Uma lenta transformação está em curso no mercado corporativo para reverter a sub-representação da população negra nesse espaço. Diversos estudos e pesquisas já escancaram a realidade das desigualdades de gênero e raça, com ausências gritantes de pessoas negras e/ou mulheres em postos-chave. Os números sobre essas lacunas pressionam as ações em conjunto à importância crescente da agenda ESG, que abrange práticas de responsabilidade social. Torna-se ainda mais urgente, nesse contexto, a efetiva promoção de mudanças.
Os avanços pontuais e relevantes ainda são passos tímidos diante da gigante necessidade de transformações coletivas, mas se constituem em balizas importantes para as mudanças precisam acontecer. No final de abril deste ano, as empresas que compõem o Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU) estabeleceram um desses marcos. A escolha de Rachel Maia, CEO da RM Consulting, como a nova presidente do conselho, primeira mulher negra nesse cargo, é uma dessas balizas.
A nova presidente exemplifica bem o cenário atual em declaração à revista Exame: “O Pacto Global da ONU no Brasil tem uma mensagem séria de que todo o setor privado tem que se envolver de forma efetiva nas questões ESG. Há anos isto acontece e eu me envolvo ao engajar empresas para serem signatárias. Agora, busco reforçar, como presidente do conselho, a importância de se ter responsabilidade estratégica”.
Vale lembrar que, em 2022, o Pacto Global da ONU divulgou a continuidade da iniciativa Ambição 2030, com objetivos ambiciosos, entre eles atingir mais de 1.500 empresas, capacitar mais de 200 mil pessoas negras em soft e hard skills e ter 15 mil pessoas negras em cargos de liderança até 2030. São metas gerais como essas que serão geridas pelo novo conselho, formado por maioria de mulheres.
No final de abril recebemos a ótima notícia da promoção de Alexandre Moysés Nascimento para a Diretoria de Governança da B3, a bolsa do Brasil, espaço em que também é o Sponsor do Núcleo de Diversidade com Foco em Raça e Etnia. Pessoalmente, compartilho minha experiência positiva com a B3, como um dos 30 alunos de um programa de formação para ampliar a presença de negros em conselhos empresariais, cargos decisórios, uma ação de promoção de equidade e inclusão racial em espaços de lideranças.
Num país em que a maioria das companhias possui menos de 11% de negros em funções executivas, como presidência e diretorias, precisamos de mais iniciativas como essas para fortalecer coletivamente a nossa presença. Esse programa da B3 que contribuiu com minha formação é resultado do trabalho de sponsor do Alexandre Moysés, então sua chegada à Diretoria foi celebrada também como conquista coletiva, coroando seus esforços pioneiros.
A indicação de Ailton Aquino dos Santos, servidor de carreira do Banco do Central há mais de 25 anos, para a Diretoria de Fiscalização, em 08 de maio, é outro importante avanço pioneiro. O BC nunca teve uma cadeira de diretoria ocupada por uma pessoa negra, desde sua criação em 1964. Demorou muito! Mesmo lamentando essa lentidão, reforçamos a notícia positiva com a crença de que essa presença no topo da vida financeira do país promete fazer diferença. O nome de Ailton Aquino ainda precisa ser aprovado pelo Senado Federal, estamos em boa expectativa.
É nesse cenário que aconteceu o Seminário “Empoderamento Negro para Transformação da Economia”, uma realização do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e Open Society Foundations, que ocorreu no dia 23 de maio. Presencialmente o evento foi exclusivo para quem recebeu convites, mas ainda pode ser assistido no Youtube do Banco Nacional de Desenvolvimento.
O BNDES abriu portas para discutir sobre os impactos positivos, na economia, da diversidade étnico- racial, após 70 anos de silenciamento sobre a pauta. Além disso, contamos com a presença de especialistas nacionais e internacionais propondo e discutindo formas de tornar a área empresarial e financeira do Brasil diversa e inclusiva com o painel “Capital a Serviço da Diversidade – Experiência no Setor Financeiro”.
Esse é um debate que urge e as ações estão precisam ser tomadas, já que estamos em uma conjuntura política mais favorável, com novidades positivas em setores estratégicos, em que homens e mulheres negros com capacitação, trajetórias brilhantes, condições concretas de usarem as oportunidades para fazer da diversidade e da inclusão um grande ativo.
É fundamental ressaltar que justiça racial, social e de gênero não são favores, compensações ou reparações apenas para as populações vulnerabilizadas, que tenham presenças cerceadas em governos, mercados, empresas. A equidade é um ativo para toda a sociedade, a diversidade traz riquezas, a diferença produz mais e melhores ideias, debates e ajustes em que toda a sociedade ganha. Seguimos em busca da garantia de espaços para as potências humanas que podem alavancar o desenvolvimento desse país.
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