Por que Trump deveria mesmo ‘comprar’ a Groenlândia
A ilha gelada busca a independência da Dinamarca. Mas essa conquista a tornaria preza fácil para Rússia e China
Durante o primeiro mandato de Donald Trump, os especialistas em política externa demonstraram preocupação com sua ideia de “comprar” a Groenlândia da Dinamarca.
Mas o fato é que agora, em seu segundo mandato, Trump deveria retomar exatamente de onde parou.
A localização estratégica da Groenlândia no Atlântico Norte tem sido objeto de discussão entre estrategistas dos EUA desde o século 19. Em 1867, o então Secretário de Estado William Seward já havia tentado comprar a maior ilha do mundo. A ideia de anexação apareceu de novo durante a Segunda Guerra Mundial, quando a Dinamarca se rendeu à Alemanha nazista e os EUA ocuparam a Groenlândia.
Hoje, apesar do ceticismo dos especialistas em política externa, mudanças recentes na realidade geopolítica do Atlântico Norte tornam necessária uma relação formal entre Washington e Nuuk, a capital da Groenlândia.
Primeiro, os groenlandeses estão prestes a se tornar independentes da Dinamarca. A Lei de Autogoverno da Groenlândia, de 2009, concedeu significativa autonomia à ilha, incluindo certa liberdade para conduzir sua própria política externa. E a política de segurança e defesa da Groenlândia, publicada em fevereiro de 2024, afirma que a independência é o objetivo final.
Só que a Groenlândia é a entidade política menos densamente povoada do mundo. Caso ela se separe mesmo da Dinamarca, terá de assumir sua própria segurança, tarefa para a qual está pouco preparada.
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Isso preocupa por conta do seguinte: Rússia e China ameaçam o status quo no Ártico. Moscou reivindicou grandes áreas do Mar Ártico, incluindo zonas econômicas exclusivas da Groenlândia. Navios russos têm invadido as águas groenlandesas, enquanto o país de Putin expande suas bases árticas e sua frota de navios quebra-gelo. Enquanto isso, a China se autodeclarou um “estado próximo ao Ártico”, criou a “Rota da Seda Polar” para integrar comunidades árticas à sua agenda econômica e construiu sua própria frota de quebra-gelos.
Por fim, acredita-se que a Groenlândia possua recursos naturais significativos, como ouro, prata, cobre, petróleo, urânio e terras raras. Isso representa uma oportunidade para adversários explorarem esses recursos sem consideração pelas comunidades locais ou pelo meio ambiente. Uma Groenlândia independente dificilmente resistiria à exploração coercitiva praticada por China e Rússia.
Os EUA podem oferecer uma alternativa que preserve a soberania da Groenlândia enquanto a proteje de atores mal-intencionados. Por décadas, o país tem usado os chamados Pactos de Associação Livre (COFAs) com pequenos estados insulares no Pacífico. Esses acordos permitem que países como Micronésia, Palau e Ilhas Marshall mantenham sua independência e conduzam suas relações exteriores, enquanto os EUA garantem apoio econômico e militar.
Conforme a Groenlândia busca se separar da Dinamarca, os EUA deveriam estar prontos para oferecer apoio. Os interesses de segurança e econômicos do Ocidente estariam ameaçados se uma Groenlândia independente, cercada por atores estrangeiros predatórios, ficasse sem proteção externa. Trump tem a oportunidade de negociar o “acordo do século”.
Alexander B. Gray é pesquisador sênior no American Foreign Policy Council e atuou como chefe de gabinete do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca entre 2019 e 2021.
traduzido do inglês por investnews