Com isso, ele espera que sua marca icônica — e talvez a indústria de diamantes, cuja existência soma mais de um século — não seja vítima de um declínio ameaçador.
Com sede em Londres, a De Beers convenceu gerações de consumidores de que o amor não era genuíno a menos que fosse selado com um diamante. As pedras eram valorizadas não apenas por sua beleza, mas também como um milagre da natureza, formado há mais de um bilhão de anos nas profundezas da Terra e depois extraído em locais exóticos — muitas vezes em nome da De Beers.
Agora, os diamantes podem ser produzidos em laboratórios que imitam a pressão e as temperaturas extremas da Terra, mas por uma fração do preço. Há uma década, essas gemas artificiais eram novidade. Hoje, elas são populares e contestam cada vez mais a percepção dos diamantes como um acessório de luxo.
O Walmart vendeu seus primeiros diamantes desenvolvidos em laboratório em 2022, mas agora as pedras representam metade de sua variedade de joias de diamantes.
A Signet Jewelers, que afirma ser a maior varejista mundial de diamantes, com marcas como Kay Jewelers, Zales e Jared, firmou parceria com a De Beers para exaltar as virtudes dos diamantes naturais em uma nova campanha de marketing. Mas, no mês passado, a Signet afirmou que também vem adicionando mais diamantes desenvolvidos em laboratório às suas joias de moda, que foram um dos fatores que ajudaram a tirar a empresa de uma prolongada queda nas vendas.
Diamantes sintéticos
Os diamantes sintéticos representam atualmente mais de um quinto das vendas globais de joias que têm diamantes, ante menos de 1% em 2016, de acordo com Paul Zimnisky, analista independente.
No caso dos anéis de noivado, a penetração é ainda maior. Mais da metade dos anéis de noivado comprados no ano passado nos EUA continham um diamante criado em laboratório, um aumento de 40% em comparação com 2019, de acordo com uma pesquisa com quase 17 mil casais americanos realizada pelo site de planejamento de casamentos The Knot.
“Os diamantes sempre foram vistos como caros, um bem de pessoas ricas”, diz Matt Bick, terceira geração de vendedores de diamantes, com um showroom no mesmo quarteirão londrino da sede da De Beers. “Agora todos podem usá-los.”
E esse é o dilema de Cook.
Geólogo e ex-executivo de longa data do setor de petróleo e gás, Cook assumiu o comando da gigante de mineração de diamantes e joias no início de 2023. Desde então, os diamantes desenvolvidos em laboratório da China, Índia e outros lugares inundaram o mercado, pressionando a demanda por pedras naturais.
Nos últimos dois anos, a Anglo American, que é controladora da De Beers, reduziu o valor contábil de sua participação majoritária na unidade de diamantes em cerca de 45%, ou US$ 4,5 bilhões.
No ano passado, enquanto se defendia de uma tentativa de aquisição, a Anglo anunciou que desmembraria a De Beers por meio de uma venda ou listagem para se concentrar em negócios como mineração de cobre e minério de ferro, mas durante meses encontrou escassez de possíveis compradores a preços que pudesse aceitar. Isso levou aos preparativos para o Plano B, a abertura de capital.
Os executivos da Anglo esperavam já estar bem avançados no processo de desmembramento da De Beers, mas cada vez mais parece que qualquer acordo pode se estender até o ano que vem, como já sinalizou Cook.
Tarifas de Trump
Com as tarifas de Trump gerando temores sobre uma guerra comercial generalizada, a De Beers pode precisar de um Plano C. Os EUA são o maior consumidor mundial de joias de diamantes, sem minas comerciais próprias.
A ameaça de tarifas já tornou os diamantes naturais lapidados e polidos mais caros nos EUA, em um momento em que muitos consumidores já estão optando pela variedade mais acessível, a desenvolvida em laboratório.
A De Beers e a Anglo assinaram recentemente acordos de confidencialidade com cerca de uma dúzia de pretendentes para o negócio de diamantes, segundo pessoas próximas às empresas. Um IPO não está descartado, e executivos da Anglo afirmaram reservadamente que a empresa não apressará uma venda se acharem que esperar lhes renderá um negócio muito melhor.
Cook afirma que sabia que assumir o cargo na De Beers quase significaria ajudar a vender a empresa. Ele não sabia que a Anglo seria pressionada a agir tão rapidamente.
Tudo ou nada
Em uma de suas primeiras grandes ações, Cook encerrou a produção da De Beers de suas próprias joias de diamantes desenvolvidas em laboratório sob a marca Lightbox. A decisão de Cook efetivamente foi uma aposta de que De Beers poderia reverter a queda de vários anos nos preços dos diamantes extraídos da terra.
Os diamantes manufaturados são 100% carbono, com a mesma dureza e brilho do original. No entanto, o futuro da De Beers depende dos consumidores que acreditam que a autenticidade não pode ser produzida em laboratório.
Durante uma entrevista na sede histórica da empresa, no centro de Londres, Cook afirmou que muitas pedras produzidas em massa estão se passando por algo especial para justificar altos preços. Ele argumenta que os compradores são enganados quando peças semelhantes de joias desenvolvidas em laboratório são vendidas a preços muito diferentes, dependendo de quem as vende.
“Estou profundamente preocupado com a existência de um grande golpe envolvendo diamantes desenvolvidos em laboratório”, disse Cook. “Não acredito que isso seja sustentável.”
Ele acrescentou que a democratização dos diamantes desvaloriza o que os tornou especiais em primeiro lugar. “Desde que a humanidade desenvolveu a consciência”, disse ele, “nós valorizamos algo precioso e raro.”
Para convencer uma nova geração de compradores sobre as virtudes dos diamantes naturais, Cook pressionou a Anglo para que aumentasse drasticamente o orçamento de marketing da De Beers, atingindo o maior nível em uma década. Juntamente com Botsuana, o maior fornecedor de diamantes da empresa e um acionista minoritário, eles aumentaram a alocação de marketing da De Beers em mais de 25% este ano.
O esforço coincide com a iniciativa de organizações como o Natural Diamond Council para promover diamantes extraídos da terra, enquanto difamam a variedade desenvolvida em laboratório.
A organização comercial sem fins lucrativos chamou os diamantes desenvolvidos em laboratório de The Dupe (em inglês, “A Imitação”) em outdoors que testou em Manhattan no início deste ano. Eles se referiram aos diamantes extraídos como For Better e aos desenvolvidos em laboratório como For Worse, fazendo uma referência à frase “na alegria e na tristeza”, em inglês.
“As pessoas pensam que diamantes naturais e desenvolvidos em laboratório são a mesma coisa”, disse Kristina Buckley Kayel, diretora-gerente do Conselho de Diamantes Naturais para a América do Norte. “Eles não são.”
A De Beers ajuda a financiar o Conselho de Diamantes Naturais e faz parte de seu conselho, mas não está envolvida no desenvolvimento de suas campanhas de marketing, disse um porta-voz da De Beers.
A primeira campanha publicitária da De Beers, como parte de uma parceria com a Signet, foi ao ar no final de 2024 e tomou um rumo mais ambicioso. Chamados de Worth the Wait (“Vale a Espera”), os anúncios mostram casais em vários estágios do namoro, intercalados com imagens de erupções vulcânicas e fluxos de lava. O slogan: “Assim como sua jornada, vale a pena espera por um diamante natural”.
Acordo com Botsuana
No início deste ano, Cook também estendeu um acordo de licenciamento com Botsuana para garantir à De Beers um fornecimento estável após 2050, encerrando um impasse de quase seis anos com o país africano que produz a maior parte de seus diamantes.
Ambos os lados se empenharam em avaliar o que está em jogo. Botsuana, que depende fortemente da exportação de diamantes, reduziu suas previsões de crescimento econômico enquanto luta contra a prolongada crise do setor.
Juntos, os parceiros estão tentando aumentar a demanda e lutando para se livrar da mancha de práticas que maculou a reputação do setor — o tráfico dos chamados diamantes de sangue extraídos em zonas de guerra, cujos lucros são usados para financiar insurgências.
“Estamos nessa situação por causa do valor dos diamantes”, afirma o embaixador de Botsuana nos EUA, Mpho Mophuting.
Quando se encontra com joalheiros e jovens, Mophuting fala sobre como a indústria de diamantes financiou escolas, infraestrutura como cabos de fibra óptica e sua própria pós-graduação.
A mensagem nem sempre repercute entre compradores preocupados com o preço. Antes de se casar no ano passado, Samantha Boselli, uma publicitária de 29 anos de Hooksett, New Hampshire, escolheu um diamante de 3,5 quilates em formato de pera para seu anel de noivado. Ele foi desenvolvido em laboratório.
“O preço que conseguimos pelo tamanho da pedra foi imbatível em comparação com um diamante natural”, diz Boselli. Ela não se importa com a probabilidade de a pedra não manter seu valor.
“Quando eu tiver 80 anos e quiser passá-lo para uma filha ou neta, ainda será um diamante lindo e cheio de sentimento”, diz ela. “Não pretendo revendê-lo.”
Ajudinha de Hollywood
A De Beers recebeu o nome de dois irmãos holandeses-africâneres, Diederik Arnoldus de Beer e Johannes Nicolaas de Beer, que se estabeleceram na África do Sul e descobriram diamantes em sua fazenda no final do século XIX.
A De Beers cresceu e passou a controlar cerca de 90% do comércio mundial de diamantes. Quando a demanda por diamantes entrou em colapso durante a Grande Depressão, a De Beers contratou a agência de publicidade N.W. Ayer, que convenceu atrizes de Hollywood a usar anéis de diamante. Um de seus redatores, em 1947, criou o agora famoso slogan “Um diamante é eterno“.
Nas décadas seguintes, a De Beers teve grande sucesso em ditar quanto deveria ser gasto em um anel de noivado de diamante: “Dois meses de salário não são um preço pequeno a se pagar por algo que dura para sempre?”, questionava um anúncio da De Beers na década de 1980.
Naquela época, porém, a influência da empresa estava diminuindo à medida que novas minas de diamantes na Rússia e em outros lugares eram descobertas. No início dos anos 2000, a controvérsia sobre os diamantes de sangue estava no auge, ao mesmo tempo em que produtores independentes estavam destruindo a De Beers.
A inovação em diamantes manufaturados criou novos obstáculos. Embora a General Electric produzisse diamantes desenvolvidos em laboratório para uso industrial desde a década de 1950, a tecnologia e o gosto do consumidor evoluíram rapidamente na última década.
Naturais x manufaturados
Até mesmo especialistas em gemas precisam de maquinário especializado para diferenciar diamantes de qualidade desenvolvidos em laboratório de diamantes extraídos da terra.
A De Beers agora está tentando chamar mais atenção para as diferenças difíceis de serem percebidas, pedindo aos joalheiros que desembolsem US$ 9.500 por um novo dispositivo de teste de diamantes chamado DiamondProof.
O dispositivo tem aproximadamente o tamanho de uma air fryer e foi projetado para ser exposto nos balcões de joalherias. Leva apenas alguns segundos para mostrar os resultados codificados por cores: se a imagem da pedra brilhar em azul, é natural — um resultado que a De Beers afirma poder garantir. Se brilhar em amarelo, é desenvolvido em laboratório ou precisa de mais testes.
A De Beers espera que, se um dispositivo de aparência tão simples consegue diferenciar tão facilmente pedras extraídas da terra de pedras desenvolvidas em laboratório, os compradores possam se convencer de que realmente existe uma diferença significativa entre as duas.
A maioria das joalherias de luxo optou por não vender diamantes desenvolvidos em laboratório. “Eles não são raros nem naturais”, diz Victoria Reynolds, gemóloga-chefe da Tiffany & Co. “Há uma superabundância deles.”
Vendedores que atraem consumidores mais preocupados com o preço têm menos margem de manobra.
As vendas de diamantes desenvolvidos em laboratório no Walmart, o segundo maior vendedor de joias finas do país, atrás da Signet — de acordo a revista National Jeweler — aumentaram 175% em 2024 em comparação com o ano anterior.
“Nossos clientes buscam esse tipo de valor”, disse Chris Steinmann, vice-presidente de merchandising, joias e acessórios do Walmart.
A varejista dinamarquesa Pandora decidiu em 2021 vender apenas diamantes desenvolvidos em laboratório, em parte devido ao seu preço mais baixo, mas também por considerar que são menos prejudiciais ao meio ambiente.
O CEO da Pandora, Alexander Lacik, afirmou que eles representam uma tecnologia inovadora que não pode ser detida por meio de publicidade negativa.
“Isso aconteceu com o carro, os cavalos e as carruagens”, disse ele. “O mundo está mudando.”
A Signet foi mais relutante em aderir à onda dos diamantes desenvolvidos em laboratório do que outras joalherias do mercado intermediário, o que, segundo alguns analistas, contribuiu para um declínio prolongado nas vendas, a queda acentuada do preço das ações e um grande acionista que pressionou pela venda da empresa.
O presidente-executivo da Signet, J.K. Symancyk, que assumiu o comando em novembro, definiu uma nova estratégia em março, que inclui investir mais em diamantes desenvolvidos em laboratório para joias de moda, como pulseiras, brincos e colares para tênis, enquanto busca proteger o fascínio das pedras naturais para compras importantes, como anéis de noivado.
As vendas de joias de moda com diamantes desenvolvidos em laboratório aumentaram 60% no último trimestre, em comparação com o ano anterior, um fator que ajudou a empresa a retomar o crescimento nas vendas gerais pela primeira vez desde abril de 2022.
Ele acrescentou que quase dois terços dos clientes da Signet ainda preferem diamantes extraídos da terra para ocasiões especiais, como aniversários de casamento e noivados. “Consideramos os diamantes naturais como duradouros e perenes”, diz Symancyk. “As tendências da moda mudam.”
Os 20 mil revendedores da Signet foram recentemente solicitados a concluir um curso de treinamento digital que os ensinou a comunicar melhor as características únicas dos diamantes naturais aos seus clientes, incluindo sua história de origem, escassez e valor intrínseco.
“Não se pode realmente criar mágica quando se fala de uma pedra criada em laboratório”, disse Christine Vassar-Raus, vice-presidente regional da rede Jared, de propriedade da Signet, que demonstrou as técnicas de venda em uma loja em Connecticut em uma tarde recente. “Simplesmente não é tão romântico.”
Preços
O fluxo dos diamantes desenvolvidos em laboratório reduziu os preços de ambos os tipos de pedras.
O preço de varejo de um diamante de 1 quilate desenvolvido em laboratório caiu 86% desde o início de 2016, para cerca de US$ 745, estima Zimnisky.
O preço de um diamante natural do mesmo tamanho caiu 40% nesse período, para US$ 3.925. Em 2016, havia apenas uma diferença de cerca de US$ 1 mil entre um diamante de 1 quilate desenvolvido em laboratório e um diamante natural. Um diamante natural agora custa cerca de cinco vezes mais do que uma pedra artificial.
A queda nos preços dos diamantes desenvolvidos em laboratório causou arrependimento em alguns consumidores.
Depois de comprar um par de brincos de diamantes desenvolvidos em laboratório, Durée Ross renunciou às pedras sintéticas. Ela os comparou com uma bolsa falsificada, embora diamantes desenvolvidos em laboratório não sejam falsos.
“Eu simplesmente não me sentia bem usando-os”, disse a profissional de comunicação de 49 anos, que mora em Fort Lauderdale, Flórida. “Diamantes naturais têm mais chance de manter seu valor. Eles são mais um investimento.”
Cook, o chefe da De Beers, descreve um futuro em que os diamantes desenvolvidos em laboratório, abundantemente disponíveis, continuem a perder valor, aproximando-os, aos olhos do consumidor, de imitações mais baratas, como zircônia cúbica e moissanite, que têm estruturas químicas diferentes e são facilmente identificadas como imitações.
Para aqueles que pagaram US$ 2 mil por um diamante desenvolvido em laboratório de 1 quilate e viram seu valor despencar, Cook ofereceu condolências: “Meus sentimentos”.
Traduzido do inglês por InvestNews
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