O TikTok está em uma corrida contra o tempo. E para a chinesa ByteDance, dona da rede social, o Brasil virou um dos principais troféus a ser conquistado. O prêmio em jogo é um mercado que pode movimentar R$ 39 bilhões ao ano por aqui, de acordo com uma análise do Santander.

Em dólares, são US$ 6,7 bilhões. Dá mais de dois terços do que a ByteDance vende no seu e-commerce americano (US$ 9 bi em 2024). A empresa deve perder esse fluxo de dinheiro com a derrota no xadrez geopolítico – uma lei aprovada em janeiro de 2025 pelo Congresso dos EUA obrigou o grupo a vender a operação do TikTok nos EUA. Donald Trump concedeu um adiamento dessa exigência no início do ano, mas o prazo termina no dia 5 abril.

Com a eventual saída dos EUA, a ByteDance decidiu pisar mais fundo no acelerador da expansão internacional de sua plataforma de vendas de produtos. Para manter a receita sem os dólares dos americanos, o controlador da rede social de vídeos decidiu ampliar a atuação para seis países, incluindo o Brasil.

A toque de caixa, a TikTok Shop chega ao país entre fim de abril e início de maio, conforme informações do portal chinês Dao Insights. Quase um ano antes das previsões mais otimistas do mercado.

Nos planos da ByteDance, já haveria até uma data limite: a ideia é começar as operações a tempo de aproveitar o Dia das Mães. A comemoração, uma das principais janelas de vendas no ano para o comércio doméstico, vai cair no domingo, dia 11 de maio.

Além do Brasil, o conglomerado chinês planeja realizar inaugurações em série da TikTok Shop ainda no primeiro semestre. Mais quatro países devem receber a operação: Alemanha, Itália, França e Japão. Os novos mercados vão se juntar ao México, que ganhou sua TikTok Shop no início de fevereiro, além de Espanha, Irlanda, Indonésia e Tailândia.

No caso da operação local, o Santander estimou, em relatório, que a TikTok Shop possa representar entre 5% e 9% do e-commerce daqui nos primeiros três anos de operação. Isso significaria alcançar a segunda posição no ranking de maiores plataformas até 2028, atrás apenas do Mercado Livre, que tem uma participação de 12,4%, segundo dados da Conversion em janeiro.

Se a previsão se tornar realidade, a fatia representaria um faturamento entre R$ 12 bilhões e R$ 21 bilhões por ano, baseado na estimativa de receitas totais do setor para 2025 feita pela Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm). Em 2024, o e-commerce brasileiro registrou um faturamento de R$ 204,3 bilhões, com crescimento anual de 10,5%. A ABComm projeta um avanço de 15% neste ano para R$ 234,9 bilhões.

O Santander pondera ainda que TikTok Shop pode movimentar R$ 39 bilhões ao ano quando estiver plenamente estabelecido. Isso significa que só o Brasil já ajudaria a compensar dois terços – ou US$ 6,7 bilhões – das vendas potencialmente perdidas no mercado americano.

Os analistas do banco Ruben Couto, Eric Huang e Vitor Fuziharo classificam ainda como “potencialmente disruptiva” a chegada da TikTok Shop ao país. O trio destaca a combinação de entretenimento e comércio como uma tendência no setor.

A própria companhia define seu modelo como um e-commerce de conteúdo. Mu Qing, vice-presidente de comércio eletrônico internacional da TikTok Shop, afirmou em conferência internacional no fim de fevereiro, que “o ponto-chave e básico do crescimento empresarial está no conteúdo”

O modelo que mais se aproxima da nova plataforma é o Instagram Shopping, que permite aos usuários adquirir produtos vistos em publicações no feed ou nos stories. Sofia Hernandez, Diretora Global de Marketing Empresarial do TikTok, destacou em artigo no site da marca o “potencial infinito” de se criar histórias no TikTok. “Este ano as marcas e os criadores se unirão para continuar a moldar a cultura, gerar novas ideias e acelerar o crescimento dos negócios.”

A TikTok Shop prevê várias formas de associar conteúdo, tendências e comércio. Um estudo da própria companhia dentro de sua base mostra que 81% dos usuários dizem que o TikTok os ajuda a descobrir novos tópicos e tendências dos quais não sabiam que gostavam.

Essa mudança de comportamento de consumo se consolida, principalmente entre os mais jovens. Enquanto nas plataformas tradicionais de comércio eletrônico os usuários precisam buscar de maneira ativa produtos específicos, no TikTok as ofertas aparecem de maneira orgânica no feed, com ajuda do próprio algoritmo que analisa o comportamento do usuário.

O formato permite ao público fazer compras sem sair do aplicativo. Os criadores, por exemplo, podem promover produtos em vídeos e transmissões ao vivo, nas quais os usuário podem clicar em links ou ícones direcionados para a página da marca.

Os tiktokers também podem adquirir produtos e serviços diretamente da conta de um vendedor ou criador. Há ainda espaços como vitrines virtuais. Essas compras podem ser feitas por meio das carteiras digitais, como o Apple Pay e o Google Pay, com um clique ou uso de biometria.

Os analistas do Santander citam, especificamente, Natura, Renner, C&A, Mercado Livre e Magazine Luiza como “as marcas mais bem posicionadas para se beneficiar da plataforma”.

No Brasil, as vendas por meio de todas as redes sociais atingiram em 2023 a cifra de R$ 100 bilhões, conforme estudo da ABComm. O valor já representa metade do faturamento do setor em 2024.

A experiência no México deve balizar a implantação da loja brasileira. No exterior, a TikTok Shop isentou de comissões os vendedores nos primeiros 90 dias para estimular a adesão, além de oferecer bonificações para quem completar campanhas.

O primeiro mês da operação mexicana mostrou ainda que alguns criadores chegaram a gerar mais de US$ 7 mil em vendas poucos dias após o lançamento. Os analistas revelaram que desde março, o TikTok passou a permitir que vendedores se registrem como pessoa física, usando documentos pessoais, como título de eleitor, RG, CNH e passaporte. Até então era necessário um registro formal de empresa para operar na plataforma.

Os autores do estudo sinalizam ver a medida como uma preparação para o início das operações do novo ambiente, que será mais robusto e vai permitir uma experiência mais rápida e interativa de compra aos usuários. A Dao Insights disse também que a empresa tem convidado vendedores locais a se juntar a plataforma antes da abertura.

Os analistas do Santander enfatizam ainda a necessidade de as próprias marcas brasileiras correrem para ajustar as estratégias na nova plataforma. A experiência mexicana sinaliza “urgência de os varejistas desenvolverem estratégias específicas para a plataforma antes na chegada da TikTok Shop”.