Abaixo, veja as últimas mudanças feitas por cada país do bloco europeu e o que isso significa para quem planeja obter a cidadania europeia.
Restrição dos “passaportes dourados”
Na Europa, há uma tendência crescente de restrição aos programas de cidadania por investimento, também conhecido como golden visa, ou de programas de residência que garantem a cidadania em pouco tempo sem necessariamente a pessoa criar um vínculo com o país.
Relatórios do Parlamento Europeu destacam que esses esquemas podem comprometer a integridade da cidadania da União Europeia, gerando riscos de segurança, lavagem de dinheiro e evasão fiscal.
Em 2025, o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) decidiu que o programa de cidadania por investimento de Malta violava o direito da UE, por permitir a concessão da cidadania europeia sem um vínculo genuíno com o Estado-membro. A decisão não extingue automaticamente o programa, mas obriga o país a rever suas regras, podendo levar à sua suspensão ou extinção futura.
Como consequência, diversos Estados-membros têm revisado ou encerrado seus chamados “programas dourados”, e a tendência regulatória é de maior investigação e limitação dessas práticas.
Itália: limitação por gerações
Na Itália, as mudanças são significativas. Até recentemente, a cidadania italiana por descendência (jus sanguinis) permitia que uma pessoa com antepassado italiano — nascido após a unificação da Itália (17/3/1861) — solicitasse a cidadania, sem limitação clara de número de gerações.
Em março de 2025, o Decreto‑Legge 36/2025, aprovado pelo Conselho de Ministros da Itália, introduziu mudanças ao regime de cidadania. Posteriormente, essas disposições foram incorporadas pela Lei n.º 74/2025, publicada em maio de 2025. Em resumo:
- O reconhecimento automático da cidadania italiana por descendência para pessoas nascidas no exterior agora exige, como regra geral, que pelo menos um pai ou avô nascido na Itália seja cidadão italiano e que esse vínculo seja efetivo;
- Solicitantes nascidos no exterior que já possuam outra cidadania, em regra, não são considerados automaticamente cidadãos italianos a partir de sua filiação, a menos que cumpram condições adicionais, como, por exemplo, que o pai tenha residido legalmente na Itália por pelo menos dois anos antes do nascimento ou adoção do filho;
- A regra antiga continua valendo para aqueles que tinham pedido protocolado, processo judicial iniciado ou agendamento consular realizado até 27 de março de 2025.
Assim, se você é descendente de italiano, mas está além da geração de netos ou seu ascendente (pai/avô), não nasceu nem residiu legalmente na Itália por ao menos dois anos antes de seu nascimento, o reconhecimento automático da cidadania pode não estar mais garantido.
Portugal: novos prazos
Em Portugal, o regime de naturalização por residência foi significativamente reformado. Até agora, o pedido de cidadania por naturalização era possível após 5 anos de residência legal. Porém, em 28 de outubro de 2025, o Parlamento aprovou a nova Lei da Nacionalidade, que eleva esses prazos para 10 anos para a maioria dos estrangeiros e 7 anos para cidadãos de países de língua portuguesa, como o Brasil.
Entre as outras mudanças aprovadas estão as seguintes:
- O prazo de residência começa a contar a partir da emissão do primeiro título de residência legal, e não apenas da data de solicitação do processo;
- Exigência de conhecimento aprofundado da língua portuguesa, da cultura e da organização política portuguesa, e de adesão solene aos princípios fundamentais do Estado de direito democrático;
- A nova lei também estabelece que filhos de estrangeiros nascidos em Portugal só poderão obter a nacionalidade se um dos pais tiver residência legal por, pelo menos, 3 anos;
- A possibilidade de revogação da cidadania para naturalizados (em determinados casos, por crimes graves) foi incluída no texto aprovado.
A lei foi aprovada no Parlamento, mas sua entrada em vigor, data de validade e efeitos sobre processos pendentes ainda dependem da publicação oficial no Diário da República e da promulgação pelo Presidente da República, bem como eventual fiscalização de constitucionalidade.
Assim, se você planeja se naturalizar em Portugal, vale acompanhar de perto a publicação oficial da lei, sua data de vigência e os efeitos sobre processos pendentes.
Espanha: fim da “Lei da Memória”
Na Espanha, uma das rotas de cidadania mais divulgadas era a prevista pela Ley 20/2022 de Memoria Democrática, que permitia que descendentes de espanhóis exilados ou de mulheres espanholas que perderam a nacionalidade durante o franquismo solicitassem a nacionalidade sem cumprir o tempo normal de residência.
Entretanto, o prazo para iniciar novas solicitações por essa via terminou no dia 22 de outubro de 2025. Quem já tinha atendimento agendado ou comprovante de solicitação emitido até essa data ainda pode prosseguir com o processo.
Para quem tinha essa via em mente, o prazo está encerrado. A alternativa agora passa a ser aplicar pelos canais ordinários de naturalização ou residência (geralmente 10 anos de residência, entre outras condições) ou outras modalidades específicas de origem ibero-americana.
Alemanha: reformas de naturalização
Na Alemanha, houve avanços na política de naturalização, mas o tema continua politicamente sensível. A reforma aprovada em junho de 2024 reduziu o tempo mínimo de residência exigido de oito para cinco anos (ou três anos em casos de integração excepcional) e autorizou a dupla cidadania para a maioria dos naturalizados, o que antes era restrito.
Contudo, em 2025, o debate político se voltou a propostas de restringir fluxos migratórios, endurecer critérios para reagrupamento familiar e elevar exigências de renda mínima para algumas categorias de imigrantes.
Assim, quem planeja solicitar a cidadania alemã deve verificar as regras em vigor no momento do pedido, já que ajustes adicionais — especialmente nas exigências de integração e comprovação de sustento — ainda podem ainda passar por novos ajustes, especialmente nas exigências de integração e comprovação de sustento.
Irlanda e França: regimes mais estáveis
Já em países como Irlanda e França, as vias tradicionais continuam predominando e com poucas alterações estruturais:
- Irlanda: o registro de cidadania por descendência (Foreign Births Register) segue disponível para filhos e netos de cidadãos irlandeses nascidos fora do país. O processo permanece altamente burocrático, mas sem mudanças substanciais nas regras;
- França: mantém a naturalização por residência (geralmente após 5 anos), exigindo comprovação de integração linguística, social e cultural, e sem alterações significativas desde a reforma de 2022.
Nos dois países, as mudanças recentes têm sido administrativas, como a digitalização dos serviços e redução de prazos de processamento, sem revisões de mérito das leis de cidadania.
Cidadania por investimento em xeque
A via de “residência + investimento” ou de compra direta da cidadania vem sendo progressivamente eliminada na União Europeia. Pressões da Comissão Europeia e decisões do Tribunal de Justiça da UE levaram países como Malta e Chipre a suspenderem seus programas de cidadania por investimento.
Outros países, como Portugal, Grécia e Espanha, mantêm apenas modalidades de residência por investimento, que não garantem naturalização automática e estão sob crescente análise. Para quem buscava “comprar” um passaporte europeu, o cenário atual é de elevado risco regulatório e crescente incerteza jurídica.
Planejamento é essencial para obter a cidadania europeia
O caminho para a cidadania europeia está cada vez mais complexo. Há rotas consolidadas, como a descendência e naturalização por residência, e outras em transição ou extinção, como os programas de investimento.
Antes de tomar decisões (comprar imóvel, investir com o propósito de obter um passaporte ou iniciar processos consulares), é fundamental consultar fontes oficiais e acompanhar alterações legislativas. Para investidores e famílias que planejam migrar e obter a cidadania europeia, a tendência regulatória da UE é de maior cautela, transparência e rigor na concessão da cidadania.