Empresas dos EUA investem em produção própria à espera de um inevitável aumento de taxas de importação
Empresários se afastam da China, pois esperam que democratas e republicanos imponham cada vez mais tarifas a Pequim
Até alguns anos atrás, as fábricas chinesas forneciam ao mundo canetas Sharpie e liquidificadores Oster.
Não mais.
A gigante de consumo Newell Brands, dona da Cadence, agora fabrica esses produtos e muito mais em suas próprias fábricas nos Estados Unidos e no México. Muitos de seus outros produtos são feitos em fábricas no Vietnã, na Indonésia e na Tailândia.
Chris Peterson, executivo-chefe da Newell, disse que essa mudança reduz sua dependência de importação da China em um momento em que os partidos Democrata e Republicano “estão ficando mais protecionistas em termos de política comercial”.
As tarifas estão se tornando uma ferramenta que une geopolítica e comércio, e têm um papel maior nas decisões de fabricação e fornecimento de longo prazo. Em nenhum lugar elas são mais duras do que na China, onde importação e exportação enfrentam um regime cada vez mais complicado de impostos sobre bens, desde os semicondutores até os colchões.
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“As tarifas sempre existiram e sempre foram consideradas um custo dos negócios”, disse Simon Geale, vice-presidente executivo de compras da empresa de consultoria de cadeia de suprimentos Proxima. “Mas foram ficando mais agressivas nos últimos cinco ou seis anos.”
A nova era de tarifas começou sob o governo Trump, taxando importações de vários países, com maior foco em produtos chineses.
O governo Biden manteve a maioria das tarifas em vigor, e também acrescentou mais impostos sobre aço, semicondutores e veículos elétricos chineses, citando preocupações com a segurança nacional e uma política industrial destinada a reviver a manufatura americana.
Os dois candidatos na eleição presidencial deste ano parecem prontos para continuar a tendência, já que o comércio, a manufatura e as ferramentas para uni-los assumem um papel proeminente na campanha.
O ex-presidente Donald Trump, candidato republicano, disse que estabelecerá novas tarifas com um potencial imposto geral de 10% sobre produtos importados e uma tarifa de 60% sobre produtos da China.
A vice-presidente Kamala Harris, a candidata democrata, até agora não indicou o desejo de se desviar muito das políticas comerciais do presidente Biden.
Antes de se tornar vice-presidente, Kamala divergiu de Biden sobre o Acordo de Livre Comércio da América do Norte revisado de Trump, conhecido como Acordo Estados Unidos-México-Canadá. Como senadora, juntou-se a alguns legisladores democratas, dizendo que o acordo não fez o suficiente para lidar com as mudanças climáticas, sugerindo que ela pode ter mais foco em questões de justiça social ao considerar pactos comerciais.
Kamala está em sintonia com a administração Biden.
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Em uma fábrica de eletrônicos em Wisconsin no verão passado, disse que ela e Biden querem trazer os empregos de manufatura de volta para os EUA. Em um evento de campanha na Carolina do Norte em 18 de julho, afirmou que a tarifa universal de 10% proposta por Trump “aumentaria o custo das despesas diárias para as famílias”. Ela não criticou as tarifas atuais sobre produtos chineses.
Tanto Trump quanto Kamala se opuseram à Parceria Transpacífica, o amplo acordo comercial multinacional que foi projetado para expandir as alternativas ao comércio com a China. Trump retirou os EUA do acordo imediatamente após assumir o cargo em 2017.
As políticas comerciais representam um enigma para as empresas: deveriam continuar comprando da China e arriscando o impacto potencial da escalada das tarifas? Ou deveriam procurar fora da China, onde os custos são mais altos, mas as taxas e outros riscos geopolíticos são menores?
A ameaça de tarifas universais de Trump assustou até mesmo os apoiadores. O presidente-executivo da Tesla, Elon Musk, que endossou Trump, disse que adiaria a decisão sobre uma nova fábrica no México até depois da eleição porque “não faz sentido” se Trump vencer e colocar “tarifas pesadas” sobre os veículos produzidos lá.
Mudar as cadeias de suprimentos para outros países é complexo. As empresas devem encontrar novos fornecedores de matérias-primas e produtos acabados. Fornecedores e subfornecedores devem ser examinados para garantir que não violem as regras cada vez mais rigorosas dos EUA em questões como trabalho forçado.
Anne van de Heetkamp, vice-presidente de gerenciamento de produtos da empresa de tecnologia de cadeia de suprimentos e logística Descartes, disse que quando as tensões comerciais começaram a aumentar há cinco anos, as empresas não tiveram pressa em mudar as cadeias de suprimentos. Agora que as taxas parecem mais permanentes, os clientes da Descartes estão buscando novas redes globais de suprimentos.
O aumento das exportações do Sudeste Asiático, Índia e México sugere que a Newell não está sozinha em seu desejo de reduzir a dependência da China. As mudanças estão alimentando novos investimentos em logística nas fábricas, operações de armazenamento e transporte em todo o mundo.
A DHL Express U.S., unidade de encomendas da gigante alemã de logística Deutsche Post, adicionou um novo voo direto entre o Vietnã e os EUA em 2022 para atender ao aumento das exportações que costumavam chegar aos EUA via Hong Kong. O CEO Greg Hewitt disse que a unidade também está procurando expandir suas redes ao longo da fronteira dos EUA com o México para atender à crescente demanda.
Hewitt alertou que a China continua sendo o principal fornecedor mundial de produtos manufaturados e provavelmente manterá essa posição por causa de suas cadeias de suprimentos simplificadas e baixos custos de matéria-prima e mão de obra.
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Grupos comerciais do setor de varejo e alguns executivos avisam que alguns itens não podem ser produzidos em nenhum outro lugar do mundo e que a escalada das tarifas simplesmente aumentará os preços ao consumidor e alimentará a inflação. Analistas do Goldman Sachs estimam que cada ponto percentual a mais na tarifa geral dos EUA aumentaria os preços ao consumidor em pouco mais de 0,1%.
“O problema é que o melhor lugar para fazer sapatos é a China”, disse Ronnie Robinson, diretor da cadeia de suprimentos da Designer Brands, empresa controladora da varejista de calçados DSW.
Robinson disse que para cada dólar que o governo adiciona em tarifas, os consumidores pagam um extra de US$ 2 a US$ 4 no caixa. “A realidade é que você e eu estamos pagando as tarifas incluídas no preço da etiqueta quando você faz compras”, disse ele.
Robinson disse que a Designer Brands obtém cerca de 70% de seus calçados da China, menos que os 90% de vários anos atrás. E afirmou que a empresa pretende reduzir ainda mais sua dependência, para cerca de 50%, mas a China continuará sendo a maior fonte única de calçados da empresa.
Peterson disse que apenas 15% dos produtos da Newell dependem da manufatura chinesa hoje, abaixo dos mais de 30% há vários anos. Ele espera que até o final do próximo ano a participação caia abaixo de 10%.
E acrescentou que, quando a empresa procura novos fornecedores chineses, uma de suas primeiras perguntas é se eles têm capacidade ou planejam aumentar a capacidade fora do país.
“Se um fornecedor não tiver capacidade de fabricação fora da China, não o selecionaremos”, disse ele.
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traduzido do inglês por investnews