O Brasil nunca malhou tanto. Ainda que o entusiasmo com as academias de baixo custo (low cost) tenha diminuído, o mercado fitness continua a crescer bem acima do PIB. De 2019 a 2024, o número de alunos inscritos em estabelecimentos de ginástica cresceu cerca de 50%, de 10 milhões para 15 milhões.
Já a quantidade de academias quase dobrou no mesmo período. O número saltou de 30 mil unidades para 57 mil, segundo o relatório Panorama Setorial Fitness Brasil 2024, da EY. Nesses cinco anos, o faturamento do setor no país saiu de R$ 11,8 bilhões para R$ 17 bilhões anuais, ou seja, um avanço de 44%.
Os especialistas apontam vários fatores para explicar essa demanda crescente: aumento da longevidade, busca de bem-estar e saúde, investimento em autoestima – muitas vezes estimulados pelas redes sociais – e até a chegada de medicamentos mais modernos contra a obesidade, como o Ozempic e o Mounjaro.
Nesse cenário favorável, uma das empresas que vêm ganhando corpo é a SmartFit. A rede conta hoje com 2,3 milhões de usuários em mais de 1,8 mil unidades. E estima que pode alcançar de 5 milhões a 7 milhões de alunos nos próximos anos. Isso, caso a taxa de crescimento dos praticantes em relação ao tamanho da população se mantenha em alta. Hoje está em cerca de 13% nos cálculos do grupo. Mas pode avançar para uma faixa entre 15% a 20% nos próximos anos.
Desde seu IPO, em 2021, a receita da SmartFit vem em crescimento firme. Em 2022, o faturamento da SmartFit subiu 72% ante o ano anterior. No período seguinte, esse resultado avançou 45%. Em 2024, a receita líquida teve uma expansão de 31%. E no primeiro trimestre de 2025, a linha subiu 33% na comparação com janeiro a março do ano anterior.
O sócio-fundador e CEO da SmartFit, Edgard Corona, diz que o impacto dos influencers (infuenciadores) fitness ajuda a manter o interesse pelos treinos. “É muito positivo. Cria uma tendência de desejo, de querer aderir aos programas.”
Para o executivo, isso fica claro quando se olha o crescimento das feiras especializadas do setor mostram esse impacto. “Era inimaginável há cinco anos que um evento como o Arnold Classic tivesse 100 mil pessoas pagando entrada e tirando fotos com os ‘bodybuilders’.”
A versão 2025 do evento atraiu um público de 105 mil visitantes, um crescimento de 5% em relação ao ano passado. A organizadora do evento estimou que o evento tenha gerado R$ 1 bilhão em negócios durante três dias.
Uma das principais concorrentes da SmartFit, a BlueFit, segue toada parecida. Em 2022, o crescimento do faturamento atingiu 92,3%. No ano seguinte, foram mais 47,24%. Em 2024, a rede teve uma receita líquida 26,5% maior. Em termos de estrutra, a BlueFit reúne 176 unidades e 431 mil alunos.
A empresa de benefícios WellHub, ex-Gympass, também tem apresentado um crescimento vertiginoso. O CEO do grupo no Brasil, Ricardo Guerra, projeta para 2025 um crescimento de 50% no número de usuários do serviço que permite o acesso a milhares de academias em todo o país por meio de uma assinatura.
De acordo com o executivo, a expectativa do WellHub é de manter o ritmo de crescimento pelos próximos anos. “Não vemos sinais de desaceleração. Nossa expectativa é continuar a crescer de 40% a 50% por alguns anos. Academia é barato no Brasil, uma mensalidade pode custar menos que um jantar em um restaurante sofisticado”
Diante de uma expansão que se mostra sustentável, o mercado fitness brasileiro tem atraído grandes investidores institucionais. O Mubalada, que pertence ao fundo soberano de Abu Dhabi, adquiriu em setembro de 2023 51% da BlueFit por R$ 464 milhões. Já a SmartFit teve um investimento de R$ 500 milhões da firma de private equity Patria, em 2019, mas que reduziu a participação durante o IPO.
Além do Patria, a maior rede low cost do país conta com investimentos do Canada Pension Plan Investment Board (CPPIB), que detém 12,1% de participação, e do GIC, do fundo soberano de Cingapura, com 8,2%.
Até o astro do futebol Neymar entrou para o mundo fitness brasileiro. Ainda que o negócio não tenha tido divulgação oficial, o jogador do Santos fechou a compra da Ironberg, rede de academias fundada em 2020 com foco no bodybuilding de alto rendimento. O plano seria injetar recursos para expandir a rede para mais de 50 unidades, com investimento potencial de R$ 1 bilhão.
O mais recente investimento de um fundo no mercado fitness ocorreu em meados de maio. O fundo de venture capital Rebels, criado pelo fundador da marca de roupas Reserva, Rony Meisler, adquiriu uma participação da The Simple Gym, rede de academias do Rio de Janeiro inaugurada em agosto de 2024, por valor não divulgado.
“O diferencial da The Simple Gym está em como os dois mundos do ‘wellness’, o da ginástica e o do bem-estar, se encontram nem mesmo lugar˜, diz Meisler. A academia busca combinar oferta de estrutura para treinos de musculação e cardio com práticas como pilates, práticas de consciência corporal e estações de recuperação pós-treinos.
“Apesar de sermos uma rede nova, com menos de um ano, já conseguimos cumprir em menos de três meses nosso planejamento para todo o semestre”, afirma o sócio da rede Gabriel Rodrigues. O executivo explica que a entrada da Rebels vai permitir à The Simple Gym fechar o ano com quatro unidades e mais de 10 mil alunos no fim de 2025.
Atrás do músculo perdido
Além do maior interesse por bem-estar e saúde, uma ajuda inesperada para o mercado de ginástica veio de uma nova geração de medicamentos que nasceu para ajudar no tratamento de diabetes e caiu como uma luva para combater a obesidade. Com resultados expressivos para quem busca emagrecer, a chegada do Ozempic e de concorrentes como o Mounjaro e o Wegovy tem incentivado a mudança de hábitos e, como consequência, a busca por exercícios físicos.
Um relatório da fundação KFF mostra que 6% da população adulta dos EUA faziam uso regular de medicamentos do gênero e 12% já utilizaram em 2024. Isso significa uma base de cerca de 16 milhões que utilizam o Ozempic e similares com frequência e um universo de até 30 milhões de adultos americanos que já aplicaram as substâncias.
Até 2026, o percentual de usuários regulares do Ozempic e similares nos EUA pode subir para 9%. “O fitness vai surfar a onda do Ozempic”, afirma Rodrigues, da The Simple Gym. “É um movimento, na verdade, multifacetado, porque tem impacto em moda, comportamento e até no varejo.”
Os dados mais recentes mostram que em 2023, pela primeira vez em mais de uma década, a taxa de obesidade entre adultos nos EUA caiu, segundo o jornal da associação médica americana (Jama). A queda de 46% para 45,6% coincidiu com a adoção do uso dos medicamentos. Ao mesmo tempo, a taxa de habitantes que passou a frequentar academias subiu três pontos percentuais, para 23% da população do país.
“O Ozempic acabou criando mais mercado”, diz Corona, da SmartFit. “As pessoas pedem peso mas também perdem músculo e a solução é ir para a academia.”
O CEO da SmartFit ressalta que, com a queda da patente do Ozempic no Brasil a partir de julho de 2026, o mercado do medicamento deve aumentar no país. “Todo mundo vai poder fabricar. Então não tenho dúvida que vai acontecer o mesmo fenômeno no Brasil.”
Uma das tendências mais marcantes do mercado fitness brasileiro tem sido a expansão por nichos. O próprio grupo SmartFit concluiu em novembro a aquisição da Velocity, por R$ 163 milhões.
A rede de estúdios é especializada em ‘spinning’. Ou seja, quem entra em uma das 82 unidades vai atrás apenas de pedalar. Nada de pesos e equipamentos de musculação.
O grupo tem investido na diversificação. Além da Velocity, também adquiriu empreendimento em outros nichos, como o Vidya, de yoga, o One Pilates e o Jab House, de boxe.