Depois de um período como retardatária no início dos anos 2010, a Procter & Gamble ultrapassou a Unilever com uma estratégia tão simples que muitos duvidaram: dobrar a aposta em suas maiores marcas de uso diário e melhorar sua eficiência.
A P&G, que desistiu do negócio de alimentos há mais de uma década, está registrando lucro recorde em seu detergente Tide, nas fraldas Pampers e em produtos básicos de toalete, como Old Spice e Pantene. O preço de suas ações mais que dobrou nos últimos dez anos.
As ações da Unilever subiram cerca de 40% no mesmo período. A gigante europeia fabrica o desodorante Axe e o sabonete Dove, mas ainda depende de produtos alimentícios e mercados emergentes imprevisíveis. Recentemente, demitiu seu CEO, dizendo que queria acelerar o ritmo de sua estratégia de recuperação.
A P&G conquistou a melhor posição entre seus concorrentes para enfrentar o que promete ser um ano turbulento. Nos EUA, o maior mercado para ambas as empresas, a confiança do consumidor está abalada. O presidente Trump trava uma guerra comercial contra alguns dos maiores parceiros comerciais dos EUA, as ações estão despencando e muitos temem que a economia americana possa estar entrando em recessão.
“O crescimento nem sempre virá em linha reta. Medimos o progresso em anos fiscais, não em trimestres”, disse Jon Moeller, CEO da P&G, em novembro, no dia do investidor da empresa. “Nossos resultados mostram que esta é uma estratégia que nos servirá bem nos bons e maus momentos.”
Pouco tempo atrás, a P&G estava em queda nas vendas, e um investidor ativista estava pressionando a empresa a ser mais parecida com sua arquirrival europeia. Agora, o mesmo ativista está estimulando a Unilever a ser mais parecida com a P&G.
Fernando Fernandez, o recém-empossado CEO da Unilever, disse na semana passada que há cerca de um bilhão de euros (o equivalente a mais ou menos US$ 1,09 bilhão) de marcas locais em sua divisão de alimentos europeus que “não se encaixam bem” no portfólio da empresa. E outros 500 milhões de euros, ou cerca de US$ 544 milhões, em produtos de mercados menores que a empresa não pode escalar.
“Minha intenção é atuar sobre tudo isso, provavelmente em um ritmo mais rápido”, disse Fernandez.
Uma batalha por lâminas de barbear
Uma década atrás, a P&G perdia terreno com o consumidor americano. O mesmo acontecia na China, seu segundo maior mercado. Rivais com sede nos EUA, a Colgate-Palmolive e a Kimberly-Clark, fabricante da Huggies, estavam se movendo com mais agilidade e roubando clientes. A marca de barbeadores Gillette da P&G estava sob ataque. Duas vendedoras de lâminas de barbear on-line, a Dollar Shave Club e a Harry’s, estavam usando lâminas baratas e campanhas publicitárias concisas e de baixo orçamento para roubar clientes desanimados com os altos preços das lâminas Gillette, cada vez mais sofisticadas. A Unilever comprou a Dollar Shave Club em 2016 por US$ 1 bilhão, parte de uma série de aquisições.
A Trian Fund Management, de Nelson Peltz, adquiriu cerca de US$ 3 bilhões em ações da P&G até 2017 e começou a lutar por um assento no conselho da empresa. Peltz disse que a P&G estava irremediavelmente atolada no passado. Acrescentou que a empresa deveria adquirir marcas menores e de nicho e trazer talentos de fora. Queria também uma reorganização corporativa que dividiria a empresa em três unidades de negócios independentes.
Ele citou a Unilever como exemplo de rival mais bem-sucedida, e mencionou que a empresa estava entregando altas margens operacionais, apesar dos negócios voltados para produtos menos lucrativos.
Os executivos da P&G argumentaram que o futuro estava nos mesmos fundamentos que guiaram a empresa por 180 anos: marcas confiáveis como Tide e Gillette que podem dominar sua categoria.
A presença de Peltz no conselho, reconheceram mais tarde os executivos, forçou a P&G a desvendar mais rapidamente uma estrutura organizacional conhecida internamente como “selva”, onde as linhas de comando confusas deixavam os executivos com pouca autoridade ou responsabilidade. A empresa se juntou a outras e abocanhou algumas marcas iniciantes que faziam sucesso, como Native Body Care e Tula Skin Care.
Os líderes da P&G confundiram os analistas com o uso frequente das palavras “superioridade irresistível” — termo genérico de uma estratégia para atrair clientes com novas embalagens, formulações e marketing de produtos aprimorados e preços competitivos. Mas a estratégia funcionou. A empresa investiu na melhora do desempenho de suas cápsulas de lava-louças Cascade, toalhas de papel Bounty e sabão em pó Tide. Quando a Covid chegou em 2020, os consumidores gravitaram para marcas conhecidas. A P&G registrou seu maior aumento de vendas em décadas, aproveitando a demanda por produtos domésticos, já que os consumidores obcecados por limpeza ficaram em casa.
‘Imperdível’ x ‘irresistível’
A Unilever tem uma vasta presença global. Vende detergente e pasta de dente, mas obtém cerca de um terço de sua receita anual com alimentos e sorvetes. Mais da metade dos negócios vem de mercados emergentes.
Peltz assumiu uma posição no conselho da Unilever em 2022 e pressionou por mudanças, muitas seguindo o manual da P&G. Ele disse que a empresa deve melhorar sua disciplina na cadeia de suprimentos e se concentrar em 30 marcas fortes que representaram mais de 70% de suas vendas.
Pouco tempo depois, a Unilever adicionou uma nova frase ao seu léxico: o objetivo de oferecer uma “imperdível superioridade de marca” aos consumidores.
“Não estou feliz com nossa competitividade geral”, disse Hein Schumacher, então CEO da Unilever, em 2023, meses depois de assumir o cargo. “Nossos esforços estão muito dispersos.”
Schumacher revelou planos para simplificar a empresa desmembrando seu negócio de sorvetes, que vende as marcas Magnum e Ben & Jerry’s.
Em fevereiro, a Unilever nomeou Fernandez, seu diretor financeiro, como seu próximo CEO. Sua missão: acionar melhor e mais rapidamente o plano de recuperação existente da empresa.
A empresa tem se concentrado em introduzir menos inovações maiores e mudar seu portfólio para produtos mais caros — por exemplo, perder os direitos na América do Norte da marca convencional de xampu Suave e adquirir a marca de cuidados com os cabelos de alta qualidade K18.
Alguns investidores dizem que os negócios domésticos e de cuidados pessoais da Unilever podem ser mais valiosos como uma unidade autônoma porque as empresas de alimentos têm margens mais baixas. A Unilever disse que aceleraria a venda de algumas marcas de alimentos, ao mesmo tempo em que se concentraria em outras lucrativas, como o caldo Knorr e a maionese Hellmann’s.
A batalha por participação de mercado se intensificará nos próximos meses, dizem analistas. Os consumidores americanos estão apertando os cintos. A economia da China está sofrendo. Os aumentos acentuados de preços nos últimos anos impulsionaram o crescimento da receita em todo o setor, mas consumidores e varejistas não estão aceitando novos aumentos.
Agora a luta é pelo crescimento do volume, disse Filippo Falorni, analista que cobre o setor de consumo do Citi. “Mas nem todos podem vencer.”
Escreva para Natasha Khan em [email protected] e Sharon Terlep em [email protected]
Traduzido do inglês por InvestNews
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