A região da Faria Lima amanheceu com uma movimentação bastante atípica nesta quinta-feira (28): agentes da Polícia Federal bateram às portas a Reag, uma das maiores gestoras independentes do país, em busca de dados e documentos. O motivo da visita inesperada é uma investigação que apura a suposta infiltração do crime organizado no setor de combustíveis e a possibilidade de que o dinheiro do crime esteja sendo lavado por meio do mercado financeiro.

Ainda de manhã, a Reag divulgou um fato relevante informando ao mercado que era alvo de mandados de busca e apreensão no âmbito da Operação Carbono Oculto – e que a empresa está “colaborando integralmente com as autoridades, fornecendo as informações e documentos solicitados.”

Pessoas próximas à gestora afirmaram ao InvestNews que relatórios de compliance da própria Reag já haviam identificado problemas em fundos. A partir disso, a Reag optou por romper o vínculo — ou seja, renunciar formalmente à gestão de determinados veículos — e, em outros casos, liquidar os fundos, encerrando as operações e devolvendo recursos aos cotistas. Parte desses fundos está hoje entre os investigados pela PF.

Segundo interlocutores, as parcerias com empresas que foram citadas na operação, como no caso da companhia do setor de combustíveis Aster/Copape, também foram desfeitas. Ainda conforme as fontes, as decisões foram tomadas por risco de dano à imagem da gestora. Um potencial envolvimento direto com o crime organizado não foi identificado nesse processo.

É possível dizer que a operação da PF, coordenada com a Receita Federal, não estava sendo exatamente aguardada na Faria Lima, mas o motivo dessa investigação está longe de ser uma surpresa.

Há vários meses, empresários têm expressado publicamente sua preocupação com a presença do crime organizado no setor de postos de combustíveis. Uma das vozes mais ativas nessas denúncias é Rubens Ometto, controlador da Raízen – dona dos postos Shell.

“Eles já têm mais de mil postos e já compraram mais de quatro usinas de etanol”, afirmou Ometto em evento realizado pelo Esfera Brasil em 2024. Em entrevista ao Brazil Journal em março deste ano, Ometto, afirmou que as três grandes distribuidoras (Raízen, Ipiranga e Vibra) já perderam quatro pontos percentuais de market share nos últimos meses na venda de diesel como resultado da concorrência desleal de postos que vendem combustível clandestino e, portanto, mais barato.

Na operação, deflagrada nesta semana, já foram cumpridos mandados de busca e apreensão em cerca de 350 alvos – pessoas físicas e jurídicas – localizados em São Paulo, Espírito Santo, Paraná, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Rio de Janeiro e Santa Catarina.

No alvo

A Reag, um dos alvos da operação que investiga essas denúncias, é a única única gestora listada na B3. Com R$ 299 bilhões sob gestão, ela conta, inclusive, com o selo do Novo Mercado, condição que impõe um rigor ainda maior em termos de governança e transparência. Além de oferecer fundos abertos para investimentos pelas pessoas físicas, a Reag também atua como gestora de patrimônio (wealth management).

A instituição, fundada em 2012 por João Carlos Mansur, é conhecida no mercado pelo perfil agressivo de aquisições, com compras de casas importantes desde o ano passado, entre elas as gestoras Quasar e a Empírica. Na área de wealth, a instituição já comprou escritórios importantes, como a Berkana Investimentos e a Hieron Patrimônio Familiar.

Além da Reag, estão sendo alvo de investigação várias instituições de pagamento e gestoras, entre elas: BK Pagamentos, Bankrow, Trustee Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários, Altinvest Gestão de Administração de Recursos de Terceiros, BFL Administração de Recursos, Banco Genial, Actual Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliário, Ello Gestora de Recursos, Libertas Asset, Banvox Distribuidora de Títulos e Valores, Zeus Fundo de Investimento em Direitos Creditórios, Brazil Special Opportunities e Celebration Fundo de Investimento em Participação Multiestratégia.

No total, foram bloqueados 21 fundos e mais de R$ 1 bilhão. São 255 pessoas jurídicas investigadas.

Segundo a PF, “a investigação identificou um esquema sofisticado que utilizava fundos de investimento para ocultar patrimônio de origem ilícita, com indícios de ligação com facções criminosas.”

“A estrutura criminosa operava por meio de múltiplas camadas societárias e financeiras, nas quais fundos de investimento detinham participação em outros fundos ou empresas. Essa teia complexa dificultava a identificação dos verdadeiros beneficiários e tinha como principal finalidade a blindagem patrimonial e a ocultação da origem dos recursos”, segue a nota.

“Entre as estratégias utilizadas estavam transações simuladas de compra e venda de ativos — como imóveis e títulos — entre empresas do mesmo grupo, sem propósito econômico real.”