguns contratos comerciais para atender nos próximos cinco anos com exclusividade cerca de 440 mil vidas. Destas, 250 mil vidas são do segmento mais básico. Temos o objetivo de longo prazo de estruturar unidades e serviços para atender cada vez mais o segmento básico, que está crescendo no Brasil.
Então quando olhamos para o começo de 2022, o Fleury já espera que as nossas marcas possam atender esse segmento básico.
Em relação ao desemprego, nós vimos durante a pandemia que saúde se tornou algo muito importante na vida das pessoas. Tanto é que, apesar do desemprego elevado, o número de beneficiários da saúde suplementar aumentou.
No último relatório da ANS, havia 48,6 milhões de beneficiários na saúde suplementar, um aumento de mais de 1 milhão de vidas. Este número a gente não via desde 2016, o que mostra que, embora exista essa preocupação com o desemprego, todo mundo está percebendo (empregadores, funcionários) o valor de ter acesso a saúde suplementar.
Para nós que somos prestadores, para as operadoras de saúde, é uma obrigação buscar soluções sustentáveis para continuar aumentando esse acesso. O Fleury está fazendo, por exemplo, uma integração de jornada de cuidado, por meio da plataforma Saúde D (healthtech), buscando trazer novos produtos para endereçar pessoas que não tem acesso a planos de saúde.
Alguns exemplos são serviços de telemedicina, serviços de cirurgia simples, destinados a um público que não tem acesso a saúde suplementar.
IN$ – De que forma o envelhecimento da população brasileira representa uma oportunidade de crescimento para o Fleury?
Jeane Tsutsui – Essa é uma tendência epidemiológica muito forte. O Brasil é o país que tem a maior taxa de envelhecimento populacional, aproximadamente 17% da nossa população tem 60 anos ou mais. Se olharmos para os próximos anos, esse número vai mais do que duplicar nos próximos 30 anos.
Nesse cenário, temos como consequência o aumento de doenças crônicas, principalmente em pessoas de 65 anos ou mais. Os dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) revelam que 3 em cada 4 indivíduos acima de 60 anos têm alguma doença crônica.
Obviamente um maior número de doenças crônicas demanda mais soluções e atendimento em saúde. Esse envelhecimento populacional já é uma tendência que mostra a importância de termos soluções em saúde.
Outro aspecto é que o envelhecimento traz maior risco de doenças cardiovasculares, oncológicas, e cada vez mais o sistema de saúde brasileiro precisa estar preparado para atender essas pessoas.
Por último, o envelhecimento traz uma questão de qualidade de vida, porque todas as pessoas querem envelhecer bem. Para isso a gestão de saúde é fundamental, é isso que o Fleury faz.
Somos uma empresa de medicina e saúde, que faz cuidados preventivos para manter as pessoas com boa qualidade de vida. Essa é a nossa proposta de valor.
Queremos cada vez mais trazer soluções completas e integradas para a gestão de saúde e bem-estar das pessoas. Pessoas saudáveis contribuem com a sociedade, são mais produtivas, é disso que o Brasil precisa.