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Negócios

Marfrig surfa a onda do frango após anos de tentativas

Empresa voltou a lucrar no final do ano passado após sete trimestres no vermelho

O magnata brasileiro da carne Marcos Molina tentou por mais de uma década replicar seu bem-sucedido manual de produtos bovinos no mercado de rápido crescimento do frango. Graças a um momento de sorte e a um plano de recuperação perspicaz, ele parece ter finalmente conseguido.

Desde que a Marfrig de Molina assumiu o controle da rival BRF — dando à produtora de hambúrguer bovino número 1 do mundo a propriedade de um dos principais fornecedores de frango — a companhia de aves teve uma recuperação marcante. A empresa voltou a lucrar no final do ano passado após sete trimestres no vermelho com corte em linhas de produtos de baixo desempenho e aumento da produtividade da fábrica, com as ações tendo o segundo melhor desempenho no Ibovespa neste ano.

A BRF, que está por trás de mais de um em cada quatro frangos exportados do Brasil, está inclusive discutindo pagar dividendos novamente em novembro, após oito anos de seca. As ações da BRF mais que dobraram nos últimos 12 meses, superando a valorização de pares globais como JBS e Tyson Foods. Graças à BRF, a participação de 66% da família Molina na controladora Marfrig agora vale cerca de R$ 8,1 bilhões, ante cerca de R$ 4,2 bilhões há um ano.

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Logo da BRF na fachada da sede brasileira
Logo da BRF na fachada da sede brasileira. REUTERS/Rodolfo Buhrer

“Acredito que existe uma confiança maior no modelo de gestão da BRF com o Molina”, disse Rafael Oliveira, gestor de ações da Kinea Investimentos. “E ele se cercou de boas pessoas, entre elas o Miguel Gularte”, CEO escolhido a dedo. “Se não fosse pela nova gestão, a gente acha que a BRF estaria se beneficiando do ciclo bem menos.”

Ainda assim, é difícil negar que o acordo que coincide com uma melhora notável no mercado global de frango também oferece um vento favorável valioso.

Se o frango não estivesse tendo um desempenho tão bom, “talvez fosse até mais fácil de visualizar o trabalho que ele tem feito dentro da BRF”, disse o analista da XP Leonardo Alencar sobre Gularte. “Não podemos separar uma coisa da outra.”

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Venda da jóias para manter a coroa

A BRF marca um raro sucesso de M&A em frango para a Marfrig de Molina, que foi forçada a abandonar uma série de tentativas anteriores de diversificação em aves sem que os investimentos tivessem a chance de se pagar totalmente. No período de cerca de uma década, a Marfrig comprou e revendeu a produtora de aves do Reino Unido Moy Park, a empresa brasileira de alimentos Seara Foods e a Keystone Foods, sediada nos EUA, conhecida principalmente por seus nuggets de frango.

Observadores do setor dizem que as jogadas abortadas anteriormente em aves ocorreram em um momento em que a indústria parecia perseguir escala a qualquer custo. Cada compra aumentou as crescentes obrigações de dívida da Marfrig, com a empresa nomeada no início da década de 2010 como o frigorífico mais endividado das Américas.

Molina “tomou decisões no passado onde ele teve que vender a jóia da coroa para poder se manter vivo. Mas eu entendo que ele amadureceu bem nesse sentido”, disse o gestor de fundos Oliveira, que detém pouco menos de 100.000 ações da BRF, de acordo com os últimos registros.

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Mais uma chance

Após as tentativas anteriores, Molina ainda queria dar outra chance ao frango. Os menores custos trabalhistas do Brasil, as políticas governamentais pró-exportação e o suprimento abundante de milho dão aos frigoríficos brasileiros uma vantagem estrutural global, conforme observadores do mercado. Ele voltou sua atenção para a BRF, que tinha acabado de superar um escândalo de segurança alimentar em 2017. Em maio de 2021, a Marfrig divulgou a compra de uma participação minoritária na BRF. Grande parte das ações compradas desde então foi adquiridas a preços de pechincha.

No ano seguinte, Molina foi nomeado presidente. Ele logo alçou um alto executivo da Marfrig, Gularte, como o novo CEO da BRF — o sétimo da empresa em cerca de 10 anos. Inicialmente chamado de “o cara da carne” pelos analistas, Gularte introduziu um programa de eficiência com o objetivo de economizar centenas de milhões de dólares por ano, incluindo melhor gerenciamento de estoque para evitar grandes descontos à medida que os produtos se aproximavam de suas datas de validade. A nova administração também expandiu a participação da marca Sadia no mercado halal, garantiu mais licenças de exportação e levantou fundos, incluindo do fundo saudita Salic, agora o segundo acionista.

“Molina trouxe coesão entre o conselho de administração e a diretoria da BRF, hoje há uma clareza de propósito”, disse o membro independente do conselho da BRF Pedro de Camargo Neto. “Se Molina não tivesse entrado, era uma empresa que caminhava para a falência.”

A empresa não quis conceder entrevistas.

Ciclo positivo para o frango

A ascensão global do frango também desempenhou um grande papel nas vitórias recentes da BRF. A carne de aves vem aumentando sua liderança sobre a carne bovina, representando 39% do consumo de proteína em 2023, mostram dados da OCDE. E está a caminho de continuar a ganhar popularidade, graças ao seu menor preço, versatilidade e apelo saudável em comparação com outras carnes. Os baixos custos de ração para frango e a oferta restrita de gado bovino aumentaram ainda mais o abismo entre os dois.

“Estamos em um ciclo muito positivo para o frango, não só no Brasil, mas também nos Estados Unidos”, disse Renata Cabral, analista do Citi. Entre preços mais baixos de grãos, demanda crescente e a velocidade com que um produtor consegue criar e abater um frango, “essa é basicamente a receita para o sucesso”.

A questão agora é para onde a BRF vai a partir daqui.

“Nesses últimos dois anos, a companhia precisava muito se reorganizar e performar. Agora a gente vai prestar mais atenção no crescimento”, disse o CFO Fabio Mariano. “A partir do ano que vem, vamos acelerar o crescimento tanto no Brasil quanto nas exportações. Vamos nos posicionar em mercados onde acreditamos que termos as maiores oportunidades de demanda, analisando os hábitos do consumidor, como no Brasil, Oriente Médio e a própria Arábia Saudita”.

R$ 1 bilhão em economia

A terceira fase do plano de eficiência da empresa, atualmente em elaboração e prevista para o ano que vem, deve trazer mais de R$ 1 bilhão em economia até 2025, disse Gularte em entrevista. A empresa divulgará o balanço do terceiro trimestre em novembro. Analistas estão prevendo um quarto lucro consecutivo, embora os números de 2025 sejam vistos como um pouco menores do que os deste ano.

O caminho do novo CEO é claro, especialmente depois de ter feito isso primeiro na Marfrig: eficiência operacional e foco em exportações, disse Alencar, da XP. “Se ele fizer a mesma coisa na BRF, já tem um roteirinho aí.”

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