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Tecnologia

Carro elétrico: a vida útil da bateria corrói mesmo o valor de revenda?

Sim, EVs usados estão desvalorizando bem mais rápido do que modelos a combustão lá fora. Mas há outras razões

Qualquer pessoa que pense em comprar um carro novo ao menos considera a ideia de levar um elétrico para casa. E cada vez mais gente tem feito isso. O BYD Dolphin, EV mais bem sucedido no Brasil até aqui, vendeu 1.807 unidades em fevereiro. O elétrico chinês foi o 33º carro mais comercializado no mês. Não é pouco: isso o coloca logo atrás do Toyota Yaris, e à frente de Honda City e Fiat Cronos, Peugeot 208 – carros a combustão bem conhecidos.

A performance dos elétricos no mercado, de qualquer forma, talvez pudesse ser melhor não fosse um receio do consumidor: o valor de revenda.

Um celular vira tijolo quando a bateria arria, certo? Bom, a bateria reponde por mais ou menos 60% do valor de um EV novo, a depender do modelo. Para um elétrico de R$ 200 mil, seriam R$ 120 mil. Com a desvalorização natural de um carro usado, então, seria questão de pouco tempo para que uma eventual troca de bateria lá na frente, para manter o carro andando, simplesmente não valha a pena. Seria melhor colocar um pouco mais de dinheiro e pegar um novo de uma vez.

Isso gera uma complicação óbvia no quesito preço de revenda – a demanda por EVs usados seria sempre menor que a oferta, jogando os preços para baixo. E de fato: a desvalorização dos elétricos “antigos” nos mercados mais maduros, que já lidam com uma relativa massificação dos EVs há mais de uma década, tem sido significativamente maior que a dos carros a combustão.

Só que tem um pulo do gato aí. Não é bem por conta da vida útil da bateria. Como vamos ver agora.

O mercado americano de EVs usados

Nos EUA, a desvalorização média dos elétricos com pelo menos três anos de uso foi de 29,5% entre setembro de 2022 e setembro de 2023. Muito mais que a dos modelos a combustão, que recuaram apenas 4,8% no mesmo recorte. Os dados são da Edmunds, uma respeitada plataforma de dados de vendas de carros. 

As maiores quedas foram justamente nos dois modelos mais vendidos nos EUA, o SUV Tesla Model Y (-40%) e o sedan Tesla Model 3 (-36,3%). Mas há uma razão de mercado por trás disso.

No primeiro semestre de 2023, Elon Musk reduziu em até 30% o preço dos modelos novos de sua montadora – aí é automático: caiu o preço do novo, o do usado vai junto. Foi um esforço para fazer frente à concorrência, já que há muito tempo a Tesla deixou de ser monopolista no mundo dos elétricos.

Carro elétrico recarregando bateria

Mesmo assim, o domínio dela ainda é grande: 55% de todos os elétricos vendidos nos EUA são da montadora de Elon. E as decisões que saem de lá têm o impacto de um terremoto para o mercado, como ressalta por J.R. Coporal, CEO da Auto Avaliar – uma concessionária com 4.200 unidades no Brasil focada no mercado B2B e que fatura US$ 1,4 bi anuais.

“Quando o mercado é tão dominado pela Tesla, como acontece na Europa e nos EUA, se o Musk acordar e decidir baixar o valor dos carros, ele faz o mercado todo despencar. E ele já fez isso”.

J.R. COPORAL, CEO DA AUTO AVALIAR

Não é só a Tesla, nem apenas EUA e Europa. A concorrência entre montadoras tem reduzido preços mundo afora, Brasil incluído. Até outro dia, os elétricos mais baratos por aqui custavam perto de R$ 200 mil. Agora, o elétrico mais em conta é o Dolphin Mini, lançado em fevereiro de 2024 por R$ 115 mil – preço baixo para um elétrico de última geração, com mais tecnologia embarcada que os de um, dois anos atrás.

Essa evolução rápida dos elétricos zero km, aliada à guerra global de preços, mina o preços dos usados. Não tem jeito.

Ainda assim, fica a pergunta:

Mas e a bateria?

A boa notícia é que um carro elétrico não é um celular gigante. Suas baterias duram bem mais. Via de regra, retêm entre 80% e 85% da capacidade após oito ou dez anos de uso – daí a garantia média nos EUA, e a da BYD por aqui, ser de oito anos para as baterias.

“Dá para dizer que as elas chegam a 12 anos. E isso não quer que a bateria vai parar de funcionar – só que a autonomia passa a ser risível”, diz o jornalista automotivo Henrique Rodriguez, editor da revista Quatro Rodas.

12 anos pode não ser tanto tempo no mundo dos carros a combustão – os mais bem conservados mantém um bom valor de revenda após um intervalo assim. Logo, há algum efeito da durabilidade das baterias nos preços dos elétricos usados.

Por outro lado, 12 anos é um intervalo razoável na escala dos avanços tecnológicos. O preço das baterias dos carros elétricos caiu 90% nos últimos 10 anos. É improvável que isso repita, ao menos com tal intensidade – a última década basicamente marcou o nascimento dessa indústria. Mas a tendência é haver baterias mais em conta lá na frente para quem cogitar uma reposição. Outra tendência é que saia mais simples e barato fazer reparos que melhorem a vida útil. Com isso, os EVs usados poderão desvalorizar menos.

Tem mais: a chinesa CATL, maior fabricante de baterias do mundo, anunciou nesta quinta (28) uma bateria que mantenha 85% da capacidade por 15 anos – o que permitiria aos fabricantes estender a garantia de novos modelos para esse intervalo de tempo.

Eles também anunciaram que essa nova bateria suporta mil ciclos de recarga sem perda alguma. Para quem carrega o elétrico duas vezes por semana, isso significa 9,6 anos de bateria zerada.

Nesse ritmo, talvez não demore a chegar o dia em que elétricos usados terão mais valor de revenda do que seus pares com escapamento.

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