Em Warwick, em Rhode Island, Chris Ciunci vendeu mais de 800 ações da Nike. Em Wichita, no Kansas, Ken Wagnon comprou na baixa. Nos arredores de Denver, Doug Johnson analisou seu portfólio e voltou a pesquisar opções de férias em família.
Os planos tarifários do presidente Trump, a pausa repentina e a crescente guerra comercial com a China transformaram o mercado em uma montanha-russa. Nos últimos dias, os mercados de ações dos EUA perderam impressionantes US$ 7,7 trilhões, depois subiram acentuadamente antes de recuar novamente na quinta-feira (10).
Uma forte venda de títulos do Tesouro de longo prazo alarmou especialmente analistas e investidores, porque os títulos do governo são, em geral, um refúgio para os investimentos em tempos de turbulência.
Investidores querem garantias
A turbulência abalou os maiores investidores individuais do mercado: os americanos ricos. Os consultores financeiros que atendem clientes ricos dizem que foram bombardeados por ligações de investidores na semana passada, situação que lembrou tumultos como a crise financeira de 2008-09 e o início da pandemia de Covid-19 em março de 2020. Os clientes procuram garantias ou desejam seguir o manual em diferentes cenários de tarifas e mercados.
Rich Scarinci, da Partners Capital, com sede em Boston, que assessora famílias ricas com pelo menos US$ 100 milhões de investimentos, disse que muitas conversas com os clientes giram em torno da mesma pergunta: ‘o excepcionalismo americano acabou?’.
Milionários americanos preocupados
Por mais de uma década, as ações dos EUA, e particularmente as ações de rápido crescimento das maiores empresas públicas dos EUA, apresentaram desempenho superior para investidores em todo o mundo, com a economia da Europa ficando para trás e o crescimento da China desacelerando.
Scarinci começou a questionar o quão dominante esse tema continuará sendo, caso a globalização desacelere e as barreiras para atrair talentos para os EUA aumentem.
“Essa ordem mundial está sendo questionada e deve haver alguma substituição daqui para frente. Essa é, sem dúvida, a questão número um na cabeça dos investidores, incluindo [indivíduos] e famílias com patrimônio líquido ultra-alto”, disse Scarinci.
Monica DiCenso, chefe do grupo de oportunidades de investimento global do banco privado JPMorgan, disse que algumas das famílias com as quais ela e sua equipe trabalham estão perguntando sobre opções como adicionar alguma exposição à Europa, Japão ou a moedas estrangeiras para diversificar ainda mais seus portfólios.
“As pessoas estão dizendo: ‘Não tenho certeza se os EUA serão o melhor lugar’” para ter uma exposição descomunal em longo prazo, disse ela, uma mudança radical em relação aos anos anteriores. DiCenso, que normalmente aconselha famílias com patrimônio de pelo menos US$ 250 milhões, tem dito aos clientes que é hora de considerar oportunidades como a renda fixa.
Ciunci, o investidor de Rhode Island, se considera um investidor de longo prazo que geralmente ignora as manchetes.
Mas o empreendedor, que vendeu uma empresa de marketing há vários anos, sentiu que o regime tarifário de Trump foi uma mudança fundamental no relacionamento dos Estados Unidos com o resto do mundo. Ele está preocupado com a inflação mais alta e o crescimento estagnado nos EUA, ambiente em que poucos portfólios se saem bem.
Redução de risco
Ciunci vendeu cerca de um décimo de seu portfólio para reduzir o risco. Ele se desfez de 15 ações que achava que seriam prejudicadas por tarifas mais altas, incluindo a Nike e a fabricante de ferramentas de semicondutores Applied Materials, e vendeu um ETF iShares, ou cesta de ações, que investe em empresas de software norte-americanas. Colocou o dinheiro em uma conta do mercado monetário, argumentando que pelo menos uma parte de sua carteira estaria protegida de oscilações bruscas.
Ciunci não espera que os EUA percam seu lugar no mundo, mas disse que está considerando investir parte do dinheiro em mercados fora dos EUA para diversificar ainda mais.
“Antes, eu confiava no mecanismo da economia dos EUA, na estrutura. Agora, sinto que meu portfólio está nas mãos de um indivíduo, quer eu o apoie ou não”, disse Ciunci, de 51 anos, referindo-se a Trump. Ele se referiu melancolicamente a quando os mercados de ações se moviam com a divulgação de indicadores como o relatórios de empregos. “Eram coisas menores em comparação com o que aconteceu”, disse ele.
As reações individuais à turbulência do mercado são moldadas pela tolerância ao risco, dinheiro em caixa e visões políticas, disseram consultores de patrimônio.
Patrimônio blindado pela diversificação
Alguns investidores com grandes volumes de dinheiro fora dos mercados de ações estavam ignorando a turbulência e observando que o S&P 500 ainda estava com alguns ganhos de 2023 e 2024, sua melhor sequência de dois anos em um quarto de século, até o fechamento de terça-feira (8).
Doug Johnson, de 53 anos, ex-corretor da bolsa e banqueiro privado que agora administra o dinheiro de sua família na região de Denver, disse que ele e sua esposa, Jennifer, não tocaram em seu portfólio e estão analisando planos de viagem de verão com seus filhos.
“O que está acontecendo no mundo realmente não nos impactou”, disse ele — algo que ele atribuiu à natureza diversificada de seu portfólio e seu trabalho para uma rede de pessoas ricas chamada Tiger 21, que gerencia portfólios de investimento.
Ainda assim, ele está procurando oportunidades em casa e no exterior, em ações americanas agora mais baratas, além de títulos de governos estrangeiros e ações globais. “Ainda estamos centrados nos EUA porque os EUA têm a maior liquidez, têm o estado de direito e porque vivemos aqui. Mas realmente temos de diversificar as oportunidades para preservarmos a riqueza”, disse Johnson.
Oportunidade de compra
A UBS tem pedido a seus clientes mais ricos que continuem perseverando: desde 1945, nas 12 ocasiões em que o S&P 500 caiu 20% em relação ao seu pico, o índice nos cinco anos seguintes registrou ganhos em 100% das vezes. O retorno médio: quase 53%.
Ken Wagnon vê a turbulência do mercado como oportunidade de compra.
Wagnon, de 86 anos, franqueado aposentado da Pizza Hut que nos últimos anos vendeu seu avião e várias casas de veraneio, sentiu seu ânimo melhorar na semana passada ao assistir Trump revelar na televisão a lista de países que aos quais os EUA impunham tarifas. “Eu sabia que seria uma longa lista, mas fiquei agradavelmente surpreso quando vi a extensão, porque isso é uma indicação de quão grande será o impacto”, disse Wagnon, três vezes eleitor de Trump.
Na manhã seguinte, sem se deixar abater pela situação dos mercados, ele ligou para seu corretor Charles Schwab e fez um pedido de compra de várias ações de empresas americanas que detém há décadas. Ele não quis identificar as ações, mas as descreveu como uma mistura que inclui bens de consumo duráveis e empresas de tecnologia. E comprou mais algumas.
“O mercado de ações reage exageradamente”, disse Wagnon, que se considera um investidor de longo prazo que analisa o desempenho de seu portfólio ao longo de anos, não meses ou semanas. “A única coisa que aconteceu com o mercado de ações foi que tivemos uma oportunidade muito boa de comprar.”
Wagnon disse que acha que a pausa de 90 dias na maioria das tarifas é “extremamente sábia”, porque dá aos países mais tempo para negociar. Ele se sente tranquilo com seu portfólio.
Traduzido do inglês por InvestNews
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