A empresa mais lucrativa do planeta, Saudi Aramco (SAR), pode não conseguir superar tão cedo seus próprios recordes, como vinha fazendo. Segundo analistas do setor, a maior petrolífera do mundo deve sentir os efeitos da recente queda do petróleo, assim como seus rivais. Pelo menos três fatores pesam contra uma recuperação do barril no curto e médio prazo: a crise energética na Europa, a alta dos juros e a ameaça de uma recessão global.
A gigante saudita vinha entregando números robustos desde que a invasão na Ucrânia tirou o petróleo de patamares historicamente baixos, chegando ao pico de US$ 120 por barril em meados de março. No segundo trimestre, a Aramco teve o maior lucro ajustado trimestral já reportado por uma empresa de capital aberto, no valor de US$ 48,4 bilhões, alta de 90% frente ao mesmo período do ano anterior.
O resultado da petroleira superou a soma do lucro das três maiores concorrentes do setor no mesmo período: Shell, Exxon (EXXO34) e Chevron (CHVX34) embolsaram, juntas, um volume também recorde, de US$ 47,5 bilhões, segundo dados fornecidos pelo “TradeMap” ao InvestNews. Em seis meses, a Saudi Aramco lucrou cerca de US$ 88 bilhões, cifra nunca alcançada sequer pela Apple (APPL34), única empresa no mundo compatível com a petroleira em valor de mercado.
O primeiro semestre deste ano foi extraordinário para as maiores produtoras de petróleo do mundo, já que a commodity se levantou de um forte tombo: não conseguia se firmar acima de US$ 90 desde 2014, no caso do Brent, que é referência internacional e chegou a ser negociado perto de US$ 20 no início da pandemia da covid-19.
“O setor [de óleo e gás] foi um dos poucos que não se viu prejudicado pelas condições de mercado adversas, com alta inflação, setor financeiro desestabilizado e interrupções em diversas cadeias produtivas, razão da elevada cotação do petróleo”, observa Pedro Rodrigues, sócio-diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), citando o conflito entre Rússia e Ucrânia.
Da mesma forma que a recuperação dos preços do barril favoreceu as grandes petroleiras, assim como a maior busca por petróleo e seus derivados para fins energéticos, Rodrigues avalia que uma queda na cotação da commodity deva levar o resultado dessas mesmas companhias “para o sentido oposto”.
Uma Saudi Aramco vale 23 Petrobras
Em valor de mercado, a petrolífera saudita só ficou atrás da Apple, avaliada em US$ 2,2 trilhões no final de agosto deste ano, segundo dados levantados pelo TradeMap. A petroleira chegou a superar a big tech em tamanho (market cap) por alguns momentos desde que abriu seu capital, em 2019.
A título de comparação, a capitalização da Saudi Aramco equivale a 23,6 vezes o tamanho da brasileira Petrobras (PETR3; PETR4) no mesmo período, quando tinha uma capitalização de mercado de US$ 94,7 bilhões.
A segunda maior petrolífera do mundo, a americana Exxon Mobil, era avaliada em US$ 417 bilhões no final de agosto, o que equivale a um quinto do valor de sua concorrente saudita.
Gigante de controle estatal
A companhia, controlada pelo governo saudita, detentor de 98% de suas ações, levantou US$ 25,6 bilhões no maior IPO da história (oferta pública inicial de ações), em dezembro de 2019. Com o feito, a estreia da maior petroleira na bolsa superou o recorde mundial batido pela chinesa Alibaba, em 2014.
A companhia se tornou o principal motor da economia da Arábia Saudita, responsável por empregar boa parte de sua população e gerar receita para a região. A Arábia Saudita é hoje o principal exportador de petróleo do mundo e mantém como maior cliente a China, país com o qual mantém contratos de longo prazo para fornecer a commodity. Japão, Coreia do Sul e Índia também são grandes compradores.
Para onde vão os preços do petróleo
A Opep e seus aliados liderados pela Rússia (Opep+) concordaram na última segunda-feira (5) com um pequeno corte na produção de petróleo, visando elevar os preços que haviam caído devido aos temores de uma desaceleração econômica. Em outubro, os produtores de petróleo reduzirão a produção em 100 mil barris por dia (bpd), o equivalente a apenas 0,1% da demanda global.
Após a notícia, vista como inesperada pelo mercado, as cotações do petróleo chegaram a subir 3%, mas voltaram a cair no dia seguinte, chegando a ficar abaixo de US$ 90, em meio a temores sobre queda na demanda. A Saudi Aramco reduziu os preços de venda para clientes da Ásia e Europa à medida que a China, maior importadora de petróleo do mundo, vem desacelerando sua atividade, em meio ao lockdown para conter o vírus da covid-19.
Apesar de sinais de queda do consumo em todo o mundo, analistas preveem que a demanda vai superar a oferta no último trimestre deste ano, especialmente se a Rússia reagir a sanções impostas pelo G7, limitando exportações.
“Há fatores de risco para os preços, em especial, a própria guerra e as consequências das sanções à Rússia. Contudo, têm prevalecido os temores de recessão da economia global nos próximos trimestres, à medida que os bancos centrais continuam elevando as taxas de juros para combater pressões inflacionárias, em ambiente no qual há riscos ao fornecimento de combustíveis para a Europa no inverno e a China continua lidando com riscos associados ao setor imobiliário”, escreveu em comunicado Robson Pereira, professor de Economia Eseg.
Segundo Pedro Rodrigues, da CBIE, a elevação dos juros nos Estados Unidos para patamares relativamente altos também colabora para a queda da cotação no mercado internacional. “Recentemente, o preço do barril está caindo diante do aumento dos juros e a expectativa de recessão mundial para combater a inflação”, afirma.
Juros altos, além de provocar queda na demanda de petróleo, também acabam estimulando uma menor produção, já que os ganhos são maiores aplicando o dinheiro dos países produtores da OPEP no mercado financeiro, observa o especialista. Ele cita como exemplo o surgimento dos “petrodólares” na década de 1980. “Portanto, caso os juros continuem se elevando como o atual presidente do FED tem afirmado veremos em 2023 preços do barril bem inferiores aos de 2022”, defende Rodrigues.
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