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Volvo, Fiat, GM, Mercedes… Cada vez mais montadoras adiam a aposentadoria dos motores a combustão

Momento é de ascensão dos híbridos, que combinam propulsor convencional e elétrico

A onda elétrica passa por um choque de realidade na indústria automotiva. Nos últimos meses, fabricantes globais começaram a anunciar, um após o outro, planos de desacelerar a aposentadoria dos motores a combustão nos próximos anos.

A Toyota puxou a fila no meio de agosto ao deixar claro que vai priorizar veículos híbridos, os modelos combinam propulsão elétrica e a combustão. No caso dos tipos plug-in, que contam com motor elétrico mais parrudo, podem aproveitar o melhor dos dois mundos: rodar com eletricidade e economizar combustível ou usar derivados do petróleo, álcool ou gás natural, quando for necessário. Por exemplo, quando não houver estações de recarga elétrica pelo caminho.

Desde então, uma série de fabricantes começou a rever seus planos. A sueca Volvo, que havia se comprometido a só ter modelos elétricos até 2030, anunciou nesta quarta-feira que não vai ser bem assim. A meta foi abandonada e a fabricante prevê ainda oferecer veículos híbridos depois desse prazo.

Foto: Adobe Stock

A americana Ford também tinha planos de abandonar os motores tradicionais nos próximos seis anos. Já mudou de ideia. A montadora reduziu no mês passado o investimento em veículos elétricos para 30% do orçamento anual, ante 40% quando traçou sua estratégia de zerar emissões. 

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Ao mesmo tempo, a marca americana aumentou a produção de modelos híbridos. Mas a decisão não ocorreu sem consequências. O cancelamento dos planos de produção de um SUV totalmente elétrico, por exemplo, pode custar à empresa US$ 1,9 bilhão.

Outra que também decidiu investir nos híbridos foi a francesa Renault. A fabricante europeia vai produzir no Brasil versões híbridas com tecnologia flex. O CEO global da marca, Fabrice Cambolive, afirmou que a montadora prevê vender um híbrido ou elétrico a cada três veículos da marca no mundo em 2027. Em 2020, a empresa avaliava essa participação em 50%.

A Mercedes-Benz decidiu adiar as metas de eletrificação total em cinco anos. Agora a empresa estima que as vendas de carros híbridos e elétricos respondem juntas por 50% do volume total da marca a partir de 2030. Em 2021, a montadora alemã acreditava que atingiria  o mesmo percentual dentro desse horizonte só com carros 100% elétricos.

Entre as alemãs, a Porsche também abandonou as ambições estabelecidas em 2020. A companhia alegou um impulso menor do que o esperado para modelos elétricos na Europa e na China para desistir oficialmente da antiga meta. O plano original dizia que, até 2030, 80% das vendas viriam de elétricos. Não mais. “A transição levará mais tempo do que presumimos há cinco anos,” disse a Porsche.

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A GM é outra companhia que decidiu voltar a vender veículos híbridos nos EUA, ainda que continue a reafirmar o compromisso com a eletrificação total das linhas no longo prazo. A montadora tinha descontinuado o uso da tecnologia em 2019. Há planos para lançar um modelo movido a bateria e a gás natural nos próximos dois anos.

A fabricante também anunciou na quarta-feira um investimento de R$ 5,5 bilhões em São Paulo para a produção dos primeiros carros híbridos flex da marca no mundo. Há dois modelos em desenvolvimento nesse projeto que vão combinar propulsores flex, ou seja, aceitam tanto gasolina quanto etanol, a elétricos. No Brasil, com uma infraestrutura de recargas de baterias ainda incipiente, os híbridos flex têm sido vistos como uma solução mais realista nos esforços de descarbonização.

Para se ter uma ideia de quanto ainda falta para o segmento provar a viabilidade dos prazos estabelecidos em anos anteriores, basta citar os números da própria GM americana. No maior mercado automotivo do mundo, a comercialização de modelos 100% elétricos representou 3,15% do total de veículos vendidos pela marca no segundo trimestre de 2024. Se for considerada a primeira metade do ano, o percentual cai para 2,97%. 

O grupo Stellantis, que controla as marcas Fiat, Jeep, Peugeot, Citroën e RAM, enxerga nos híbridos flex uma escolha mais adequada ao mercado brasileiro e de outros países do hemisfério Sul, como a Índia. A companhia considera que os mercados emergentes têm uma dificuldade maior no processo de eletrificação da frota.

Desse modo, automóveis que combinam motores a etanol e elétricos podem se tornar uma opção economicamente sustentável nesses territórios, segundo o vice-presidente de assuntos regulatórios da companhia na América do Sul, João Irineu Medeiros.

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A indústria automobilística global tem revisto suas previsões sobre a evolução da demanda por veículos elétricos. O presidente do conselho administrativo do grupo Mercedes, Ola Kälenius, jogou, no início do ano, um balde de água fria nas previsões para o segmento. O executivo afirmou que os carros elétricos vão representar apenas 11% do volume das vendas de veículos na Europa em 2030, enquanto os híbridos teriam 19% do mercado.

O presidente da Toyota, Akio Toyoda, declarou na mesma época também não ver um futuro tão dominante assim para os veículos elétricos. Pelo menos no médio prazo. O executivo estimou uma participação de no máximo 30% do mercado para automóveis com essa tecnologia até 2030.

Após um crescimento acelerado entre 2021 e 2023, o ritmo tem diminuído devido a uma combinação de obstáculos. Faltam modelos “populares”, ou seja, acessíveis à maior parte dos consumidores. Outras questões se relacionam à lenta implantação de infraestrutura de carregamento e ao tempo que leva para reabastecer as baterias – na melhor das hipóteses, meia-hora para uma carga decente. 

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A visão atual contrasta com aquela exibida pela indústria automotiva global há pouco mais de três anos. Era 2021. Ainda sob impacto da pandemia, o setor deu um passo incisivo na busca por zerar a emissão de gases-estufa. Uma após outra, fabricantes como Volvo, GM, Ford, Toyota, Audi, Nissan e outras anunciaram planos de virar de vez a chave para a eletrificação total de suas linhas.

As metas pareciam ousadas. Volvo e Ford, por exemplo, viam 2030 como o ano da aposentadoria dos motores a combustão. GM, Toyota e Audi olhavam um horizonte um pouco mais distante: 2035. Já a Nissan se comprometeu a abandonar os propulsores de combustíveis fósseis até 2050, mas com uma crescente participação dos modelos movidos a energia limpa.    

As decisões tinham como pano de fundo as novas exigências ambientais da União Europeia, mas também a preocupação com a invasão das marcas chinesas. As montadoras do país asiático, como BYD e GWM, passaram a ocupar as lacunas deixadas pelas marcas ocidentais em vários mercados e suprir a crescente demanda internacional por veículos elétricos. 

Mas de lá para cá a maré elétrica começou a mudar. E o que temos é um foco maior nos híbridos, como vimos.

Apesar de parecer um retrocesso, não se trata de um passo atrás. Há uma readequação de metas diante da previsão mais realista sobre o crescimento da demanda por veículos elétricos. Existe ainda uma avaliação de que a tecnologia de veículos híbridos pode atender objetivos de descarbonização no médio prazo, principalmente se combinada a biocombustíveis.

A Stellantis, por exemplo, afirma que carros a etanol podem descarbonizar tanto quanto os elétricos. Nas contas da companhia, com uso da tecnologia híbrida, os modelos podem ser até mais limpos em termos de emissão de CO2.

É que o processo de fabricação de baterias tem alto impacto ambiental, já que a extração de minerais como lítio e níquel deixa uma grande pegada de carbono. Como as baterias dos carros 100% elétricos é maior que a dos híbridos, a conta de gases-estufa emitidos na produção deles fica mais alta.

Os cálculos também levam em conta o fato de que o uso do etanol traz uma forte redução de emissões comparada à queima de gasolina, claro.

50 anos depois do Proálcool, o combustível renovável talvez esteja prestes a viver o seu melhor momento.

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